Movimentos sociais pedem CPI sobre desvio na merenda escolar em SP

Movimentos sociais fizeram um protesto na Assembleia Legislativa de São Paulo para pressionar os deputados a aprovarem a abertura de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para apurar denúncias de desvio de verbas da merenda escolar da rede estadual de ensino.
As denúncias de pagamento de propinas a gestores do governo paulista para fechamento de contratos com creches e escolas públicas de 19 cidades estão sendo investigadas pela Operação Alba Branca, deflagrada no último dia 19. As irregularidades estariam ocorrendo há pelo menos dois anos.
Professores, estudantes, sindicalistas e integrantes de movimentos de moradia, que compõem a Frente Brasil Popular, lotaram as galerias da Assembleia Legislativa.
Para a presidenta do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), Izabel Noronha, a investigação deve levar à reposição dos recursos perdidos pela educação. “Não tem crime maior do que tirar comida da boca de criança. Ter uma CPI da Merenda é importante, porque a gente quer fazer voltar esse dinheiro e também uma alimentação de qualidade”, disse Izabel.
Ela destacou que a perda de verbas já tem impacto no tipo de alimento oferecido aos estudantes. “A merenda seca [como biscoito e suco em pó] virou rotina. Não se sobrevive só com bolacha. Muitas crianças vão para a escola justamente para completar a alimentação”, criticou a sindicalista.
O presidente da Assembleia Legislativa, Fernando Capez (PSDB), e o ex-chefe de gabinete da Casa Civil do governo estadual Luiz Roberto dos Santos, conhecido como Moita, estão entre os investigados pela Polícia Civil e pelo Ministério Público Estadual de São Paulo. No dia 16, o desembargador Sérgio Rui da Fonseca, do Tribunal de Justiça de São Paulo, decretou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de Capez. Em reunião fechada na capital paulista, também na semana passada, o Conselho de Ética do PSDB paulista decidiu instaurar um procedimento disciplinar interno para apurar a conduta de Santos.
Segundo o líder do PT na Assembleia, João Paulo Rillo, 22 deputados já assinaram o pedido de abertura da CPI, inclusive Capez, mas são necessárias 32 adesões. “O que chama a atenção é que o presidente assinou, ele é citado na história e demonstra interesse em esclarecer. O que é estranho é ele assinar e ninguém mais assinar junto”, afirmou Rillo. Ele criticou o fato de os trabalhos da assembleia estarem paralisados desde que a denúncia veio à tona. “A Casa tem obrigação pública de investigar e, como não quer, está fugindo do debate. Mas uma hora isso tem que acabar, temos que votar projetos”, afirmou.
A presidenta União Paulista de Estudantes Secundaristas (Upes), Ângela Meyer, disse que a CPI será importante para abrir o debate com a sociedade. “Para gerar o debate público e para que todo mundo possa participar aqui na Casa.”
Enquanto parte do público ocupava a galeria, estudantes aguardavam liberação para acessar o plenário. O fato de a polícia ter impedido a entrada dos manifestantes gerou tumulto na entrada da galeria, o que foi resolvido com a intervenção de deputados da oposição que, em diálogo com os policiais, autorizaram a entrada do grupo.

Operação Alba Branca

Na Operação Alba Branca, foram cumpridos 24 mandados de busca e apreensão em sedes de 16 prefeituras, na sede da Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (Coaf) e nas casas de suspeitos, além de seis mandados de prisão expedidos pela Justiça contra integrantes da cooperativa, com sede em Bebedouro (SP). Conforme as investigações, a empresa liderava o esquema e fornecia produtos advindos de pequenos agricultores rurais em produção familiar.
De acordo com o MP, a Coaf liderava o esquema de pagamento de propina. A cooperativa mantinha contratos com diversas prefeituras, com valores superiores a R$ 1 milhão, e um contrato com o governo estadual. A empresa também é investigada por fraudar a modalidade de compra “chamada pública”, que pressupõe a aquisição de produtos de pequenos produtores agrícolas. A empresa cadastrou cerca de mil pequenos produtores, mas comprava de apenas 30 ou 40 deles e adquiria também de grandes produtores e na central de abastecimento do estado, informou o MP.
A Secretaria Estadual de Educação manifestou interesse na investigação, dizendo que é preciso identificar os culpados e que se sente tão lesada quantos os alunos em relação ao desvio de recursos. Sobre a qualidade da merenda, a secretaria ressaltou que seriam necessárias provas sobre tais críticas, tendo em vista que o programa de merenda escolar da rede estadual é formulado por nutricionistas e contém 30% produtos orgânicos.
A assessoria do deputado Fernando Capez informou, por volta das 17h30, que ele ainda não havia decidido se falaria com a imprensa.
(do Uol)

Câmara rejeita isenção do Imposto de Renda sobre a remuneração de professores

A Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados rejeitou o Projeto de Lei 2607/11, do deputado Felipe Bornier (PSD-RJ), que concede isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física sobre a remuneração de professores.
Segundo o texto rejeitado, para ser beneficiado, o profissional precisaria estar em efetivo exercício na rede pública de educação infantil, fundamental, média e superior.
O parecer vencedor, do deputado Enio Verri (PT-PR), foi pela incompatibilidade e inadequação financeira e orçamentária da proposta.
Como, nesse caso, o parecer da Comissão de Finanças e Tributação é terminativo, o projeto deverá ser arquivado, a menos que haja recurso aprovado para que sua tramitação continue pelo Plenário da Câmara.
Inconstitucionalidade
O relator alertou para a inconstitucionalidade da proposta. “O principal impedimento é o descumprimento do comando constitucional que veda a concessão de tratamento tributário desigual entre contribuintes em situação equivalente, ou o estabelecimento de qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida”, diz Verri, ao recomendar a rejeição do projeto de lei.
O relator lembrou ainda que a aprovação acarretaria impacto sobre o nível de arrecadação do Imposto de Renda da Pessoa Física, em valor equivalente a R$ 7,18 bilhões em 2016, R$ 7,92 bilhões em 2017 e R$ 8,81 bilhões em 2018.
“O substitutivo apresentado anteriormente pelo deputado Edmilson Rodrigues (Psol-PA) propôs como compensação a duplicação da alíquota da CSLL das entidades financeiras, dos atuais 15% para 30%”, comentou Verri.
“Mas vale registrar que, recentemente, o governo federal já elevou de 15% para 20% a alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de instituições financeiras por meio da Medida Provisória 675/15, convertida na Lei 13.169/15”, acrescentou.
Acesse a íntegra da proposta: PL-2607/2011
(da Agência Brasil)

Em Goiás, OS podem virar cabide de emprego, alerta professor da UFG

Em vez de economia e excelência na gestão, conforme propalado pelo governador de Goiás Marconi Perillo (PSDB), a transferência da direção de escolas estaduais para gestores de organizações sociais (OS) pode desencadear o surgimento de cabides de emprego para amigos e familiares não só dos gestores dessas organizações como também de políticos ligados ao governo.
A suspeita é do professor de História da Universidade Federal de Goiás (UFG) Rafael Saddi. “Professores têm denunciado que políticos do PSDB têm prometido empregos nas OS. Não posso afirmar, garantir nada, mas está circulando essa informação. O que eu posso garantir é que o edital de contratação dessas OS, da maneira que foi feita, dá margem para que isso aconteça”, disse, em entrevista à RBA. “Afinal, elas podem contratar quem elas quiserem. Então fica fácil que vire cabide de emprego.”
“É o que aconteceu na saúde do estado. Vários empregados contratados são parentes dos gestores da OS. Na minha opinião, é uma ampliação dos cargos comissionados dos governos. Hoje, com a diminuição dos cargos comissionados, e as OS podendo contratar à vontade, vão contratar.”
Saddi é um dos 18 professores e estudantes presos na tarde de segunda-feira (15), por ocuparem a sede da Secretaria Estadual de Educação de Goiás contra irregularidades no edital para transferência do controle de escolas públicas para as OS. Depois de 48 horas detidos, tendo passado as noites ao relento – não foi permitida a entrada de colchonetes e não havia espaço nas celas – e sem receber todas as refeições enquanto aguardavam por uma audiência de custódia com o juiz, foram soltos na tarde da quarta-feira. Mas não estão livres de processo criminal por dano qualificado ao patrimônio público e corrupção de menores. Doutor em História dedicado à didática da disciplina, coordena projetos na UFG vinculados à escola pública, entre eles de iniciação à docência, que atua em quatro escolas públicas na cidade de Goiânia.
“Ápice do autoritarismo”, conforme a advogada Fernanda Ferreira, da organização Advogados do Povo (Abrapo), as prisões deram visibilidade ao movimento iniciado em novembro passado, com a ocupação de escolas em várias partes do estado, e à truculência da polícia do governo tucano de Goiás.
Na terça-feira, após identificar irregularidades no edital de chamamento das OS para administrar 23 escolas, o Ministério Público Federal, o Ministério Público (MP-GO) e o Ministério Público de Contas do Estado recomendaram o adiamento da convocação até que as irregularidades sejam solucionadas.
A seguir, os principais trechos da entrevista concedida pelo professor Rafael Saddi
O que vai mudar na educação com as OS?
Não vai mais ter concurso público. As OS fazem uma seleção pública. No caso do professor de História, há o risco de extinção da carreira. Sem estabilidade, sem concurso público, a qualquer momento o gestor da OS pode demitir quem não atingir a meta. O magistério é um trabalho intelectual que necessita de estabilidade, para garantir que não haja perseguição à diversidade de ideias. Na universidade, o que garante essa potência da diversidade intelectual é a estabilidade. E tem mais: a OS não fica obrigada a pagar o piso.
Como são designados os diretores das escolas em Goiás?
Em grande parte, são eleitos. Não acontece em todas as escolas, mas a maior parte é eleita pela comunidade escolar, pais, alunos e professores. O problema é que a política educacional foi reformulada há mais de dois anos, num projeto de Marconi Perillo que aumenta, e muito, a gratificação do diretor, que acabou ficando na mão do governador, que os retira mesmo que tenham sido eleitos, e coloca interventores no lugar. São muito pressionados. Com esse medo de ser retirado, e perder gratificação, ficam à mercê do governo.
Isso dificultou o movimento contra as OS?
Os diretores pressionaram os pais e professores de várias formas, fomos assediados e vamos denunciar ao Ministério Público as ameaças e os cortes de salário dos professores das escolas ocupadas. Nas escolas de tempo integral, o professor ganha uma gratificação de R$ 2 mil. Para pressionar, a secretaria anunciou que se a escola continuar ocupada, no mês seguinte corta a gratificação, colocando os professores contra os alunos. O estado costuma cortar a carga horária dos professores que participam de manifestações e greves. Há um histórico de retaliações.
Como foi a ocupação da Secretaria da Educação?
Alunos de três escolas que foram desocupadas decidiram ocupar a secretaria. A ocupação foi tensa. Logo que ocuparam, o subsecretario de educação, Marcelo Oliveira, encenou que estava em cárcere privado: se trancou na sala dele, fingiu. A imprensa começou a noticiar, dizendo que havia reféns. Mas os alunos, lá de dentro, filmaram que batiam na porta, tentando falar com as pessoas. ‘Marcelo, pode sair.’ Mostraram que a porta estava trancada por dentro, que não estavam mantendo ninguém refém. Pegou muito mal para os subsecretário, quando as imagens circularam pela internet, já que a imprensa inteira está fechada, nas mãos de empresários e do governo. A gente não consegue nenhuma imprensa local, da grande, para colocar a posição dos estudantes. A posição que prevalece é sempre a da Secretaria de Educação.
Houve diálogo entre governo e comunidade?
Medida tomada, fato consumado. Essa é a postura. Sempre foi essa a postura, de não ter diálogo. É a melhor e pronto, sem discutir com ninguém, com alunos, professores e a comunidade escolar. Com um agravante: todo mundo que começou a questionar foi acusado de ser grupo político partidário, que queria fazer oposição e que quer manchar a posição do governador, e não por crítica real ao projeto. Ou seja, somos classificados como líderes vinculados a organizações guerrilheiras, e não como estudantes e professores. Nunca houve diálogo. Depois das ocupações, a secretária Raquel Teixeira começou fazer propaganda das OS, num monólogo, sem ouvir. Ninguém sabe nada sobre o projeto, a sociedade está desinformada, não se sabe como vai funcionar. Há propaganda mentirosa. O governo diz que os professores continuarão a receber o atual piso salarial, o que não é verdade. O edital de contratação das OS diz que os professores contratados ‘poderão’ receber o piso. Se ela achar que pode pagar, paga, se achar que não pode, não paga. O edital não garante que o professor seja licenciado na área. Diz que deverão ser, de preferência, licenciados na área em que ministram a aula. Se quiserem contratar pessoas que não sejam licenciadas, vão poder.
E o Ministério Público já fez algo quanto à violência policial?
Concentramos lá as nossas denúncias de agressão, de assédio, mas até agora não tomou nenhuma atitude. A instituição diz estar tomando providências, que não apareceram, até agora. Ao menos, se apresentam como alguém responsável e que vai tomar providência. Até agora, efetivamente, não teve nenhuma ação do MP.
Esse projeto vem de gestões anteriores ao governo Perillo?
Não. Começou nesta gestão, num projeto decidido rapidamente. Não teve muito tempo de amadurecimento. No começo do ano passado, discutiam entre PPP e OS. Acabaram decidindo por OS e mandaram ver. Inclusive a secretária Raquel Teixeira sempre foi contra a ideia das OS, se posicionando abertamente contra. Chegou a dizer: ‘Nós sabemos que a OS têm lucro, mas o lucro é embutido e não fica transparente para a sociedade.’ Prevaleceram as OS. Perillo é um trator.
(da Rede Brasil Atual)

Conselho Nacional de Educação vai emitir parecer sobre OS em escolas de Goiás

O Conselho Nacional de Educação (CNE) analisa o projeto goiano de transferência da administração de escolas públicas estaduais para organizações sociais (OS) e, a pedido do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego), deverá expedir um parecer sobre a questão em até três meses. Segundo conselheiros, é papel do Estado ofertar educação de qualidade e a transferência pode configurar uma “declaração de incompetência”.
Embora o conselho ainda não tenha um posicionamento oficial, a questão preocupa os integrantes do colegiado, que têm muitas dúvidas sobre o projeto. Na última semana, durante reunião da Câmara de Educação Básica, que analisa a questão, a Agência Brasil conversou com conselheiros sobre a proposta do governo goiano.
“Não podemos responder por qualquer estado brasileiro que faça isso, porque tem direito de fazer, há brechas legais, espaços legais”, disse o presidente da Câmara de Educação Básica, Luiz Roberto Alves. Ele destacou, no entanto, que a Constituição Federal e leis educacionais definem que o responsável pela oferta de educação pública “é o instituído, que é o governador, secretário e as demais pessoas, esses são os responsáveis. O estado tem responsabilidade plena no processo de oferta e qualidade da educação”.
Para o conselheiro Antonio Ibañez, a iniciativa de Goiás demonstra falhas na gestão estadual da educação. “Estranho que o estado tenha que apelar para uma organização social para dizer que vai melhorar a educação. Isso para mim é uma declaração de incompetência. O estado não pode fazer isso porque ele continua sendo responsável”.
Pela proposta do governo goiano, organizações sociais, que são entidades privadas sem fins lucrativos, deverão cuidar da administração e infraestrutura de escolas e poderão também contratar professores quanto funcionários administrativos. As OS serão responsáveis pela formação continuada do corpo docente e pela garantia de melhorias no desempenho dos estudantes. O projeto-piloto começará por 23 unidades da Subsecretaria Regional de Anápolis, na região metropolitana de Goiânia.
A questão é polêmica. Desde dezembro do ano passado, estudantes secundaristas, professores e apoiadores ocupam escolas em protesto ao projeto. Eles chegaram a ocupar 28 escolas e a Secretaria de Educação, Cultura e Esporte (Seduce). A ocupação das escolas em funcionamento foi encerrada na última sexta-feira (19).
O Ministério Público Federal, o Ministério Público de Goiás e o Ministério Público de Contas do Estado recomendaram o adiamento do edital de convocação das OS. Promotores e procuradores consideraram vários pontos do edital inconstitucionais.
 
Veja abaixo trechos da avaliação de conselheiros do CNE ouvidos pela Agência Brasil sobre a proposta de Goiás de transferir a gestão das escolas para organizações sociais:
Luiz Roberto Alves
Presidente da Câmara de Educação Básica
“Os estados têm pleno direito de constituir o processo organizacional da rede. A Constituição, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) responsabilizam plenamente a autoridade instituída para fazer educação, junto com a família, junto com a sociedade. Nenhum governo pode imaginar que está chamando uma outra organização para compensar algo que é ruim, nenhum estado poderá dizer que o seu trabalho é ruim e que ele está chamando alguém para fazer no lugar dele. Os estados são plenamente responsáveis. O estado nacional, local, regional é responsável até as últimas consequências pela organização, finanças, currículo, trabalho com as crianças.
Nos anos 90 isso foi assunto corriqueiro: ‘o estado é incompetente, o estado não consegue fazer, vamos arrumar quem faça’, e até o mercado e outras instituições quaisquer seriam organizadoras melhores que o estado. Isso não pode ser verdade, nem constitucionalmente nem de acordo com a LDB.”
Antonio Carlos Caruso Ronca
Vice-presidente da Câmara de Educação Básica
“Eu tenho dúvidas [quanto a legalidade da transferência da administração das escolas para Oss]. Acho que há uma questão constitucional de que compete ao Poder Público a oferta de educação básica. Não sei se nós podemos entregar a educação básica pública na mão de OS, igreja ou qualquer outra situação.
Não temos ainda uma posição, mas quero estudar melhor essas questões que o Ministério Público está levantando. Está garantida a gestão democrática, que é constitucional? Está garantida a questão da gratuidade, mesmo com a imposição de taxas que porventura possam ser disfarçadas com outra finalidade? O princípio do Artigo 206 [da Constituição], de igualdade de condições para acesso e permanência, liberdade de aprender, isso está garantido? Todas essas questões, a meu ver, precisam ser estudadas com cautela.”
 
Antonio Ibañez Ruiz
Conselheiro
“Estranho que o estado tenha que apelar para uma organização social para dizer que vai melhorar a educação por OS. Isso para mim é uma declaração de incompetência. O estado não pode fazer isso porque ele continua sendo responsável. Mas vai ter a responsabilidade sem ter uma política, sem ter o dia a dia. De fato, a política de formação de educação quem vai ter é a OS e vai ter por objetivos que nós consideramos que não são os mais apropriados, que são as metas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Isso traz uma competição na escola enorme. Enfim, não vai ser nada que vai trazer melhorias.”
 
José Fernandes de Lima
Conselheiro
“A Constituição diz claramente que educação é direito de todos e dever do Estado. Então, o Estado não pode se abster de cuidar da educação na sua inteireza. E, ainda mais, o Artigo 208 estabelece as obrigações do Estado, desde a idade de atendimento e ainda diz que a oferta irregular deve ser penalizada. A oferta irregular pode ser caracterizada por várias dessas atividades que foram levantadas aqui. Considero que a preocupação é legitima e temos que nos debruçar sobre ela”.
(da Agência Brasil)

Fechamento de salas é 'natural', diz governador Geraldo Alckmin

O governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) afirmou nesta quinta-feira, 18, que é “natural” que salas sejam fechadas na rede estadual por causa da redução do número de alunos. O maior sindicato dos professores do Estado, a Apeoesp, tem afirmado que o governo estadual fechou mais de 1 mil salas neste ano, número não confirmado pela Secretaria Estadual de Educação.
“É natural que tenha menos salas de aula. Todo ano temos perto de 120 mil alunos a menos. O Brasil não é mais um país jovem, a rede diminui. Não tem como manter o mesmo número de salas de aula, é dinheiro público desperdiçado”, comentou o governador.
O “fechamento” das salas ocorre quando não há quantidade de alunos suficiente entre um ano e outro, reduzindo o número de turmas. Em 14 anos, a rede estadual de educação perdeu 1,8 milhões de estudantes, segundo estudo da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade).
Alckmin ressaltou ainda que o processo de reorganização da rede – medida anunciada no ano passado que visava fechar 93 escolas e dividir os colégios por ciclos – seria uma forma de lidar com as salas fechadas. O processo foi suspenso após uma série de protestos de estudantes. “Por isso nós queríamos a reorganização. Essas salas que não são usadas passariam para o ensino infantil”, disse. A intenção do governo estadual era transferir os prédios para as redes municipais – ação que, conforme revelou o jornal O Estado de S.Paulo à época, não era consensual entre as secretarias municipais de educação.

Sigilo

Alckmin também defendeu a publicação da Tabela de Classificação de Sigilos, lista publicada no Diário Oficial do Estado neste mês que impõe segredo a 22 assuntos, incluindo até informações de boletins de ocorrência. “Não podemos expor as pessoas. O boletim é público, mas não pode ter nome da vítima nem testemunha. O governo estaria cometendo um crime se fizesse isso. Só há sigilo para o que a lei determina, o resto é transparência total”.
(do Uol)

Valor do cartão material escolar do GDF cai de R$ 242 para R$ 80

As aulas na rede pública começam no dia 29 deste mês, mas as famílias beneficiadas pelo Cartão Material Escolar terão que esperar até o final de março para contar com o dinheiro dado pelo Governo do DF para comprar cadernos, lápis, caneta e borracha. E tem mais: o valor está bem abaixo daquele pago em 2014, último ano em que o benefício foi liberado. Serão R$ 80 contra R$ 242.
As regras para o retorno do benefício foram publicadas no Diário Oficial do DF nessa quarta-feira (17). Têm direito ao auxílio financeiro os alunos da capital do país cujas famílias sejam beneficiadas pelo programa Bolsa Família, do governo federal. O valor a ser creditado é o mínimo definido por lei por estudante, e os recursos financeiros são da Secretaria de Educação, Esporte e Lazer.
Um dos objetivos do cartão é complementar os gastos na aquisição do material por alunos da rede pública de ensino do DF, de acordo com a Lei 5.490, de 16 de junho de 2015. O valor foi definido, segundo o secretário de Educação, Esporte e Lazer, Júlio Gregório Filho, por meio de pesquisa de preço. “Fizemos o levantamento dos instrumentos básicos de que um aluno precisa para o ano letivo, como cadernos, lápis, canetas e borrachas”, explica.
O material escolar poderá ser adquirido nos estabelecimentos previamente credenciados pela Secretaria de Economia, Desenvolvimento Sustentável e Turismo. A chamada pública para isso deve ser divulgada nos próximos dias, de acordo com a pasta.
Cartão
Segundo a portaria, o Banco de Brasília fornecerá o Cartão Material Escolar, que terá a função débito. Os pais ou responsáveis podem fazer a retirada, e o período e os locais de entrega ainda serão definidos. Será um cartão por família, com o valor de acordo com o número de filhos que estejam na escola. Ele virá bloqueado, e as instruções para desbloqueio serão entregues com o objeto.
Os alunos a serem beneficiados pelo cartão ainda serão identificados. Para isso, a Secretaria do Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos colocará à disposição da pasta de Educação os dados cadastrais dos beneficiários do Bolsa Família.
Sem o benefício
O Cartão Material Escolar começou a ser repassado em 2013 aos alunos da rede pública do DF. Em 2015, não houve pagamento do benefício. Como a norma determina que o auxílio deve estar disponível até o fim do primeiro mês letivo, a verba que seria utilizada em 2015 foi convertida para o Programa de Descentralização Administrativa e Financeira (Pdaf).
O recurso foi repassado às unidades escolares para despesas de custeio, como compra de material didático, manutenção de equipamentos e pequenos reparos, além de execução de projetos pedagógicos. (Com informações da Agência Brasília)
(do Metrópoles)

Regras para o Cartão Material Escolar são definidas em portaria conjunta

Foi publicada nesta quarta-feira (17) no Diário Oficial do Distrito Federal a Portaria Conjunta nº 2, de 12 de fevereiro de 2016, que estabelece normas, diretrizes e competências para o uso do Cartão Material Escolar. Têm direito ao auxílio financeiro os alunos da capital do País cujas famílias sejam beneficiadas pelo programa Bolsa Família, do governo federal. O valor a ser creditado será de R$ 80 — mínimo definido por lei — por estudante, e os recursos financeiros são da Secretaria de Educação, Esporte e Lazer.
Um dos objetivos do cartão é complementar os gastos na aquisição do material por alunos da rede pública de ensino do DF, de acordo com a Lei nº 5.490, de 16 de junho de 2015.
O valor foi definido, segundo o secretário de Educação, Esporte e Lazer, Júlio Gregório Filho, por meio de pesquisa de preço. “Fizemos o levantamento dos instrumentos básicos de que um aluno precisa para o ano letivo, como cadernos, lápis, canetas e borrachas”, explica.
O material escolar poderá ser adquirido nos estabelecimentos previamente credenciados pela Secretaria de Economia, Desenvolvimento Sustentável e Turismo. A chamada pública para isso deve ser divulgada nos próximos dias, de acordo com a pasta.
Cartão
Segundo a portaria, o Banco de Brasília fornecerá o Cartão Material Escolar, que terá a função débito. Os pais ou responsáveis podem fazer a retirada, e o período e os locais de entrega ainda serão definidos.
Será um cartão por família, com o valor de acordo com o número de filhos que estejam na escola. Ele virá bloqueado, e as instruções para desbloqueio serão entregues com o objeto.
Os alunos a ser beneficiados pelo cartão ainda serão identificados. Para isso, a Secretaria do Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos colocará à disposição da pasta de Educação os dados cadastrais dos beneficiários do Bolsa Família.
O benefício
O Cartão Material Escolar começou a ser repassado em 2013 aos alunos da rede pública do DF. Em 2015, o governo de Brasília optou por aguardar a edição de uma lei sobre o assunto — antes, o programa era regido por portaria. Com isso, o programa foi instituído em junho pela Lei nº 5.490.
Como a norma determina que o auxílio deve estar disponível até o fim do primeiro mês letivo, a verba que seria utilizada em 2015 foi convertida para o Programa de Descentralização Administrativa e Financeira (Pdaf). O recurso foi repassado às unidades escolares para despesas de custeio, como compra de material didático, manutenção de equipamentos e pequenos reparos, além de execução de projetos pedagógicos.
(da Agência Brasília)

Argentina: Macri corta subsídios da era Kirchner e contas de luz vão subir 300% a partir de segunda

O governo do presidente argentino, Maurício Macri, anunciou, nesta quinta-feira (28/01), o fim dos subsídios concedidos nos últimos 12 anos ao fornecimento de energia elétrica, o que significará um aumento de pelo menos 300% na conta de luz dos argentinos de todo o país a partir de 1º de fevereiro.
De acordo com o ministro de Economia, Alfonso Prat-Gay, a medida foi adotada como forma de reduzir o déficit público de 7% acumulado pelo país. O fim dos subsídios representariam, segundo o governo, um impacto de 2,5% do PIB do país.
Dado o impacto da medida, os cerca de dois milhões de argentinos que vivem abaixo da linha da pobreza e os cerca de dois milhões de aposentados do país terão o subsídio mantido.
Além da energia, os aluguéis, mensalidade de colégios particulares, telefone e comida aumentaram nos últimos tempos. Frente a essa situação, sindicatos do país reivindicam aumentos salariais de acordo com a inflação. Os professores, por exemplo, pedem aumento de 35%.
Um dos maiores flagelos é o aumento do preço da carne, que aumentou 22% desde outubro do ano passado. Diante deste cenário, o Executivo chegou a recomendar que os argentinos evitem consumi-la para forçar o preço a baixar.
A recomendação foi feita pelo ministro da Agroindústria, Ricardo Buryaile, nesta quarta-feira (27/01): “o que nos resta é tomar consciência e trabalhar sobre o consumidor para que tenha em conta o nível de preços e se tiver que se abster de consumir, que o faça”, afirmou.
(do Portal Forum)

Qual é o futuro do Fórum Social Mundial?

Terminou no sábado 23 a edição temática do Fórum Social que, além de celebrar os 15 anos do processo iniciado 2001, no Rio Grande do Sul, também se propôs a debater, com seriedade, as perspectivas para a continuidade desta articulação global. A reflexão não começou agora. Já há quatro anos as organizações que integram o Conselho Internacional do FSM (CI) constataram que o espaço vinha perdendo relevância e a capacidade de pautar agendas e articulações de impacto global.
Muito diferente do que aconteceu em 2003, quando um chamado internacional pela paz saiu dos palcos do FSM em Porto Alegre, às vésperas da invasão no Iraque, e levou milhões às ruas em todo o mundo, hoje os obstáculos são muitos.
O mundo mudou bastante neste período, assim como as formas de organização da sociedade civil e movimentos populares. O FSM, entretanto, não conseguiu acompanhar de perto essas transformações. Atualmente, além das dificuldades internas de aglutinação do campo progressista, o chamado movimento altermundista enfrenta uma conjuntura externa muito mais complexa. E um inimigo cada vez mais forte.
“A velocidade de cruzeiro que o capitalismo alcançou em sua expansão está levando o mundo para o precipício. O sistema se transformou numa máquina de produção enlouquecida, insaciável. Uma máquina que, para produzir e ter lucro, destrói o que tem pela frente. Se a barragem estoura em nome do lucro, não tem problema”, avalia Chico Whitaker, da Comissão Justiça e Paz, um dos construtores do processo do FSM, em referência ao crime ambiental da Samarco, em Mariana/MG.
“É um sistema que está em crise, mas que domina a comunicação global e assim faz todo mundo acreditar que outro mundo não é possível nem necessário, que não há o que se fazer, que não estamos fazendo nada”, acrescenta.
No que pese os percalços do capitalismo, ele ainda é a força que detém hegemonia política, econômica e ideológica, acredita Givanilton Pereira, secretário de relações internacionais da CTB.
Na última mesa de convergência da programação deste Fórum Temático, o sindicalista lembrou que foi contra esses propósitos que o FSM se articulou, produzindo denúncias e mobilizações. “Socializamos consciência crítica para que os povos lutem e resistam contra a barbárie do capital. E a diretiva ‘outro mundo é possível’ se tornou inspiração para as lutas em todo o planeta”, afirmou.
Visões divergentes no seio do Fórum e as mudanças na conjuntura global têm, entretanto, dificultado a capacidade de produção de uma resposta à altura dos atuais desafios.
Para Oded Grajew, outro ativista dos primórdios deste processo, hoje na Rede Nossa São Paulo, o FSM está em crise, assim como as associações que dele participam. Reconhecer esta crise deve ser o primeiro passo para enfrentá-la e encontrar saídas que permitam ao “mundo do Fórum” dar um salto político.
“Temos que reconhecer nossa responsabilidade sobre essa crise. Só conseguiremos reerguer as forças do outro mundo possível e enfrentar o neoliberalismo se reconhecermos nossos erros, fizermos uma reflexão sincera sobre eles e construirmos outras formas de dar legitimidade às nossas ações. Se não conseguirmos mudar, haverá muito poucos conosco”, alerta Grajew.
Caminhos possíveis
O diagnóstico é duro, mas há caminhos possíveis. A presença de 15 mil pessoas nas atividades em Porto Alegre ao longo desta semana comprova que, apesar de todos os seus limites, o FSM é um legado antineoliberal e acumulou o patrimônio de articular organizações e movimentos com profundo conhecimento teórico e político dos campos em que atua, além de grande experiência prática, como lembrou Pereira.
Para o dirigente da CTB, com uma estratégia bem definida, esta importante frente política social pode jogar um papel maior na luta contra o capitalismo. “Mas para isso devemos ampliar a base política do FSM e forjá-la com objetivos comuns. Isso poderá maximizar sua energia, aumentar a capacidade aglutinadora do Fórum e elevar sua força transformadora. Essa é uma necessária atualização tática, para melhor se posicionar frente à transição geopolítica em curso”, analisa.
“Temos que considerar que existem novos sujeitos políticos se organizando, como os jovens que ocuparam as escolas em São Paulo, os jovens que vão à luta contra o aumento das passagens de transporte público, que lutam na África e na América Latina contra todas as formas de opressão”, diz Dennis de Oliveira, professor da Universidade de São Paulo e membro do coletivo de ativistas anti-racistas Quilombação. “É importante que se absorva essa rica experiência e é necessário que o FSM seja o espaço de articulação de todas essas lutas”, ressalta.
O momento seria, portanto, de envolver no processo do Fórum e dar visibilidade aos inúmeros e plurais sujeitos que têm protagonizado a resistência dos povos nos territórios e que têm ampliado as agendas de lutas. Dar conta dessa tarefa nada simples depende das opções que forem feitas no caminho.
Uma delas, sempre motivo de polêmica, é se o FSM deve ou não ser um espaço de tomada de decisão, com encaminhamentos e orientações concretas a seus participantes feitas após os encontros mundiais – que agora ocorrem a cada dois anos, mudança feita no curso desses 15 anos já como uma resposta às dificuldades políticas e financeiras dos movimentos se encontrarem anualmente em escala global.
“Buscamos novos formatos para que o Fórum possa, além de reivindicar, também incidir concretamente e, quiçá, até implementar diretamente algumas de suas propostas. Os sonhos têm que ter suas próprias ferramentas. Esperamos que o FSM tenha a possibilidade de construir sua própria ferramenta de incidência”, almeja Cesare Otonini, da AIH/Itália.
Questões internas e externas
O desafio, porém, ultrapassa a inclusão de novos atores e de processos decisórios. Passa, de certa forma, por todo o funcionamento do Fórum, incluindo as responsabilidades de cada organização membro do Conselho Internacional (composto por mais de 100 entidades) e a democracia interna do órgão.
“É possível oxigenar este espaço. E já estamos avançando neste sentido, com boa parte da organização do próximo Fórum Social Mundial sendo feita por jovens no Canadá, visto que o desafio de oxigenação no CI passa pela juventude”, acredita Rogério Pantoja, dirigente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e integrante do CI.
Por fim, será preciso também relacionar os desafios internos com o processo externo vivenciado por governos progressistas em âmbito global – e sobretudo na América Latina –, que chegaram ao poder com apoio significativo das organizações e movimentos que participam do processo do FSM.
“Não podemos desvincular nossas questões dos impasses, conflitos e  limites que esses governos tiveram, e que agora estão implicando nas derrotas que estamos tendo na região. Tais impasses são fruto de uma relação contraditória desses governos com a ordem geral capitalista, que se utilizou das ferramentas do capital para implementar uma série de políticas públicas”, critica Nalu Faria, da Marcha Mundial das Mulheres.
“Assim, não temos apenas uma rearticulação das forças imperiais para combater em nosso continente, mas também a incorporação e cooptação das nossas demandas no discurso do capitalismo”, aponta.
Que a energia militante e a vontade de construir lutas lado a lado, que animaram as discussões nos últimos dias em Porto Alegre, sejam a base para a condução deste complexo e também conflituoso processo de transição. “O futuro dependerá de como articulamos todas essas questões”, concluiu Nalu.
(da Carta Capital)

Dez anos do processo de mudanças na Bolívia: uma visão geopolítica

21 de janeiro de 2006: Evo Morales Ayma, numa cerimônia ancestral em Tiwanaku, toma posse como Apu Mallku (líder) dos povos indígenas da América Latina. Um dia depois, em 22 de janeiro, na Assembleia Legislativa, assumiu o cargo de Presidente da República da Bolívia. A mesma sequência se repetiria nos dias 21 e 22 de janeiro de 2010 e 2015, após ser eleito Presidente constitucional, desta vez já pelo Estado Plurinacional da Bolívia.
21 de fevereiro de 2016: nos 339 municípios – incluindo 11 nações autônomas indígenas camponesas constituídas ou em processo de constituição – que conformam os nove departamentos da Bolívia, será realizado um referendo constitucional para que o povo boliviano, de forma soberana e democrática, decida se pode reformar parcialmente a Constituição para permitir que o presidente Evo Morales e o vice-presidente Álvaro García Linera possam concorrer a mais um mandato nas eleições gerais de 2019.
Em apenas um mês, a revolução democrática e cultural boliviana viverá novos momentos transcendentais em sua história recente. Primeiro com a celebração, nestes dias 21 e 22 de janeiro, do aniversário do Estado Plurinacional, dez anos do processo de transformação do país. No mês seguinte, dia 21 de fevereiro, será a vez da jornada histórica que vai simbolizar a fortaleza da nova democracia boliviana, em contraste com a democracia neoliberal.
O referendo constitucional é, provavelmente, a votação mais importante que o processo de mudanças enfrenta desde a primeira vitória de Evo Morales e da coalizão MAS-IPSP, em dezembro de 2005. As espadas estão erguidas, e a direita boliviana, que já conseguiu introduzir o “cadeado” da não reeleição durante a Assembleia Constituinte, se une em prol do “NÃO” no referendo, convenientemente financiada pelo Departamento de Estado dos EUA, como recentemente denunciou o vice-presidente Álvaro García Linera.
A votação é a mais importante porque é a primeira vez que estará em jogo, em primeiro lugar, a possibilidade de que Evo Morales não seja o candidato das maiorias sociais em 2019. Em segundo lugar, porque em caso de derrota do “SIM”, o MAS-IPSP enfrentará o difícil desafio de continuar aprofundando o processo sem que seu líder nacional seja o presidente do Estado Plurinacional.
A figura de Evo Morales transcende os limites de um líder partidário, de um presidente de um país, é capaz de cristalizar os sonhos e as aspirações das classes populares, do movimento indígena originário camponês boliviano, marginalizado por séculos de colonialidade. Evo sintetiza as lutas anticoloniais empreendidas por Túpac Katari e Bartolina Sisa, mas também as lutas anticapitalistas durante a Guerra da Água e do Gás. Evo leva em seu ajayu (espírito em aymara, a força que contém tanto os sentimentos como a razão) um anti imperialismo forjado em sua luta contra a DEA e a USAID, contra a interferência da Embaixada dos Estados Unidos – que colaborou com a manobra que levou à sua expulsão do Congresso, quando ele era deputado. Um anticolonialismo que o converteu no líder internacional do movimento sindical e camponês durante a Campanha “500 anos de resistência indígena, negra e popular” que culminou em 1992, 500 anos depois da invasão da Nossa América – e a partir dessa campanha nasceu, em 1993, a Vía Campesina, organização latino americana ligada ao MST no Brasil, através da qual Evo terminou de definir seu próprio horizonte político e sua posição de estandarte em favor da soberania alimentar.
Por isso, todos os grandes avanços do processo boliviano podem ser situados nestas três coordenadas, começando pela nacionalização dos recursos naturais, que devolveu a soberania ao povo boliviano, permitindo uma redistribuição da riqueza sem precedentes nos quase 200 anos de história republicana, e iniciar um processo de transição ao socialismo que necessariamente passava por reforçar o Estado, para deixar para trás o neoliberalismo e marcar as coordenadas de um horizonte anticapitalista, a partir das formas de economia estatal e comunitária. A partir dessa base de melhora das condições materiais do povo boliviano, se traçou também um horizonte anticolonial, que transformou os imaginários da sociedade e começou um lento porém imparável processo de descolonização e despatriarcalização do Estado e da sociedade, rompendo os velhos paradigmas e começando a definir esse socialismo comunitário do bem estar, que é a estação final de um projeto político de liberação nacional e social, tudo isso a partir de uma nova relação com a Mãe Terra. E como não poderia ser de outra forma, a Bolívia adotou uma sólida posição anti imperialista tanto na política nacional como na internacional, que começou com a expulsão da DEA, da USAID e do embaixador estadunidense, e continuou com a denúncia de todas as agressões imperialistas e com a defesa da soberania nacional de qualquer país do mundo atacado pelo império.


Diplomacia dos Povos


Mas essa consciência anti-imperialista é somente parte de uma nova doutrina das relações internacionais e uma nova visão geopolítica do mundo multipolar que a Bolívia vem construindo, e que podemos definir sob o novo paradigma da Diplomacia dos Povos.
São numerosas as referências que podemos encontrar dentro desta nova Diplomacia dos Povos, impulsionada pelo Presidente Evo Morales e pelo chanceler Davi Choquehuanca, mas queremos destacar quatro:

• Em primeiro lugar, trasladar essa recuperação da soberania nacional e da dignidade do povo boliviano na esfera internacional, a partir da demanda levada à Corte Internacional de Justiça, em Haia, reclamando ao Chile por uma saída ao mar com soberania. Não podemos esquecer que o Chile arrebatou, através de uma agressão bélica, cerca de 400 quilômetros de costa que pertenciam à Bolívia. Um território, ademais (o precisamente por isso), rico em recursos naturais como guano, salitre, bórax, cobre e prata. Mas a marca de Evo está presente também na unificação dos interesses de uma nação através da demanda marítima, incluindo na mesma equipe a maior parte dos ex-presidentes, e inclusive tendo como porta-voz da causa a um ex-mandatário do período neoliberal, como Carlos Mesa. Essa unidade do povo boliviano, mas também a solidariedade internacional que a causa boliviana tem recebido, seria impensável com qualquer outro presidente.
• Um presidente que foi o principal impulsor da integração latino-americana, junto aos arquitetos da mesma, os comandantes Fidel Castro e Hugo Chávez. A Bolívia não só incorporou o TCP (Tratado de Comércio dos Povos) ao bloco bolivariano ALBA, como também foi um pilar importante da constituição da Unasul e da CELAC – mecanismo de integração regional que presidirá em 2017 –, e da que, em palavras do próprio Evo, “todos os presidentes estão convocados para participar, e vão participar, exceto Canadá e Estados Unidos (…) e isso, também é uma forma de nos liberar do domínio do império norte-americano”. Tampouco podemos esquecer da aproximação e do ingresso da Bolívia no Mercosul, e a posição crítica mantida sobre o mecanismo de desintegração regional conhecido como Aliança do Pacífico.

• A aposta pela integração latino-americana e caribenha vem acompanhada de um aprofundamento das relações Sul-Sul. Destaquemos, por exemplo, a presidência do grupo G77 China exercida pela Bolívia durante 2014, e a Cúpula do grupo das Nações Unidas, em Santa Cruz de la Sierra, que se realizará em junho deste ano. Trabalho e liderança que foram recompensados com a nomeação da Bolívia para presidir, também na ONU, o Comitê sobre o Processo de Reestruturação da Dívida Soberana, tendo como objetivo principal a defensa da soberania argentina contra os fundos abutre.

• Mas não só a Bolívia se destaca no âmbito da diplomacia multilateral. A nova Diplomacia dos Povos e o relacionamento Sul-Sul também se traduz no plano bilateral. Nesse sentido, devemos destacar, em primeiro lugar, as ótimas relações que existem com a República Popular da China, conduzida pelo PCCh e plasmadas num impulso à soberania científica e tecnológica boliviana, com a construção, na China, do satélite Túpac Katari (TKSAT-1), primeiro satélite de telecomunicações de propriedade do Estado Plurinacional da Bolívia. Tampouco podemos nos esquecer das relações com a Rússia, outra potência dos BRICS, país com o que se assinou um acordo para a construção de um centro de investigação nuclear e capacitação de pessoal para desenvolver energia nuclear com fins não só pacíficos, mas também médicos.

Além disso, com a nova Diplomacia dos Povos, da Bolívia para o mundo, o mundo também tem seus olhos sobre o que acontece no coração da América do Sul, principalmente por dois aspectos:

• Primeiro, o bom andamento da economia boliviana. Num contexto de crise do capitalismo e queda no preço do petróleo até os mínimos históricos, a Bolívia continua crescendo em torno de 5%, algo inédito numa América Latina que roçou o 1% de crescimento médio em 2015. Apesar de que o preço do gás está indexado ao do petróleo, que nestes momentos está por volta de 25 dólares por barril, a boa saúde da economia boliviana é algo notável, que se estuda inclusive na Faculdade de Economia da Universidade de Chicago, berço e laboratório do neoliberalismo.

• Em segundo lugar, a Bolívia está construindo no mundo um novo paradigma de relação com a natureza. Num planeta que chegou no limite da sustentabilidade, sob um modelo de crescimento que implode devido à prioridade que dá à manutenção do patamar de lucro do capital, a Bolívia impulsa um modelo de desenvolvimento que não implica em crescer na base do sofrimento e da exploração do povo, as pessoas ou a natureza. É necessário destacar aqui a aprovação da Lei da Mãe Terra, e da Lei do Desenvolvimento Integral para Viver Bem, que deve se tornar um modelo para uma humanidade na busca de outro modelo de desenvolvimento.
• Mas todos esses avanços e a contribuição boliviana à construção de um novo mundo multipolar são ameaçados por uma direita que, com a cumplicidade do imperialismo, quer impulsar na Bolívia a restauração conservadora que triunfou na Argentina e obteve um sucesso parcial na Venezuela. Sem esquecer a necessidade da formação política e da criação de novos quadros para continuar aprofundando a revolução democrática e cultural, é necessário terminar a refundação do Estado começada naquele 21 de janeiro de 2006, refundação que deve culminar em 2025, quando a Agenda Patriótica for completada e a Bolívia alcance uma segunda e definitiva independência, onde a extrema pobreza já tenha sido erradicada, e se consiga uma plena soberania econômica, científica, tecnológica ou cultural.

O processo de mudanças na Bolívia é, atualmente, por fatores tanto endógenos como exógenos, o mais sólido e estável da região. Mas para que essa estabilidade não seja ameaçada, é necessário o triunfo do “SIM” no referendo de 21 de fevereiro. Esse triunfo não só permitirá que Evo e Álvaro possam voltar a ser os candidatos do povo em 2019, mas também será um sopro de ar fresco para o processo continental, que deve voltar a tomar impulso após as derrotas eleitorais na Argentina e na Venezuela.
(da Carta Maior)

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