Brasil é o país mais perigoso do mundo para ambientalistas

Nunca tantas pessoas foram assassinadas no mundo em defesa do meio ambiente como em 2016. A liderança do ranking que mapeia esse tipo de violência, mais uma vez, é do Brasil: foram 49 mortes no ano passado, divulgou a organização Global Witness nesta quinta-feira 13.
“Não foi uma surpresa. O Brasil é o país mais perigoso do mundo para quem luta pelos direitos ligados à terra e à proteção do meio ambiente”, afirma Billy Kyte, da organização inglesa. Em todo o mundo, 200 assassinatos de ativistas ambientais foram mapeados pela organização.
“Isso é só a ponta do iceberg. Acreditamos que o número de mortes seja maior, mas nem sempre elas chegam ao conhecimento público, ou suas reais causas são relatadas”, comenta Kyte.
A Global Witness reúne as informações desde 2002, e há cinco anos o Brasil apareceu pela primeira vez no topo da lista. Desde então, o país nunca mais perdeu a posição de “liderança”.
Amazônia: território violento
Rondônia, Maranhão e Pará – todos parte da Amazônia Legal – foram os estados mais violentos em 2016. Para a Comissão Pastoral da Terra (CPT), criada em 1975 e inicialmente ligada à Igreja Católica, o avanço da fronteira agrícola está por trás desse cenário.
“A causa está na expansão do agronegócio, construção de grandes obras de infraestrutura como barragens e hidrelétricas, ferrovias”, diz Thiago Valentin, da secretaria nacional da CPT. “É um problema histórico: a exploração de quem vem de fora sobre as pessoas que moram na região”, acrescenta.
Assim como a Global Winess, a CPT contabiliza assassinatos de lideranças comunitárias, indígenas, sem-terras, posseiros, trabalhadores rurais e quilombolas. Em 2016, o órgão contabilizou ainda mais mortes que a ONG: 61 vítimas.
“Essas pessoas são muito muito mais que defensores ambientais. Estão lutando por direitos, por território, por terra, por água. Vai muito além da questão ambiental”, reforça Valentin.
Lobby do agronegócio
O pesquisador Carlos Alberto Feliciano, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), publicou uma série de artigos sobre a violência no campo. Ele calcula que, desde o ano 2000, cerca de 1 milhão de famílias já sofreram ameaças em decorrência de conflitos. “Vão desde despejo, destruição da colheita e da casa e ameaças físicas”, detalha Feliciano.
A tendência é negativa, alerta o pesquisador. “O agronegócio precisa, até 2026, segundo dados divulgados pelo próprio setor, de 15 milhões de hectares. Para se expandir assim, haverá avanço sobre as terras de alguém. Então, a tendência é que essa violência aumente.”
“O lobby do agronegócio no Brasil é muito forte. E agora vemos um governo que está voltando atrás na proteção de leis ambientais, o que provoca mais mortes”, critica Kyte.
Como frear a violência
Em todo o mundo, a luta pelos direitos da terra e pelos recursos naturais motivaram os 200 assassinatos registrados em 2016. “A imposição de projetos de mineração, hidrelétricas, exploração de madeira e agropecuária sobre o território ocupado por comunidades tradicionais, e sem o consentimento delas, impulsionam as mortes”, avalia a Global Witness.
Na Colômbia, onde o processo de paz foi negociado, o ano passado foi o mais letal da história para ativistas. Áreas até então ocupadas pelo movimento armado estão, agora, na mira de empresas extrativistas. E as comunidades que retornam para seus antigos territórios têm sido vítimas de ataques, segundo a organização.
A Global Witness responsabiliza governos, empresas, investidores e parcerias bilaterais pelo cenário que leva às mortes. “Eles precisam atacar as causas do aumento da violência, não autorizar ou participar dos projetos. E mais: os assassinos precisam ser responsabilizados e presos”, argumenta Kyte.
No Brasil, o Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos, criado em 2004, atende sete estados do país, mas não cobre os três com maior número de mortes em 2016 – Maranhão, Pará e Rondônia.
(da Carta Capital)

Educação deve ser pensada em redes de interação

No exame que estamos realizando do livro Foco triplo: uma nova abordagem para a educação, abordamos no primeiro texto o foco interno, analisado por Daniel Goleman, maior especialista do mundo em inteligência emocional, enquanto que, nosegundo texto, abordamos o foco no outro, a empatia, desenvolvido pelo mesmo autor.
Aqui, começaremos a analisar a parte do livro a que se dedicou especificamente Peter Senge, professor de liderança e sustentabilidade na escola de gerenciamento do Massachusetts Institute of Technology (MIT). Coube a ele tratar da inteligência sistêmica, da visão da educação enquanto redes de interação, ou conjunto de processos que acontecem dentro de sistemas.
Para desenvolver a Aprendizagem Socioemocional (ASE), bastante defendida no livro, mas também com propostas de sua repaginação, é preciso entender que educador e educandos interagem uns com os outros, entre si e com outros agentes. A vida humana é, em regra, um conjunto enorme de interações que a moldam.
Segundo Senge, “para a ASE ser bem-sucedida precisamos de um currículo bem elaborado e exequível, mas precisamos também de estruturas de apoio, como um bom treinamento para ajudar os professores a desenvolver novas habilidades, um bom treinamento para traduzir essas habilidades em ambientes de sala de aula exigentes e redes de pares [peer networks] fortalecidas de professores para se ajudarem mutuamente ao longo caminho”.
A sociedade é um sistema complexo e tudo o que acontece dentro dela, a vida humana, é uma rede de interconexões que precisam ser bem compreendidas. É necessário o desenvolvimento de uma faculdade de inteligência sistêmica, que permita ao indivíduo não mais ver o mundo apenas da forma para a qual foi treinado, com reduções e dualismos, o que lhe leva a segmentar sua percepção sobre as coisas. Ele deve passar a inter-relacionar melhor os elementos, percebendo as dinâmicas subjacentes e os efeitos emergentes das diferentes relações entre eles.
Nessa mesma linha, Senge destaca a importância de compreender a “complexidade dinâmica” dos sistemas, o que ele consubstancia especialmente na questão de causas e efeitos não serem tão lógicos quanto se pensa.
Ele cita inicialmente como exemplos o giroscópio, um “dispositivo relativamente simples, com suas rodas giratórias interconectadas… Mas quando você empurra uma das rodas para baixo, ela pode na verdade se mover para a esquerda”. Senge quer destacar que nem tudo acontece pela causa que pensamos, nem todo efeito que buscamos acontecerá pela causa à qual estamos acostumados.
A complexidade nos mostra que há interconexões de causas e efeitos as quais produzem os chamados “efeitos emergentes”, quase sempre inesperados. As tendências individualistas, por sinal, que nos fazem pensar o mundo girando em torno de nós, nos pregam inúmeras peças por esperarmos resultados que não acontecem, gerando, assim, por falta de desenvolvimento socioemocional, estresse, agressividade etc.
Senge cita, então, o exemplo do seu filho que, ao ser buscado um dia na pré-escola, afirmou que o seu amigo, antes muito chegado a ele, era um chato. Ao aprofundar no assunto, Senge conta que o amigo do seu filho teria jogado areia no rosto dele ou feito algo que o desagradou. Seu filho, porém,  já não lembrava mais – ou não dava valor àquele fato como causa da postura do seu amigo – que ele havia dito algo desagradável antes ou não teria compartilhado, quando deveria, algo com tal amigo.
O próprio desenvolvimento do foco interno e do foco no outro, portanto, depende de se desenvolver a compreensão sistêmica e complexa. Do contrário, não se consegue interconectar os benefícios de longo prazo com os prejuízos de curto prazo para concluir que aqueles superam estes; nem se consegue interconectar as nossas ações com as do outros, entendendo o processo de pergunta e resposta espiral que vai se desenrolando e do qual depende, para ter mais sucesso, de uma empatia bem desenvolvida nos três aspectos examinados no último texto.
Senge cita ainda o exemplo interessantíssimo de uma escola no Arizona que fora influenciada por um professor do MIT e que, mais de 20 anos atrás, já aplicava e ensinava o pensamento sistêmico para os alunos.
Quando Senge e sua esposa visitaram a turma do oitavo ano a encontraram sem professor, mas totalmente organizada. “Tratava-se do oitavo ano – uma sala com cerca de trinta adolescentes de mais ou menos catorze anos e sem professor. O que se esperaria ver? O caos, certo? Mas os alunos pareciam nem se dar conta de que não havia professor entre eles. Como descobrimos, estavam todos trabalhando em um projeto de um ano para planejar um novo parque em construção na região norte da cidade. (…) Aquilo não era atividade extracurricular. Era parte do currículo de ciências do oitavo ano!”
Nota-se a enorme diferença de uma educação estruturada em um método sistêmico, tendo o pensamento complexo em foco, e a educação brasileira prevalecente, na qual se privilegia longas exposições e memorização. Atividades práticas, que interferem positivamente na vida real, permitem o desenvolvimento de habilidades socioemocionais e intelectuais que serão necessárias na vida dos indivíduos, não se tornando ele um sujeito mecanizado e memorizador de conteúdo para aprovação em testes.
Ainda sobre a atividade descrita acima, Senge explica como descobriu que, de fato, o processo era prazeroso e útil ao aprendizado da turma:
“Eles estavam trabalhando em opções alternativas para dispor trilhas no parque. Um menino queria por as trilhas em tal e tal lugar, mas o outro discordava. (…) Assim, lá estavam eles se batendo com a complexidade dinâmica de um problema real e descobrindo o que, atualmente, os educadores sistêmicos chamam de dois ‘Hábitos de um Pensador Sistêmico’. Um pensador sistêmico: 1) Reconhece o impacto dos delays ao explorar relações de causa e efeito. 2) Descobre onde afloram as consequências involuntárias”.
Senge cita também outros exemplos de professores que aplicam o pensamento sistêmico na sala de aula com sucesso. Num deles, o do professor de matemática do ensino fundamental Rob Quaden, que se tornou célebre pelos seus métodos sistêmicos inovadores, assemelha-se muito ao que Hipollyte Leon Denizard Rivail propunha em seu livro de aritmética, como visto tem texto passado.
Quaden integra o ensino social, emocional e matemático, permitindo o desenvolvimento de diferentes habilidades socioemocionais e intelectuais numa única classe, levando os alunos a encontrar, muitas vezes, saídas heterodoxas para os problemas que seriam normalmente resolvidos de um modo único, engessado e ortodoxo se a abordagem de ensino fosse a tradicional.
Em suma, essas experiências têm em comum uma educação muito mais prática e dinâmica, que procura interconectar o conteúdo com a realidade, permitindo que os alunos tenham alguma liberdade para decidir o que querem fazer e abrindo grande espaço para que eles discutam e tomem as rédeas das atividades, tudo com um sagaz professor fazendo muito mais o papel de coordenador de atividades do que de mestre do saber e autoritário definidor dos caminhos a serem seguidos.
Quando as respostas são dadas pelos professores para memorização, quase sempre como únicas soluções para os problemas, tal qual a imensa maioria dos livros didáticos hoje se apresenta, o raciocínio do aluno se torna unidimensional, pois ele não discute as muitas possibilidades adequadas e inadequadas, buscando até mesmo subverter o método inicialmente utilizado para solucionar aquele problema, o que representaria estimulá-lo a “pensar fora da caixa”.
Incentivar os alunos a encontrar seus próprios métodos e a discuti-los amistosamente permite que, desde cedo, além de trabalhar a empatia e outras habilidades, eles pensem em quão complexos são os problemas e quão simplórias são muitas das soluções propostas pelos adultos.
É evidente que tudo isso se torna muito mais fácil com um professor que tenha sido bem capacitado para pensar de forma sistêmica, transdisciplinar e complexo.
Esse é o caminho da educação do futuro: professores bem capacitados que consigam estimular nos alunos o desenvolvimento, dentro de uma única atividade, de inúmeras habilidades socioemocionais e intelectuais que os preparem para a vida, e não para testes onde se exige memorização de conteúdos ou mesmo a apresentação de habilidades que não foram adequadamente desenvolvidas em salas de aula.
(da Carta Capital)

Por onde andam os manifestantes vestidos de verde e amarelo?

Em meio a escândalos de corrupção que envolvem diretamente o presidente Michel Temer (PMDB), uma pergunta ronda a cabeça de muitas pessoas: por que as manifestações de rua contra a corrupção cessaram?
Algumas respostas já apareceram. Em declarações ao jornal Valor Econômico, o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), foi objetivo ao comparar o cenário atual à conjuntura passada: “Não é a mesma circunstância. É diferente. O PSDB tem quatro ministros de Estado. O PSDB não tinha ministros no governo do PT”.
O cantor Lobão, um dos ícones das manifestações em defesa do golpe contra Dilma Rousseff (PT), foi na mesma linha: “Mesmo se [Temer] fez falcatrua, se está todo ligado à rede de corrupção, respeitem a interinidade. A economia pela primeira vez tem inflação negativa, depois de 11 anos. Então deixem o cara terminar”, disse à Folha de S.Paulo.
Onde, então, foi parar o discurso “não temos bandidos de estimação” dos protestos convocados por movimentos de direita? Para Esther Solano, professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que faz pesquisas sobre manifestações no Brasil desde os protestos de junho de 2013, organizações como o Movimento Brasil Livre (MBL) e Vem Pra Rua utilizaram o discurso sobre a corrupção apenas como pretexto para atingir seus objetivos políticos. Segundo ela, a mobilização deste argumento, no atual contexto, tem gerado dificuldade para esses coletivos se posicionarem.
“Supunha-se que a corrupção era o lema principal da luta deles. Depois de obtido o impeachment de Dilma Rousseff, viu-se que não era”, afirma, com base em pesquisas de campo conduzidas na universidade. Um dado apontado a partir de tais levantamentos indica que, atualmente, há divergências entre as direções dos movimentos e os participantes das manifestações.
Confira abaixo a entrevista:
Brasil de Fato: Passado o processo de impeachment, como é possível qualificar o posicionamento daqueles favoráveis à saída de Dilma em relação ao governo Temer?
Esther Solano: O que a gente observa nos dados é que há uma divergência muito clara entre os movimentos que convocaram as manifestações e as pessoas que foram.
O mais importante para mim é que os movimentos que convocaram são claramente a favor de uma agenda neoliberal. É claro que não vão se posicionar muito contra o governo Temer, já que ele está fazendo o que eles querem: reforma trabalhista, da Previdência, PEC 241 [que definiu um teto para os gastos públicos]. Esses movimentos defendem o Estado mínimo. Os dados indicam que as pessoas que vão para rua não querem essas reformas. É possível ver a diferença entre o objetivo político desses movimentos, seu programa neoliberal, e as pessoas que vão para rua indignadas com a corrupção, mas não querem as reformas.
São grupos com agenda política definida e que souberam estrategicamente capitalizar um sentimento na população. Houve um potencial muito grande em 2013 que eles canalizaram. De outro lado, há um cenário internacional que favorece o discurso de austeridade. Foram vários fatores [que levaram ao seu sucesso].
Há diferenças entre esses movimentos?
O Vem Para Rua é neoliberal, mas ele já percebeu que não pode se colocar assim em público, defende nos bastidores. Ele simplesmente ignora essa pauta e continua na questão da corrupção.
O MBL faz o contrário. Defende as reformas, as privatizações, o Estado mínimo. Ele coloca isso na sua página. Os próprios seguidores reagiram muito mal e questionaram. É claro, porque impacta a classe média.
E o que explica a ausência de manifestações de rua contra Temer por parte destes setores?
Há uma coisa muito interessante, que é o antipetismo. A gente perguntou: por qual razão vocês vão à rua?. Muitas pessoas, nos questionários, repetem à exaustão que se denominam antipetistas. Mesmo que a pessoa saiba que o Temer é corrupto, o PSDB também, ela pensa que os partidos são corruptos, mas o sentimento fundamental é de rejeição ao PT. Foi um sentimento muito bem explorado pelos movimentos.
A gente viu, em 2013, muita indignação social. A esquerda, na minha opinião, não soube muito bem fazer a leitura, canalizar [esse sentimento]. Os movimentos de direita souberam muito bem canalizar esse descontentamento, essa insatisfação, no antipetismo. O antipetismo, de alguma forma, foi a força mobilizadora que os unificou.
Não é possível dizer que há um aspecto material, da dinâmica de classes, nesse posicionamento?
Tem aspectos materiais e aspectos, eu diria, até mesmo psicológicos da classe média. Quando a gente faz a entrevista, muitas vezes aparece um argumento: ‘Nós, a classe média, somos os pagadores de impostos – há sempre essa visão clientelista do Estado -, mas o PT governou para quem? Para os mais ricos e os mais pobres’. Eu digo que há um sentimento de ‘orfandade’ da classe média.
Outra coisa importante é que nas ‘manifestações verde e amarelo’, nós perguntamos muito sobre as políticas de mobilidade social: cotas, Bolsa Família. Perguntamos até sobre o Mais Médicos. Cerca de 80% das pessoas eram contra essas políticas. Aí é possível observar que há um componente de classe, de fato. Por que ser contra essas políticas? Há essa ideia de rejeitar a mobilidade social de quem está embaixo. A classe média não se sentiu contemplada, se sentiu traída. Aí tem uma questão muito emocional também.
Mesmo com essa divergência, não há, de outro lado, uma referência nesses grupos que permanece? 
Totalmente. Eles são a referência. Já me perguntaram “e se a esquerda puxasse atos contra a corrupção do Temer?”. Não valeria. Para eles, um ato puxado pela CUT, pelas Frentes, não seria uma referência. Quem saiu de verde e amarelo não vai sair à rua em uma manifestação convocada pela CUT. Mesmo com as divergências, esses movimentos são a referência para mobilização. Quando estes não convocam manifestações, eles não saem à rua, não reconhecem outros mobilizadores como legítimos.
Os próprios seguidores do MBL criticaram muito a proximidade com o Temer. Mas na hora de convocar manifestações, parece que ninguém está ligando muito.
Há outra questão: As pessoas não querem mais ir para rua em nome da ‘estabilidade’, porque, para eles, o Temer seria o único que poderia colocar o país um pouco nos trilhos até 2018. Elas têm esse argumento. ‘É melhor não sair às ruas agora e [seguir] até 2018’. Não era um argumento com a Dilma, mas agora é.
Em suma, pode-se afirmar que há uma mudança no discurso desses novos grupos de direita após o impeachment?
Mudou. Supunha-se que a corrupção era o lema principal da luta deles. Depois de obtido o impeachment de Dilma Rousseff, viu-se que não era. O nível de mobilização caiu muito. A última manifestação foi em março, em defesa da Lava Jato, e foi muito mais a favor da operação do que contra o PMDB ou Temer. São coisas sutis, mas importantes. O nível de mobilização é praticamente inexistente.
A gente fala que foi um populismo de direita, que se baseia na luta contra a corrupção, uma coisa muito vazia. O que significa lutar contra a corrupção? É um mantra, chama atenção e é apelativo, mas que no fundo, é muito vazio. Esses grupos se apropriaram desse populismo de direita para atingir objetivos claramente políticos. Eu resumiria dessa forma.
O “manifestante verde e amarelo” pensa que todo mundo é corrupto, mas é pragmático. Há alguma tendência de como ele irá se comportar em 2018? 
Esse cara que pensa que todo mundo é corrupto, mas age pragmaticamente, tem uma boa chance de votar em pessoas que se apresentem como outsiders, de fora da política. Por exemplo: [o prefeito de São Paulo João ]Doria ou [Jair] ]Bolsonaro.
A ideia da corrupção sempre existiu. A diferença é que hoje ela é explorada política e eleitoralmente por um discurso antipolítico. “Não sou político, sou gestor”. O sentimento de que ninguém presta desemboca para um sentimento antipolítica, que beneficia os políticos que se apresentam como novos ou diferentes, mesmo que não sejam. Talvez a tendência em 2018 seja favorecer esse tipo de político. Isso também é a dinâmica eleitoral global.
Mesmo com essa relutância em atacar Temer, o discurso anticorrupção não permanece de alguma forma no debate político brasileiro?
Além do populismo político, há também um populismo jurídico. A gente sabe como a Lava Jato está se organizando. Na verdade, temos um poder político e um poder jurídico que se utiliza da luta contra corrupção como instrumento para atingir seus objetivos políticos.

 (da Carta Maior)

Um século depois, país pode ter recuo histórico de 100 anos

Ao som de A Internacional, clássico das esquerdas cantado com entusiasmo por aproximadamente 100 pessoas, terminou um evento que celebrava o centenário da primeira greve geral no país. Mas o ato desta segunda-feira (10) no Cemitério do Araçá, região oeste de São Paulo, teve caráter de atualidade, pela proximidade da votação de um projeto que pode atingir direitos que ainda não existiam em 1917 e foram conquistados nas décadas seguintes. A ligação entre os períodos históricos foi feita por todos os manifestantes, na véspera de votação do projeto de “reforma” trabalhista (PLC 38) no Senado.
É no Araçá que está enterrado, na quadra 132, o espanhol José Iñeguez Martinez, sapateiro e militante anarquista de 21 anos assassinado durante a greve de 1917. Uma placa foi descerrada em homenagem a ele, com assinaturas da CUT, do PT e da Fundação Perseu Abramo. Texto lido pelo secretário nacional de Cultura da central, José Celestino Lourenço, o Tino, faz referência às “jornadas de trabalho desumanas”, ao trabalho infantil e às condições degradantes dos trabalhadores daquela época. “A greve de 1917 foi fundamental não só para o fim da República Velha, mas para as leis de proteção social” que surgiriam a partir dos anos 1930 e culminariam com a CLT, em 1943.
“Estamos fazendo um resgate histórico de um momento de bravura”, afirmou o presidente da CUT São Paulo, Douglas Izzo. “Infelizmente, a luta dos trabalhadores continua sendo tratada pelas autoridades policiais e pelo Estado como uma transgressão. Temos muito ainda o que lutar. O que estão apontando para o Brasil é acabar com todo o avanço civilizatório que conseguimos com a luta de José Martinez e outros companheiros”, acrescentou Douglas, segurando uma edição fac-símile do jornal A Plebe, lançado em 1917 por inspiração de Edgard Leuenroth, militante anarquista que dá nome a um arquivo mantido pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Não precisamos só do remendo,
precisamos do casaco inteiro.
Não precisamos de pedaços de pão,
precisamos de pão verdadeiro.
Não precisamos só do emprego,
de toda a fábrica precisamos.

Integrantes do grupo teatro Ouro Velho recita poesias. A primeira é a Canção do Remendo e do Casaco, do alemão Bertolt Brecht. Um representante do Centro de Cultura Social – criado em 1993 e dedicado ao estudo e preservação do pensamento anarquista –, lembra que 10 mil pessoas estavam naquele mesmo Araçá em 10 de julho de 1917, no enterro de Martinez. A greve deixou outras vítimas, como o pedreiro Nicolau Salerno, e a jovem Edoarda Binda, de 12 anos. Mas o número de mortos é presumivelmente maior.
O pesquisador e ativista José Luiz Del Roio, autor de um livro sobre a greve de 1917, faz referência aos desaparecidos daquele período e da ditadura instalada a partir de 1964. “Onde foram parar os nossos companheiros?”, questiona, destacando a importância do ato de hoje. “Isto aqui não é o final, mas o início ou a continuação de uma história.”
Del Roio também cita o histórico das ossadas de Perus, encontradas em 1990 em uma vala clandestina no Cemitério Dom Bosco e que permaneceram durante certo período no Araçá. Agora, estão sob análise do Centro de Arqueologia e Antropologia Forense, da Universidade Federal de São Paulo. Sua companheira Isis, desaparecida em 1972, pode estar entre as vítimas.
Ao lado de Del Roio, o líder ferroviário Raphael Martinelli, que completará 93 anos em outubro, fala de suas origens operárias – o pai tinha 24 anos em 1917. O jornalista Sérgio Gomes comunica a morte da professora Ecléa Bosi, que ganha uma rápida homenagem.
Diretor da Fundação Perseu Abramo, ex-presidente da CUT e ex-secretário municipal do Trabalho em São Paulo, Artur Henrique vê a greve de 1917 como “uma mobilização contra a exploração do capital” e acrescenta que, passado um século, os trabalhadores organizam uma greve geral contra o “desmonte” da legislação trabalhista. Ressalta a importância da preservação da memória.
Neste ano, foi aprovado projeto do vereador paulistano Antonio Donato (PT) que deu origem à Lei 16.634, de abril. A lei inclui no calendário oficial da cidade o 9 de julho como Dia da Luta Operária.
O presidente da CUT, Vagner Freitas, observa que a esquerda foi mudando sua organização conforme a época – mas com os mesmos objetivos. “Desde o golpe (referência ao impeachment de Dilma Rousseff), as centrais e as frentes que formamos vêm combatendo de todas as formas. E a principal é a rua.”
“Do que são feitos nossos direitos? Em 100 anos tombaram quantos? Quantas mulheres foram estupradas, quantos jovens foram calados, quantos trabalhadores foram mortos?”, questiona a vice-presidenta da CUT, Carmen Foro, destacando a violência ainda presente no meio rural – 600 mortos em 30 anos, conforme a Comissão Pastoral da Terra (CPT), diz a sindicalista, paraense de origem. “A consciência da classe trabalhadora precisa estar conectada com seu passado, com sua história.”
(da Rede Brasil Atual)

Sete coisas invisíveis na vida de uma professora

Esse post não é uma obra de ficção: todos os fatos relatados abaixo aconteceram (e acontecem) comigo, professora universitária desde 1992, e com todas as professoras que conheço. Dedico esse texto às colegas da UERJ e das instituições do Estado do Rio de Janeiro em geral, trabalhando em condições aviltantes, há vários meses sem salário.…
Dando aula sobre a obra “A representação do eu na vida cotidiana”, de Erving Goffman, sempre me sensibilizo com o exemplo das enfermeiras. O autor utiliza essa profissão para ilustrar um tipo de atividade que precisa encontrar estratégias para tornar seu trabalho visível, já que boa parte de suas tarefas e habilidades técnicas passa despercebida pela maioria das pessoas.
Me espanta que o Goffman não tenha usado o caso dos professores, esses seres que só parecem trabalhar quando estão diante de alunos numa sala de aula, algumas horas por semana. Opa, que beleza de emprego, né? Só que não! Aquela horinha diante dos estudantes é uma ínfima parte de trabalho na representação cotidiana da nossa vida.
Para sanar esse problema, aí vão os bastidores da vida de uma professora, atividade que adoro exercer, mas que me faz acordar todos os dias pensando: como vim parar aqui?
1) A aula em si — Para cada 50 minutos de aula ministrada com entusiasmo, passo umas 3 horas estatelada de exaustão depois. Se a aula foi ruim, me torturo pela minha incompetência. Se foi boa, fico feliz e mais cansada ainda, porque dar uma aula boa significa empenhar mais o corpo, a emoção e a voz. Como a maioria das aulas é de dois ou três tempos seguidos, de até 3 horas e 30 minutos, multipliquem o tempo de “estatelamento” proporcionalmente. Ou seja, uma manhã dando aulas é um dia inteiro perdido. Um amigo meu chama esse cansaço pós-aula de “estado vegetativo”. É bem por aí.
2) Antes da aula (1) — Retrocedendo um pouco. Antes de dar uma aula, é preciso prepará-la, certo? Na minha prática, pelo menos, sim. Não confio na memória, muito menos na ideia de que os alunos lerão todo o material didático e terão perguntas capazes de me ocupar por um tempo inteiro. Portanto, só me resta preparar. Para 50 minutos de aula sobre um autor, digamos que eu tenha sugerido um texto de 50 páginas. Para reler esse texto com calma, anotando um resumo com seus pontos mais importantes, levo de duas a três horas. Para ler material de apoio e, em alguns casos, preparar um datashow, mais duas ou três horas. Agora multipliquem novamente para as 8 horas semanais em sala de aula. Numa semana dando aula terça e quinta, por exemplo, a segunda e a quarta estão perdidas nisso.
3) Antes da aula (2) — Ok, vocês devem estar pensando, mas você não repete os cursos de um semestre para o outro? Sim, às vezes. Por isso escrevi acima que iria “reler” um texto. Dificilmente coloco um material num programa de curso que eu nunca tenha lido antes. É muito arriscado. Por outro lado, se quero ser uma boa professora, vou ficar repetindo eternamente os mesmos autores, textos e aulas? Não dá. Preciso ler coisas novas, acompanhar debates interessantes na área e, no meu caso, principalmente, estou sempre me desafiando a planejar uma aula, não apenas um monólogo. Portanto, seja relendo, seja ampliando meus conhecimentos, seja planejando coisas novas, para cada hora em sala de aula, gasto pelo menos o triplo para me preparar.
4) As bombas de efeito moral — A sobrevivência ao looping preparação-aula-cansaço-preparação-aula-cansaço até que vai bem por umas seis ou sete semanas. O problema é que na oitava semana existem as bombas de efeito moral: corrigir a primeira leva de provas e trabalhos. Pelo menos na universidade, ainda não inventaram um sistema de dar aulas sem avaliar. Para corrigir bem cada prova levo cerca de 15 minutos. Se tenho 100 alunos num semestre, são 1500 minutos ou 25 horas. Ok, vocês vão dizer que estou exagerando. Não estou, mas darei um desconto. Digamos que eu não tenha tantos alunos assim, ou que eu leve apenas 8 minutos por prova (considerando que algumas são muito curtas ou inacabadas): ainda seriam quase 14 horas de correção. Como sou humana, o máximo que consigo me concentrar nesse tipo de atividade num dia é 5 ou 6 horas, o que, contando os intervalos para comida e cafeína, somam três dias inteiros só para as primeiras provas do semestre. Multipliquem pelas duas ou três avaliações seguintes… Isso sem falar na hipótese de ter que ficar verificando no Google se o estudante copiou um texto da internet. Quando acontece, volto três casas no video-game, porque preciso ligar para uma amiga professora, pedir um ombro para desabafar e me convencer de que nem tudo está perdido.
5) Como tudo aconteceu — Se vocês leram até aqui esse post, devem ter simpatia pelos professores ou, quem sabe, querem até exercer o ofício, certo? Pois então… como alguém se torna professor(a)? Nossa-senhora-do-tempo-de-estudo te abençoe, meu filho. São meses estudando para concurso, anos fazendo doutorado, mestrado, especialização e mais alguma coisa. Não vou entrar nas minúcias dessas pedreiras… Só façamos as contas. Nos tempos atuais, são uns dois anos de mestrado, mais 4 de doutorado, e pelo menos 1 ou 2 anos de dedicação (e um pouco de estado vegetativo, claro) antes ou depois disso tudo, o que dá fácil uns 8 anos estudando, escrevendo e outras coisinhas.
6) A vida paralela — Essas “outras coisinhas” que mencionei acima acontecem todas fora da sala de aula, e não são detalhes. Sempre que uma professora entra em uma sala de aula, dezenas de outras professoras estão: realizando pesquisas, dando palestras, orientando alunos (um mundão à parte!), participando de bancas e concursos de seleção, escrevendo pareceres e cartas acadêmicas, colaborando em comissões de inúmeros tipos, atuando junto às agências de fomento, implementando projetos de extensão, assumindo cargos administrativos, criando programas de pós-graduação, mestrados e doutorados, editando revistas científicas, gerindo grupos de pesquisas e entidades da área, preenchendo formulários, editais, relatórios e prestações de contas, lendo, escrevendo, publicando. O tempo nunca é o suficiente, porque a produção de conhecimento da humanidade é infinita — e esta é a matéria-prima de todos esses trabalhos, das aulas inclusive.
7) E a vida não-paralela — Ah, sim, e eu já ia esquecendo: também temos uma vida não acadêmica para viver. Nos apaixonamos, casamos, descasamos, sofremos, envelhecemos, temos filhos, doenças, famílias, casas, mudanças, paixões, histórias, atividades políticas, práticas e lúdicas. Tudo isso e mais um pouco.
Com certeza, esqueci de um monte de coisas, pessoal. Mas tudo bem. Que esses bastidores da nossa vida cotidiana sejam mais visíveis para que, além de faltar salário, não falte o reconhecimento de vidas inteiras dedicadas a esse ofício tão essencial a todos os outros.
Kuschnir, Karina. 2017. “Sete coisas invisíveis na vida de uma professora”, Publicado em karinakuschnir.wordpress.com, url:http://wp.me/p42zgF-2lk.
(da Carta Educação)

Pesquisa mostra que 9% consideram o governo Rollemberg ótimo ou bom

Um levantamento exclusivo do Correio, feito pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Análise de dados, revela que a avaliação do governador Rodrigo Rollemberg sofre um baque. Entre os entrevistados, 67% consideram a gestão do chefe do Executivo como ruim (18%) ou péssima (49%); e 31% classificam o governo Rollemberg como ótimo (2%), bom (7%) ou regular (22%).
Na divisão por faixa etária, os eleitores mais jovens, de 16 a 24 anos, e os mais idosos, acima de 60 anos, são os que têm uma melhor avaliação da administração do socialista.
As estatísticas revelam ainda que o eleitor está pessimista: 50% dos consultados acreditam que, daqui até o fim do mandato, a gestão Rollemberg vai piorar, 31% acham que a situação fica como está, 14% apostam em melhora, e 5% não souberam responder.
As estatísticas trazem algumas boas notícias para o governador. Dos temas analisados, alguns dos principais programas do GDF estão entre os que tiveram a melhor avaliação do eleitorado. A regularização de lotes, por exemplo, é aprovada por 17,8% dos entrevistados — tema com maior índice de aprovação. Já o ajuste nas contas públicas, com corte de gastos e suspensão de reajustes, tem o aval de 8,5% do eleitorado.
O levantamento ainda mostrou que o eleitor brasiliense está desiludido com a classe política e pessimista em relação ao futuro da cidade. Entre os cidadãos da capital federal, 91% ainda não sabem responder em quem votariam na disputa pelo Governo do Distrito Federal, o que mostra um cenário de indefinição na corrida eleitoral de 2018. Os moradores de Brasília rejeitam a maioria dos que já se articulam nos bastidores para concorrer ao Palácio do Buriti, mas não conseguem citar possíveis nomes novos, capazes de angariar votos no ano que vem.
A dura realidade para a classe política do DF é revelada por uma ampla pesquisa entre os eleitores, elaborada com exclusividade para o Correio Braziliense. O levantamento foi realizado pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Análise de Dados. Os pesquisadores ouviram 1.000 pessoas em 23 regiões administrativas. A margem de erro é de três pontos percentuais, em um intervalo de confiança de 95%. As entrevistas foram realizadas entre 1º e 5 de julho.

A nova classe do setor de serviços e a uberização da força de trabalho

O colapso no padrão de financiamento da economia nacional logo no início da década de 1980, com a crise da dívida externa, levou à adoção de programas de ajustes macroeconômicos que até hoje inviabilizam a retomada plena do crescimento econômico sustentado. No cenário aberto da semi-estagnação que prevaleceu, com fortes e rápidas oscilações nas atividades econômicas, o país terminou por romper com a fase de estruturação da classe trabalhadora vigente durante a dominância da sociedade urbana e industrial.

Desde os anos 1990, com a adoção do receituário neoliberal, o precoce movimento da desindustrialização da economia nacional se generalizou acompanhado do surgimento de uma nova classe trabalhadora de serviços. Isso porque se passou a assistir a expansão considerável do setor terciário, especialmente no âmbito dos pequenos empreendimentos no Brasil, portador de um inédito e crescente precariado de dimensão nacional.
Atualmente, quase 80% dos postos de trabalho existentes pertencem ao setor terciário da economia. E de cada três ocupações abertas no segmento privado não agrícola duas são provenientes dos negócios com até 10 trabalhadores.
Nessa nova classe trabalhadora de serviços em expansão prevalece elevada heterogeneidade, sobretudo nos pequenos empreendimentos que reúnem desde atividades associadas à estratégia de sobrevivência às ocupações tecnologicamente avançadas, com vínculos às grandes empresas nacionais e internacionais.
Por conta disso, o curso da nova classe trabalhadora de serviços assenta-se majoritariamente nas ocupações inseguras e amparadas por baixa remuneração. A realização de reformas neoliberais, em sua segunda versão a partir do governo Temer, liquida com a regulação fordista, desconstituindo o que restava das tradicionais classes médias assalariadas e dos trabalhadores industriais.
Em seu lugar termina por consolidar a geração do novo precariado, portador de intensa polarização social que se expressa pelo espontaneismo de lutas e agressividade das lutas. Cada vez mais, a nova classe trabalhadora de serviços torna-se exposta aos experimentos do uberismo na organização e remuneração da força de trabalho, o que faz com que a regularidade do assalariamento formal e a garantia dos direitos sociais e trabalhistas tendam a se reduzir drasticamente.
Nessa toada, avançam, por exemplo, os contratos de zero hora, cujo trabalho intermitente permanece ativo aguardando demanda do uso da força de trabalho advinda a qualquer momento. O esfacelamento nas organizações de representação dos interesses do mundo do trabalho (associações, sindicatos e partidos) transcorre mediado pela intensificação do grau de exploração do trabalho.
Como os direitos sociais e trabalhistas passam crescentemente a ser tratados pelos empregadores e suas máquinas de agitação e propaganda como fundamentalmente custo, a contratação direta, sem direitos sociais e trabalhistas libera à competição individual no interior da classe trabalhadora em favor dos patrões.
Os sindicatos ficam de fora da negociação coletiva e com restrição maior ao acesso à regulação pública do trabalho (direitos sociais e trabalhistas), o esvaziamento da organização se generaliza pela fragmentação da própria base social e territorial. Mesmo assim, permanecem ainda formas de lutas herdadas da fase de predomínio do novo sindicalismo, com a hierarquia e a estruturação das negociações coletivas de trabalho.
Por conta disso, as greves gerais do ano de 2017 no Brasil não deixaram de expressar certo padrão híbrido de organização e lutas dos trabalhadores, compatível inclusive com as jornadas de mobilização que em 2013 seguiram o processo de “propagação viral” de protestos, conforme também registrado em outros países. 
*Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, ambos da Universidade Estadual de Campinas.
(da Rede Brasil Atual)

Ativistas dizem que Estado laico é fundamental para avanço dos direitos LGBT

Ativistas e parlamentares reafirmaram nesta sexta-feira (7) a necessidade de um Estado laico para o avanço da luta pelos direitos LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros). Eles participaram de sessão solene no Plenário da Câmara dos Deputados em homenagem ao Dia do Orgulho LGBT, celebrado em 28 de junho.
Para a deputada Erika Kokay (PT-DF), é preciso enxergar a variedade de orientações sexuais e identidades de gênero antes da formulação de políticas públicas. Segundo ela, um dos pontos mais sensíveis da agenda LGBT é justamente a necessidade de separar a religião da luta pelos direitos civis.
“A lógica fundamentalista de achar que a sua forma de amar é a única, que a sua igreja é a única e que a sua forma de pensar é a única impede o avanço da própria humanidade”, sustentou.
Erika Kokay acrescentou que a intolerância em relação aos direitos dessa minoria coloca o Brasil em primeiro lugar no ranking de países que mais matam gays e lésbicas.
A parlamentar também criticou a recente decisão da Câmara Legislativa do Distrito Federal de derrubar o decreto que regulamenta a lei anti-homofobia. A lei que propõe uma série de direitos a essa minoria já tinha sido regulamentada pelo governador Rodrigo Rollemberg, mas a bancada evangélica distrital se articulou para revogar o texto. “O Estado vai passar a não encarar como natural as manifestações LGBT”, alertou Kokay.
Na mesma linha de discurso, o deputado Vicentinho (PT-SP) disse que não é “papel da religião rebaixar o ser humano, porque seu papel é o de nos qualificar”. “Nenhum de nós deve ser julgado ou pela cor da pele, ou pela orientação sexual, ou pelo nosso jeito de vestir e pensar”, reforçou.
Misoginia
Transexual, a coordenadora dos Direitos LGBT da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos (SEDH) do Ministério dos Direitos Humanos, Marina Reidel, também se preocupa com “tempos sombrios” de recrudescimento da violência com base em gênero. Ela reiterou que as manifestações de misoginia enfraquecem a autoestima dessa população e devem ser combatidas com mais rigor pelas leis antipreconceito.
“Nós sofremos no dia a dia porque parece que nós transpiramos sexualidade 24 horas, mas não. Nós também somos pessoas que temos sentimentos, nós também buscamos o amor, a paz, o direito e a cidadania”, defendeu.
Militância
A representante da Organização das Nações Unidas (ONU) na sessão solene, Rubi Martins dos Santos Correia, defendeu a capacitação de jovens transexuais para a militância por seus direitos e deveres. Ela participa da campanha Livres e Iguais, que identifica as demandas de gays e lésbicas para ter acesso aos seus direitos em diversos países.
“Está chegando uma geração com garra, que vai bater de frente, que vai apertar a tecla mil vezes até chegarmos em um patamar onde a gente seja respeitada, como a gente nasceu, no corpo que a gente tem, pelo nosso nome”, frisou.
(da Agência Câmara)

“A cisão provocada pela Base Nacional Comum é preocupante”

“Um projeto educativo não pode ser fragmentado, precisa ser pensado no seu conjunto. Essa cisão é preocupante”. É dessa maneira que a secretária de Educação de Minas Gerais, Macaé Evaristo, se refere à discussão da Base Nacional Comum Curricular.
Por determinação do governo, o documento que se encontra para parecer do Conselho Nacional de Educação – e que entra no ciclo de audiências públicas na sexta 7 – só se refere a Educação Infantil e ao Ensino Fundamental. A Base do Ensino Médio ainda se encontra em construção.
Macaé fala que o processo é fruto do momento traumático que se vive no país e na educação. E que a situação, é ainda mais preocupante para os gestores das redes educacionais.
Ela comenta que é comum que as escolas estaduais não atendam somente o Ensino Médio, mas também outras etapas da educação básica, como anos iniciais e finais do Ensino Fundamental e Educação de Jovens e Adultos. “Temos que lidar com o Ensino Médio sim, mas não só com ele”, afirma.
Em conversa com a Carta Educação, durante o 1º Congresso de Jornalismo de Educação, em São Paulo, a especialista também falou sobre a Reforma do Ensino Médio e como a proposta não dialoga com o desejo das juventudes. Confira aqui.
(da Carta Educação)

Maiores bancos do país devem mais de R$ 124 bilhões para a União

Os grandes bancos comerciais do Brasil são destaque entre os maiores devedores com a União. Juntas, as instituições financeiras somam mais de R$ 124 bilhões, de acordo com levantamento realizado pelo Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), divulgado ontem (5). A natureza de tais débitos envolve itens como Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), atividades de seguros, capitalização, resseguros, planos de saúde e previdência.

De acordo com o relatório, do montante, R$ 7 bilhões correspondem à dívida com a Previdência, R$ 107,5 milhões são referentes ao FGTS e R$ 117 bilhões representam o restante. Os dados inspiram críticas à proposta de reforma da Previdência, capitaneada pelo presidente Michel Temer (PMDB). “Existe dinheiro, muito dinheiro. Existe um órgão responsável pela cobrança que está cada vez mais sucateado, porque não existe interesse do governo em que esse dinheiro seja cobrado. Fazer uma reforma na Previdência dizendo que a conta, mais uma vez, tem que ser paga pelo trabalhador é muito delicado”, disse o presidente do Sinprofaz, Achilles Frias.

“Os bancos devem R$ 124 bilhões. São recursos do povo. Verbas que poderiam ser investidas em áreas como educação, saúde, segurança pública, infraestrutura e mesmo a Previdência, mas não é cobrada”, continua. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional possui a área de Estratégias de Recuperação de Créditos para cobrar os valores. Essa dívida pode ser ainda dividida entre situação regular ou irregular. As irregulares correspondem a R$ 82,6 bilhões e representam valores com cobrança ativa em andamento, sem garantia ou penhora de bens em execuções fiscais. Já a dívida em situação regular representa R$ 41,8 bilhões.

Para o senador Paulo Paim (PT-RS), presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Previdência, destinada a investigar o déficit no setor, alegado pelo governo federal para mover a reforma, “os grandes devedores partem pela seguinte linha: devo, não nego e não pago. Eles vão continuar brigando na Justiça dentro dos instrumentos que o processo permite. Infelizmente, não são empresas pequenas. São bancos como Bradesco, Itaú, Caixa, Banco do Brasil. Dívidas de bilhões”.

Frias ainda alerta para a possibilidade de o Estado negligenciar ainda mais tais cobranças. “Essas dívidas, que deveriam ser revertidas para o povo, podem ser privatizadas por projetos existentes no Congresso, de autoria e articulados por parlamentares ligados ao governo. Ou seja, deputados e senadores querem privatizar a dívida da União por meio de securitização, concessão, seja qual terminologia for, para permitir que os bancos que devem R$ 124 bilhões cobrem ou não suas próprias dívidas, deixando a população à mercê e sem esses recursos”, afirma.

“Enquanto o governo penaliza o cidadão, tributando severamente os trabalhadores e os pequenos e médios empreendedores por um lado, por outro, permite que os bancos do Sistema Financeiro Nacional fiquem livres de cobranças, e no futuro, com as dívidas privatizadas para eles mesmos, tenham o poder de nem sequer cobrar suas dívidas”, completa. Para o senador à frente da CPI da Previdência, “o discurso que é dado pelo governo é sempre o mesmo, que tem que penalizar o trabalhador mais uma vez, se não o Brasil vai quebrar. Mas eles não cobram os grandes devedores. E querem que a gente não reclame”, diz.

A tabela da dívida do Sistema Financeiro Nacional é pública e pode ser vista aqui.

(da Rede Brasil Atual)

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