ONU aponta concentração do poder econômico nas mãos de poucas empresas internacionais

A economia mundial permanece em terreno instável uma década depois da crise financeira de 2008, com as guerras comerciais aparecendo como um sintoma de um mal-estar mais profundo, segundo o relatório publicado nesta quarta-feira (26) pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD).
O documento examina como o poder econômico está sendo concentrado em um número menor de grandes empresas internacionais, e o impacto que isso está tendo na capacidade dos países em desenvolvimento de se beneficiar de sua participação no sistema de comércio internacional.
Segundo o relatório, a hiperglobalização não resultou em um mundo de “ganha-ganha”. Mas nem o recuo ao nacionalismo nostálgico nem a duplicação do apoio ao livre comércio fornecem a resposta correta, afirma a UNCTAD. Para a conferência da ONU, o livre comércio reduziu o espaço político para os países em desenvolvimento e cortou as proteções para os trabalhadores e as pequenas empresas, ao mesmo tempo em que protegeu a renda das grandes empresas.
O documento da UNCTAD diz que a hiperglobalização não resultou em um mundo de "ganha-ganha". Mas nem o recuo ao nacionalismo nostálgico nem a duplicação do apoio ao livre comércio fornecem a resposta correta, segundo o relatório. Foto: Rafael Matsunaga/CC Flickr.

O documento da UNCTAD diz que a hiperglobalização não resultou em um mundo de “ganha-ganha”. Mas nem o recuo ao nacionalismo nostálgico nem a duplicação do apoio ao livre comércio fornecem a resposta correta, segundo o relatório. Foto: Rafael Matsunaga/CC Flickr.

A economia mundial permanece em terreno instável uma década depois da crise financeira de 2008, com as guerras comerciais aparecendo como um sintoma de um mal-estar mais profundo, segundo o relatório publicado nesta quarta-feira (26) pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD).
Segundo o Relatório de Comércio e Desenvolvimento 2018: Poder, Plataformas e Ilusão do Livre Comércio, enquanto a economia global teve uma retomada desde o início de 2017, o crescimento permanece espasmódico, e muitos países estão operando abaixo do potencial. Este ano é improvável haver uma mudança nessa engrenagem.
“A economia mundial está novamente sob estresse”, disse Mukhisa Kituyi, secretário-geral da UNCTAD. “As pressões imediatas estão aumentando em torno da escalada de tarifas e fluxos financeiros voláteis, mas por trás dessas ameaças à estabilidade global está um fracasso mais amplo — desde 2008 — de lidar com as desigualdades e desequilíbrios de nosso mundo hiperglobalizado”.
O relatório analisa as tendências econômicas atuais e as principais questões de política internacional e faz sugestões para abordá-las. O documento de 2018 examina como o poder econômico está sendo concentrado em um número menor de grandes empresas internacionais, e o impacto que isso está tendo na capacidade dos países em desenvolvimento de se beneficiarem de sua participação no sistema de comércio internacional e ganhar com novas tecnologias digitais.
O documento afirma que muitos países avançados, desde 2008, abandonaram as fontes internas de crescimento para as externas, mais notavelmente com a reviravolta da zona do euro de um déficit para para uma região de superávit. Mas isso só pode funcionar com a demanda interna de outros países — e, entre os países que dependem da demanda doméstica, muitos estão contando com uma combinação de dívida mais alta e bolhas de ativos em vez de aumentar os salários. Em ambos os casos, o crescimento é dificultado pela ameaça sempre presente de instabilidade financeira.
As maiores economias emergentes estão indo melhor neste ano, diz o relatório, e os exportadores de commodities podem esperar uma melhora, enquanto os preços permanecem firmes. Com exceção da Rússia, o crescimento nos outros quatro países do BRICS — Brasil, Índia, China e África do Sul — depende muito da demanda interna.
No entanto, esse não é o caso de muitas outras economias emergentes. Com os riscos negativos aumentando e as linhas de falhas financeiras se ampliando em vários países, o relatório vê as nuvens de tempestade se reunindo. O estoque atual de dívida é de 250 trilhões de dólares — 50% mais do que no momento da crise e três vezes o tamanho da economia global. A dívida privada, particularmente a dívida corporativa, tem estado por trás desse surto de endividamento, mas sem estimular o investimento das empresas — uma desconexão que causa problemas à frente.
Mesmo que as economias avançadas não tenham feito o suficiente para reequilibrar a economia global, há preocupações de que suas políticas monetárias “normalizadoras” possam causar novas ondas de choque por meio dos mercados de capitais e de moedas, com uma espiral econômica perigosa em economias mais vulneráveis.
“O crescente endividamento observado globalmente está intimamente ligado ao aumento da desigualdade”, disse Richard Kozul-Wright, principal autor do relatório. “Os dois têm sido conectados pelo crescente peso e influência dos mercados financeiros — uma característica definidora da hiperglobalização”.
O comércio global continua a ser dominado pelas grandes empresas diante de sua organização e controle das cadeias de valor globais. Em média, 1% das empresas exortadoras respondem por mais da metade das exportações de cada país.
A disseminação dessas cadeias contribuiu para um rápido crescimento do comércio de meados dos anos 1990 até a crise financeira, com os países em desenvolvimento apresentando o crescimento mais rápido, inclusive negociando mais uns com os outros.
Mas o relatório mostra que os países tiveram que negociar mais intensamente para gerar o mesmo crescimento da produção na comparação com o passado, e que muito desse comércio foi desigual, com ganhos distorcidos em favor de empresas líderes através de uma mistura de maior concentração de mercado e controle de ativos intangíveis.
O relatório documenta um declínio geral — com a China sendo uma exceção — na participação do valor agregado das atividades industriais nessas cadeias e um aumento da participação das atividades de pré e pós-produção; as rendas capturadas nesses extremos da cadeia tiveram um efeito pronunciado na distribuição em todos os países. “As empresas superstar são um fenômeno global, e suas estratégias de busca de renda se estendem por fronteiras”, diz Richard Kozul-Wright.
Quer signifiquem ou não uma guerra comercial, as recentes rodadas de aumento de tarifas interromperão um sistema de comércio desenhado cada vez mais em torno das cadeias de valor, embora o crescimento do comércio em 2018 provavelmente seja semelhante ao de 2017.
No entanto, as consequências de qualquer grave escalada poderiam, através de maior incerteza e redução do investimento, trazer consequências mais prejudiciais a médio prazo, diz o relatório. Estas podem ser particularmente graves para países que já enfrentam dificuldades financeiras.
Além disso, como as tarifas funcionam alterando a lucratividade das empresas nos setores comercializáveis, elas têm conseqüências distributivas e afetam a demanda de formas que exigem uma avaliação cuidadosa.
O relatório inclui projeções que destacam os possíveis riscos, e conclui que “após décadas experimentando os limites do ‘livre comércio’, seria trágico abraçar o extremo oposto — uma guerra de tarifas comerciais — em vez de considerar o que os governos poderiam fazer, através da coordenação de políticas globais, para evitar a contínua deterioração da distribuição de renda e do emprego que estão na raiz das crises econômicas mais recentes”.
O documento diz que a hiperglobalização não resultou em um mundo de “ganha-ganha”. Mas nem o recuo ao nacionalismo nostálgico nem a duplicação do apoio ao livre comércio fornecem a resposta correta, segundo o relatório. Além disso, o livre comércio se mostrou uma folha ideológica que reduziu o espaço político para os países em desenvolvimento e cortou as proteções para os trabalhadores e as pequenas empresas, ao mesmo tempo em que protegeu as tendências de busca de renda das grandes empresas.
No mundo real, as guerras comerciais são um sintoma de um sistema econômico e arquitetura multilateral degradados, diz o relatório, enquanto a doença é um círculo vicioso de captura política corporativa e crescente desigualdade onde o dinheiro é usado para ganhar poder político e poder político é usado fazer dinheiro.
“Velhas e novas pressões estão pesando sobre o multilateralismo”, disse Mukhisa Kituyi. “Em nosso mundo interdependente, soluções voltadas para dentro não oferecem um caminho a seguir; o desafio é encontrar maneiras de fazer o multilateralismo funcionar”.
Para evitar repetir os erros da década de 1930, a UNCTAD sugere o retorno à Carta de Havana, que foi a tentativa inicial de estabelecer um sistema comercial multilateral gerenciado. Fazer isso significa assumir muitos novos desafios — desconhecidos pelos signatários da Carta em 1948 — que exigem cooperação internacional efetiva.
No mínimo, priorizaria três ações: vincular as discussões sobre comércio a um compromisso de pleno emprego e salários crescentes, regular o comportamento corporativo predatório e garantir espaço político suficiente para assegurar que os países possam gerenciar sua integração de acordo com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Temer tenta leiloar lotes da Eletrobras com valor inferior ao investido

O leilão de 18 lotes de empreendimentos do sistema Eletrobras, de norte a sul do país, realizado nesta quinta-feira (27), na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), rendeu menos da metade do que o governo do golpista e ilegítimo de Michel Temer (MDB-SP) previa.
Foram arrecadados apenas R$ 1,3 bilhão, que representa apenas 42% dos R$ 3,1 bilhões de reais pretendidos pelo governo. E sete lotes não receberem ofertas.
Para os trabalhadores e trabalhadoras do sistema Eletrobras, quem mais perde com o leilão é o povo brasileiro, primeiro porque os milhões investidos pelo governo estão sendo jogados no ralo, depois com as contas de luz mais altas cobradas pelas empresas privadas.
Somente um dos três lotes da Eletrosul – o Hermenegildo, de geração eólica – recebeu investimentos de R$ 500 milhões de dinheiro público e o governo golpista quer vender os todos os lotes por apenas R$ 118 milhões, denuncia Fabiola Latino, secretária de Energia da Confederação dos Urbanitários.
“É a entrega do patrimônio público. Ainda bem que não teve comprador. Mas não sabemos ainda se os lotes não foram vendidos porque os compradores não tiveram tempo de organizar a documentação (o leilão foi marcado com prazo de apenas um mês entre o anúncio e sua efetivação), ou eles estão preocupados com as ações que os trabalhadores entraram junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) e que ainda aguardam posicionamento dos ministros”, diz Fabiola, que também é diretora-executiva dos Urbanitários do Distrito Federal.
Segundo ela, está marcada para esta sexta-feira (28), a partir das 9h da manhã, a audiência pública marcada pelo ministro do STF Ricardo Lewandowski para que sejam ouvidos os representantes dos trabalhadores sobre a venda da Eletrobras e de todas as empresas públicas, como a Petrobras. O ministro chegou a dar uma liminar para impedir os leilões da Eletrobras dizendo que a decisão da venda deve passar pelo Congresso Nacional.
Apesar da liminar de Lewandowski, dois lotes colocados para leilão são de empreendimentos em que a Eletrobras é majoritária, detendo 99% das ações que dão lucro para a estatal.
“Isto nos causou certo espanto, já que esses lotes foram objeto de questionamento junto ao Ministério Público Federal (MPF) e ao Supremo. O leilão deveria ser suspenso até o julgamento das matérias”, diz Fabiola Latino.
Para ela, o governo ilegítimo tenta quebrar a estatal. “Eles pegam empreendimentos rentáveis e entregam ao setor privado. A grande maioria dos lotes colocados à venda é de empreendimentos já praticamente pagos, e se forem vendidos quem comprar vai ter somente lucros que deveriam ser revertidos para o povo brasileiro”, lamenta a dirigente.
O leilão da Eletrobras
A elétrica Taesa, controlada pela Cemig e pela colombiana Isa , arrematou três lotes e a Alupar, dois.
As empresas Equatorial, Copel, J. Malucelli e Brennand Energia também levaram lotes, assim como o consórcio Olympus VI e a Serra das Vacas Participações.
Dentre os empreendimentos negociados, apenas dois registraram ágio – o lote J, que ficou com a Copel por um preço 20,35 % superior ao mínimo, e o comprado pelo consórcio Olympus VI, com ágio de 10 por cento.
Fonte: CUT NACIONAL 

Assassinatos de quilombolas crescem 350% em um ano no Brasil

O número de assassinatos de quilombolas no Brasil saltou de 4 para 18 em um ano, de 2016 a 2017, o que configura um aumento de 350% no período. O dado é um dos destaques do relatório intitulado “Racismo e violência contra quilombos no Brasil”, divulgado oficialmente na noite desta terça-feira (25), em Brasília (DF).
Inédito no país, o levantamento foi realizado pela ONG Terra de Direitos e a Confederação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), em parceria com a Associação de Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais da Bahia (AATR) e o Coletivo de Assessoria Jurídica Joãozinho de Mangal.
Élida Lauris, integrante da equipe de coordenação da pesquisa e membro da Terra de Direitos, destaca que os dados expõem o forte racismo contra o povo quilombola. De forma associada a isso, ela ressalta o peso das disputas territoriais promovidas por fazendeiros e outros atores com poder econômico responsáveis por diferentes ataques às comunidades.
“Existem projetos de desenvolvimento que vulnerabilizam as  comunidades e estão associados com as lógicas de racismo ambiental, racismo econômico e de desproteção das comunidades aos lhes recusar os direitos territoriais”, aponta a pesquisadora.
Segundo a Conaq, ao todo, existem cerca de 3.200 comunidades quilombolas oficialmente reconhecidas no Brasil, mas, por conta dos impasses políticos, menos de 300 delas têm o título da terra que ocupam.
O estudo também levantou dados de assassinatos em anos anteriores. Na série histórica de 2008 a 2017, foram assassinados 32 homens e seis mulheres quilombolas, sendo 29 deles (76,3%) no Nordeste. A região tem histórico de resistência e insurgência popular, especialmente no campo.
Considerando os dados totais de 2017, o relatório identificou ainda que 68,4% dos assassinatos registrados foram praticados com arma de fogo e 13,2% com armas brancas.
A militante Divânia Silva, da coordenação da Conaq, sublinha que os efeitos da violência são considerados devastadores porque, entre outras coisas, trazem grave risco à manutenção dos modos de vida e da sobrevivência dos povos quilombolas no Brasil.
Ela salienta ainda a apreensão e a preocupação das comunidades com a falta de ações efetivas por parte de órgãos como os do sistema de Justiça.
“[Elas] têm se sentido pressionadas, desprotegidas porque a Justiça não tem conseguido sequer apurar os casos de assassinatos para punir os culpados. Cada vez mais se tenta colocar panos quentes ou acobertar determinados crimes”, desabafa.

Violência de gênero

No panorama das agressões contra os povos quilombolas, ressalta-se ainda o recorte de gênero. É marcante, entre as estatísticas da pesquisa, a presença de assassinatos de mulheres praticados com requintes de crueldade, com uso de faca, fogo, botijão de gás, entre outros instrumentos.
Ao todo, 66% das mortes notificadas se deram com uso de arma branca ou com métodos de tortura. No caso dos homens, tais casos têm índice menor, representando 21% do universo total de assassinatos.
A pesquisadora destaca que, em geral, as mulheres assassinadas têm perfil de liderança política e que os métodos utilizados pelos assassinos têm forte caráter patriarcal.
“Esse nível da crueldade é um exercício da violência sobre o corpo, o que significa dizer que toda a discussão que estamos fazendo sobre assegurar os direitos territoriais como maneira de garantir a segurança do território e ultrapassar a situação de violência, no caso das mulheres, não é suficiente”, afirma.
A pesquisadora acrescenta a necessidade de formulação de políticas públicas de proteção das mulheres que deem conta da realidade específica das quilombolas.
Mirando esse objetivo e ainda o atendimento às outras demandas relacionadas à violência identificada no relatório, os organizadores da pesquisa pretendem enviar o levantamento para diferentes órgãos oficiais, convertendo-o num documento de luta política.
“Essa realidade é desvelada pra gente conseguir produzir resultados em políticas públicas efetivas e integrais pras comunidades quilombolas”, finaliza.
Fonte: CUT Nacional

Argentina vive a maior crise econômica desde 2001, diz economista

Ida ao FMI, que deveria servir para aumentar a confiança, alarmou a população e o mercado. Volatilidade do dólar impacta na inflação e faz a pobreza aumentar, conforme reconhece até mesmo Macri
Na semana passada, o presidente argentino, Maurício Macri, anunciou a ida do país ao FMIpara conseguir adiantamento de um linha de crédito que totaliza US$ 50 bilhões. O que era para servir como uma espécie de resgate da confiança na econômica do país alarmou ainda mais o mercado e toda a população. A última vez que a Argentina recorreu ao fundo foi em 2003, na esteira da pior crise econômica e política que eclodiu em 2001, quando o país teve cinco presidentes em doze dias.
Agora, o peso já desvalorizou mais de 50% em relação ao dólar desde o início do ano, a taxa de juros foi elevada para 60% e a inflação ultrapassa os 32% anuais, extrapolando uma das metas fixadas junto ao próprio FMI. Para o economista argentino Ramon Vicente Garcia Fernandez, professor do Centro de Engenharia e Ciências Sociais (CECS) da Universidade Federal do ABC (UFABC), o ano de 2018 “marca a maior crise desde 2001”.
“Pegou de surpresa todo mundo. As pessoas pensavam que as contas podiam estar mal, mas a decisão dele de ir ao FMI realmente chocou o país. A ida, ao mesmo tempo que serve para resgatar a confiança, destrói essa mesma confiança. Por outro lado, o FMI ainda impõe uma série de condicionalidades.”
Garcia Fernandez, que esteve em seus país natal, diz que, na última semana, por conta da volatilidade do dólar, algumas empresas chegaram a paralisar as vendas. “Simplesmente seguraram os estoques e estão esperando a tormenta passar”. Ele não é otimista, e prevê que a recessão deve se agravar nos próximos dois trimestres, ou mais, antes de parar de piorar.
“Na Argentina, o valor do dólar é fundamental. As pessoas pensam em dólar. A mudança da cotação é questão que se discute não só em roda de economistas, mas em uma roda de taxistas vai se estar falando também sobre quanto está o dólar. Os tomadores de preço muitas vezes pensam em dólares. A garrafa de vinho, por exemplo, não vendem a 100 pesos, mas a cinco dólares. Agora, são 200 pesos. Por outro lado, não se pode aumentar tudo loucamente, senão as pessoas não conseguem comprar.”
Para conter a alta da moeda americana, o Banco Central argentino vem queimando suas reservas internacionais, que são equivalentes a menos de 10% das reservas brasileiras, por exemplo. “Quando chegaram os primeiros US$ 15 bilhões do FMI, as reserva estavam em US$ 63 bilhões. Agora, já caíram para 51 bilhões, em menos de dois meses. Vai vir um pouco mais de grana do FMI, mas você não pode ter um país que continua sorvendo 10% das reservas por mês. Em dez meses, zerou.”
Segundo o economista, a Argentina tem um problema de contas externas que é “praticamente insolúvel”, agravado pelas políticas liberais de Macri, que retirou impostos também do setor exportador e agora teve que subir as tarifas, por indicação do FMI. “Liberaram todas as importações. Do lado da balança comercial quer dizer que, por mais que se consiga exportar, se está sempre tendo um problema que as importações estão inundando o país, reduzindo o espaço da indústria e da produção nacional.”
Por aqui, a imprensa tradicional vende a crise argentina como se fosse apenas um problema de confiança dos mercados, mas, segundo Garcia Fernandez, o buraco “é mais embaixo”. “Acho que tem um problema bem maior que isso. É o que os economistas chamam de ‘restrição externa argentina’, ou seja, o déficit de moeda estrangeira. A origem do problema é essa. Não é possível ter um país que fica se endividando para que as pessoas levem grana para offshore, passem férias em Miami ou comprem pirulitos importados. É um país inviável.”
Ele diz que até mesmo o choque no turismo contribuiu para a crise de falta de dólares, com toda a classe média alta indo de férias para Miami, e poucos turistas vindo para a Argentina. Soma-se a isso os argentinos que compram dólares para poupar em moeda forte, ou ainda os super-ricos, que evadem divisas em contas offshore. Com o aumento da taxa de juros nos Estados Unidos, essa combinação “faz com que a Argentina esteja precisando de dólares desesperadamente”, diz o economista da UFABC. “E esses dólares não vêm.”
Garcia Fernandez diz ainda que os cortes nos ministérios – Macri reduziu de 22 para 10, retirando o status de ministérios de pastas como Energia, Trabalho, Agroindústria, Saúde, Meio Ambiente, Ciencia e Cultura, dentre outros –, que devem resultar em uma economia de cerca de US$ 9 bilhões, segundo o governo, também não são significativos perante a totalidade dos gastos, e ainda podem aprofundar ainda mais a crise.
“Os cortes nunca são a saída porque o próprio corte aprofunda a recessão. O problema é que cortar o déficit significar reduzir o gasto público na economia. Isso implica em suspender obras”, explica o economista. Além da criação de emprego e renda, Macri chegou a idealizar um conjunto de obras públicas na periferia de Buenos Aires para conseguir apoio dessa população, que tradicionalmente vota com os peronistas. Agora já cortou oficialmente mais de 60% das obras pretendidas, e as outras enfrentam interrupções por falta de pagamento aos operários.
O economista diz que a situação social só não é mais grave devido aos programas sociais criados durante os governos de Néstor e Cristina Kirchner – transferência de renda, como o Bolsa Família, e restaurantes populares, por exemplo – que servem como uma “rede mínima de contenção” do avanço da pobreza. Contudo, nos últimos dias, também foram registrados inclusive saques em supermercados, sinal de desespero de parte da população, que também fazem lembrar os tempos de 2001.
Até o presidente reconheceu, no mesmo dia em que anunciou a busca de um acordo com o FMI, que a pobreza, que atinge 30% da população argentina, deve aumentar nos próximos meses. “O número oficial deve sair daqui um mês. A pobreza está aumentando, só não se sabe o quanto”, diz o professor, que chama a atenção para a resposta da população no próximo dia 25 de setembro, quando as centrais convocam uma greve geral contra as medidas do governo Macri e o acordo com o FMI. “As pessoas estão muito insatisfeitas e a própria base do Macri está começando a se desmilinguir.”
Fonte: RBA

Diap divulga lista de senadores e deputados que votaram contra trabalhadores

Seja qual for o presidente da República no próximo período – e esperamos que a classe trabalhadora ajude a eleger parlamentares comprometidos com os direitos trabalhistas –, precisará de apoio do Congresso para quebrar retrocessos impostos pelo golpista Michel Temer (MDB) e sua base aliada.
Para facilitar a escolha de deputados federais e senadores, o Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar) disponibiliza em seu portal o voto dos congressistas em 10 temas que marcaram a atual legislatura e afetam os trabalhadores e a democracia.
A lista mostra de qual lado estiveram os congressistas no impeachment da presidenta Dilma Rousseff, na cassação do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), na entrega do pré-sal aos estrangeiros, na terceirização da mão-de-obra sem limites, na primeira e segunda denúncia contra Temer, na reforma trabalhista, na PEC dos gastos públicos, na MP das petroleiras e na tentativa de reforma trabalhista.
A análise do banco de dados que será atualizado até o fim das eleições, em 28 de outubro, permite observar, por exemplo, entre os candidatos à presidência, quem esteve contra e a favor da retirada de direitos dos trabalhadores. Dos atuais postulantes ao cargo, os deputados federais Jair Bolsonaro (PSL), Cabo Daciolo (Patriotas) e o senador Álvaro Dias (Pode) são os únicos que tinham mandato no Congresso.
Reforma trabalhista – A Câmara dos Deputados aprovou em 26 de abril de 2017 o Projeto de Lei (PL) 6.787/16, que acaba com a carteira assinada, por 296 votos a 177. No senado, o texto chegou como Projeto de Lei da Câmara (PLC) 38/17 e passou por 50 votos contra 26.
Na Câmara, Bolsonaro votou a favor da reforma trabalhista e contra os trabalhadores, enquanto Daciolo votou não à reforma. No Senado, Dias também foi contra a reforma.
Terceirização sem limites – Junto com a reforma trabalhista, outro golpe contra os direitos da classe trabalhadora foi a terceirização sem limites, aprovada em março de 2017 por 232 votos a favor contra 188 por meio do PL 4.302/98.
Desta vez, Bolsonaro se absteve (omitiu o voto), enquanto Daciolo votou contra o projeto.
Entrega do pré-sal – Em outubro, a Câmara aprovou o PL 4.567/16, que abre para outras empresas, nacionais e estrangeiras, a exploração do pré-sal, que era tinha a Petrobras como exploradora única.
Conforme o desejo de Temer, mais uma vez, Jair Bolsonaro votou a favor da entrega da riqueza, enquanto Cabo Daciolo optou pelo não. Álvaro Dias, no Senado, também se posicionou por seguir as orientações do governo golpista.
Limite para investir em saúde e educação – Em 10 de outubro de 2016, a Câmara aprovou por 366 votos a 111 a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241/16 que limita por 20 anos o investimento público em setores como saúde e educação. No Senado, o texto foi aprovado por 61 votos a 14, em novembro de 2016.
Novamente, Bolsonaro seguiu o comando do governo Temer e foi a favor do congelamento, enquanto Daciolo se posicionou contra. No senado, Álvaro Dias também votou com os golpistas.
Para saber como votaram os parlamentares em relação aos projetos e escolher bem o parlamentar que elegerá para o próximo mandato, clique aqui.
Fonte: Contracs – Luiz Carvalho com informações do Diap

Golpe arrastou 23 milhões para a miséria

Depois do golpe, o Brasil arrastou de volta à miséria o equivalente à população do Chile. Foram nada mais nada menos do que 23,3 milhões de pessoas empurradas para a linha abaixo da pobreza. O dado é estarrecedor: trata-se de 11,2% da população brasileira. São pessoas que voltaram a viver com menos de R$ 203 por mês.
A pesquisa que afere esta mobilidade social invertida – o exato contrário do que foi o período dos governos Lula, em que 40 milhões de pessoas deixaram a linha da pobreza – foi feita pela FGV Social, órgão de pesquisa ligado à FGV (Fundação Getúlio Vargas), coordenada pelo economista Marcelo Neri.
Os dados sobre a devastação do golpe, associados à figura de Michel Temer e de Henrique Meirelles, começam a ter sua divulgação acelerada, depois de dois anos de recrudescimento de todos os dados negativos que uma economia e uma sociedade pode imaginar ter.
O índice de 33% de crescimento da pobreza é dos últimos 4 anos, o exato período em que Aécio Neves e Eduardo Cunha se juntaram para sabotar o governo Dilma, vencedor das eleições.
Antes mesmo do golpe sacramentado, que tornou-se oficial no ano de 2016, a governança do país já estava sob a ação da confraria do horror, com trancamentos de pauta no Congresso, bombardeio midiático sobre todas as políticas sociais dos governos do PT e chantagens as mais variadas correndo solta em Brasília,  bem como a Operação Lava Jato, que contribuiu ferozmente para que o desemprego e a aniquilação do cinturão de proteção social construído anos a fio nos governos soberanos e democráticos eclodissem com velocidade extrema.
(do Brasil 247)

Notícias da sala de aula: uma carta para a minha irmã

Belo Horizonte, 27 de agosto de 2018
Oi, Miriam!
Já se vão cinco anos desde aquele 9 de julho de 2013. Muita coisa está do mesmo jeito que você deixou. O relógio da sala continua parado. A impressora permanece sem tinta. A organização da cozinha também é a mesma. Nunca mais fizemos aqueles almoços que você gostava tanto.
Ás vezes, não entendo bem. Tudo parece confuso demais. Ainda assim, carrego a certeza de que essa é mais uma etapa da nossa caminhada. Necessária e passageira. No momento certo, voltaremos a partilhar a vida.
Sinto saudade do tempo em que íamos ao Mineirão ver o Galo jogar. Cada vez que o nosso time entra em campo, sou capaz de vê-la com o manto sagrado. Sempre orgulhosa e altiva, mesmo após as derrotas mais dolorosas.
Mas o que sinto saudade mesmo é de chegar em casa e te contar as notícias da sala de aula. Sigo feliz. Como você sabe, nunca quis fazer outra coisa. Na verdade, fico receosa de dizer o quanto amo ser professora. Temo que as pessoas pensem que vivo num universo paralelo. Acontece que não é bem assim.
Sei quão injusto é o salário que nós professores recebemos. Sei também que o descaso com o ensino público é uma das armas utilizadas pelas classes dominantes para perpetuar as desigualdades existentes no país. Desse modo, ensinar com alegria e entusiasmo é uma das maneiras que encontrei de fazer frente a tudo isso. É uma forma de dizer que não aceito a educação medíocre e alienadora que as elites querem impor a mim e aos meus alunos.
Estou dando aulas para turmas dos 6º, 8º e 9º anos. Algumas professoras me chamam de louca, mas eu adoro ensinar e aprender com os meninos e meninas da antiga 5º série. Acho que você não teria paciência. Em algumas ocasiões, eles me tiram do sério. Por outro lado, são extremamente generosos. Fico completamente tomada por aqueles olhares curiosos. Acho graça das perguntas que eles costumam fazer:
– Professora, a senhora tem marido?
– Professora, a senhora tem filhos?
– Professora, a senhora acredita em Deus?
– Professora, a senhora é católica ou evangélica?
– Professora, deixa eu apagar o quadro?
– Professora, deixa eu carregar a sua bolsa?
Desde o início do ano, adotei a meditação durante as nossas aulas. Foi uma das melhores coisas que aconteceram em toda a minha vida. Quando intuí que exercícios de respiração e o ato de silenciar a mente (e o coração) poderiam ser um caminho para melhorar a concentração e o aprendizado dos alunos, não imaginava que essa prática milenar provocaria tantas mudanças. Em todos nós. Inclusive nas questões de dentro. Ainda vou escrever um livro sobre essa experiência.
Tenho conversado muito com as minhas turmas do 8º ano a respeito de temas como racismofeminicídiohomofobia e intolerância religiosa. Penso que a escola não pode permanecer alheia às mazelas que nos cercam e afligem. Outro dia, um grupo de alunas insistiu em dizer que há “racismo reverso”. Usei a história, dados e estatísticas na tentativa de desconstruir essa ideia tão equivocada. Sem sucesso. A discussão chegou ao fim somente após as reflexões da Sarah, que com a sabedoria de quem tem 13 anos, disse o seguinte:
– Professora, é claro que não existe racismo contra os brancos! Até mesmo porque, foram eles que inventaram o racismo!
Por fora, me contive. Por dentro, parecia que eu estava comemorando o gol de cabeça do Leonardo Silva na final da Taça Libertadores da América. É por essas e outras que a sala de aula é um espaço que me encanta, fascina e emociona.
Nem te conto do 9º ano. Estamos no final de agosto e ainda não consegui fazer um bom trabalho. Já tentei de tudo que você possa imaginar, mas a maioria dos alunos segue com pouco ou nenhum interesse pelos estudos. A apatia na qual eles se encontram tem vários motivos. Um deles é a educação bancária, que enxerga os estudantes como meros depositários de conteúdos distanciados da realidade vivida. Quase sempre o ato de aprender se resume em fazer cópias, decorar fatos e fórmulas. Com o passar dos anos, a escola perde completamente o sentido. Reverter esse quadro é uma tarefa bem difícil.
As coisas não estão como eu gostaria, porém, aprendi com a Bell Hooks, uma educadora afro-americana, que apenas a força de vontade de nós professores não é suficiente para “fazer da sala de aula uma comunidade de aprendizado entusiasmada”. Saber disso me deixa muito aliviada.
Faz alguns meses que não sonho com você. Na última vez em que estivemos juntas, você disse que não é tão simples vir me visitar. Imagino que deve haver alguém aí que possa interceder por mim. Diga que sinto a sua falta. Quero te ver, ouvir a sua voz. Quero sentir a sua presença viva e intensa.
Preciso ir agora. Tenho uma pilha de exercícios para corrigir. Lembre-se: nunca me esqueço de você. Não há um só dia que eu deixe de pensar em tudo que vivemos ao longo dos 32 anos que você pode estar comigo, conosco.
Até um dia.
Um abraço da sua irmã.
Luana
Luana Tolentino é mestra em Educação pela UFOP. Há 10 anos é professora de História em escolas públicas da periferia de Belo Horizonte e da região metropolitana da cidade. Suas práticas pedagógicas partem do princípio de que é preciso construir uma educação antirracista, feminista e inclusiva, comprometida com o respeito, com a justiça e com a igualdade.
(da Carta Educação)

Carta de Montevidéu: O primeiro adeus de Pepe Mujica – renunciou ao Senado, mas não à política


O ex-presidente do Uruguai José “Pepe” Mujica já havia avisado, no começo deste mês, que deixaria o Senado para tomar uma “licença antes de morrer”. Fiel à sua palavra, o velho guerrilheiro tupamaro, que governou seu país entre 2010 e 2015, renunciou nesta terça-feira (14/8), para se dedicar à aposentadoria, embora prometendo que continuará militando na política.
A vaga de Mujica, eleito senador em 2014 com a maior votação daquele pleito, e encabeçando a lista do seu partido – o Movimento de Participação Popular (MPP) da coalizão centro-esquerdista Frente Ampla – será ocupado agora por Andrés Berterreche, um engenheiro agrônomo e ex-ministro da Pecuária.
Sua renúncia foi anunciada como parte de um plano de renovação do MPP, a fim de facilitar a renovação dos quadros políticos. O primeiro em se afastar foi o já ex-senador Ernesto Agazzi, em dezembro de 2016. Também se previa que Lucía Topolansky fizesse o mesmo gesto, mas a renúncia de Raúl Sendic Jr à vice-presidência da República obrigou à ex-primeira dama a ocupar esse cargo.
Pouco antes de renunciar, Pepe Mujica deu uma entrevista à televisão criticando as políticas sociais do governo do seu aliado Tabaré Vázquez, e apontou ao fato de que essa falência é a causa do aumento dos delitos violentos no país. “É preciso reconsiderar as políticas de repressão, e também afinar mais as políticas sociais”, e acrescentou que se necessita “menos assistencialismo e mais políticas que promovam a ascensão dos jovens”.
Os analistas continuam apontando Mujica como o grande eleitor do candidato presidencial da Frente Ampla para as próximas eleições. Em outra entrevista dada no mesmo dia, em um programa de rádio, ele disse que as políticas sociais “não deram totalmente certo”, e que “assistir não equivale a convencer, eu não posso esperar que a polícia solucione esse problema de porque os mais jovens acham que compensa mais o caminho do crime”.
Disse que o segredo para solucionar os problemas de segurança pública está na educação. “Creio que é preciso equipar melhor a escola, dar melhor estrutura, maior importância para os resultados que ela produz, porque o que mais surpreende na massa de gente presa hoje em dia é que há uma imensa maioria de pessoas jovens que mal terminaram o ensino básico”.
E logo explicou: “eu vejo a promoção da cultura como parte das soluções mais importantes, mas sem esquecer que os problemas complexos são multicausais”.
Também falou de outro de seus temas favoritos nos últimos tempos: a cultura do consumo. “Vivemos em um tempo de cultura superconsumista, e nos ensinam a ver riqueza e querer riqueza em tudo. E isso certamente está afetando o acervo cultural de muita gente”.
A oposição o despediu com respeito. O senador nacionalista Luis Alberto Heber afirmou que lamenta o afastamento do senador Mujica, “porque é uma figura de referência importante, relevante no espectro político nacional e de grande influência na força de governo. Naturalmente, está bem que dedique seu tempo livre a descansar, não a trabalhar contra o nosso partido e a favor de sua força política”.
Esta é a dúvida, temor e preocupação de muitos: Mujica deixará sua bancada no Senado para se dedicar a fazer campanha? Ele assegura que não será candidato a mais nada. Contudo, e mesmo aos 83 anos, ainda é uma peça fundamental da campanha do MPP.
Após afirmar que ficou em choque ao ler a notícia de que Mujica deixaria o Senado, o senador conservador José Amorín Batlle (Partido Colorado) registrou seu pesar, dizendo que sentirá “saudades” do colega no parlamento. Porém, logo lançou sua suspeita de que o ex-presidente fará campanha durante as eleições de 2019. “ Temos certeza de que ele continuará aparecendo na televisão, e de que nos cruzaremos com ele na campanha”, indicou.
Pepe Mujica já tramitou sua licença para viajar à Europa, na semana próxima, para ajudar na promoção do filme de Emir Kusturica El Pepe, una vida suprema, que começou a ser filmado em abril de 2013. Na carta de renúncia, enviada à presidenta do Senado e vice-presidenta do país, Lucía Topolansky, ele solicitou que aceite sua desistência do Congresso, expressando que “enquanto minha mente funcione, não posso renunciar à solidariedade e à luta de ideias”.
“Solicito ao corpo que você preside que aceite a minha renúncia ao cargo de Senador. Os motivos são pessoais, diria que se trata do `cansaço pela longa viagem´”, agregou em sua despedida.
Uma vez, Mujica brincou dizendo que faria um curso para aprender a calar a boca. Os meios de comunicação uruguaios registram uma centena de entrevistas entre 1994 e 2015, nas quais se podem ver as idas e voltas do seu discurso, suas ideias originais, sua pirotecnia, sua trajetória política e sua atitude como presidente: “sigo pensando que o Estado jamais pode ser neutro (…) é preciso ser prudente com o poder, para ser mais justo (…) a direita assegura o conflito social”.
“Vive como pensas, ou terá que pensar como vives”, repete sempre, e conta que “uma vez, alguém me perguntou quem era meu chefe de marketing. Parece que não perdoam o fato de alguém ser como é. Hoje, parece ser algo tão irreal, em um mundo onde tudo parece que deve ter uma imagem cultivada”, comenta.
A chácara de Pepe e Lucía, nos arredores de Montevidéu, recebe ônibus com turistas de diferentes lugares do mundo, que tentam conhece-lo. Pepe e sua companheira de luta vivem com simpleza, e sobriedade. Mujica odeia a palavra “austeridade”, porque diz que é utilizada para reduzir direitos e deixar as pessoas seu trabalho.
Ninguém poderia vaticinar que aquele deputado que chegou ao parlamento numa moto, vestido de jeans, levaria o MPP a arrasar nas eleições internas da Frente Ampla, e alcançaria a Presidência.
Ao falar de sua “aposentadoria”, os meios locais uruguaios lembrar de algumas frases e definições desse político singular, ex-guerrilheiro e filósofo das ruas.
“Sou um velho manso, mas não domado”. “Se vai dar uma de senhor pacato, melhor que não queira brigar com o governo”. “Somos socialistas convictos e convertidos”. “A grande pergunta é: o homem terá capacidade de reagir ou vai direto ao abismo?”. “Em que terminará este modelo de civilização que destrói tudo, contamina a água, a terra, o ar, e gera desperdícios explosivamente?”.
Sendo presidente, confiava: “sinto os golpes nos rins todos os dias, porque, sendo governo, você coloca a cara para bater todos os dias. Eu defendo o direito de opinar, quando se deve tomar decisões, eu me alinho com o governo, mas tenho a consciência para opinar, e às vezes posso me equivocar”. E completa, dizendo à sua equipe: “estou farto de que se fale somente dos aspectos financeiros, não há economia viável com este sistema de crédito”.
“A todos os meus companheiros de governo, eu queria transmitir, em duas palavras, qual será o novo desafio: a estética de hoje é a ética. A ética tem a ver com o que você ganha e como vive, e como atende as pessoas, como você luta e até se sacrifica por elas se for necessário”.
“As lutas do socialismo são mais justificáveis que nunca, o que está em jogo são os caminhos, mas há medo de se chocar contra o modelo de Lenin. A esquerda perdeu a audácia (…) chegou o momento de ter uma nova visão crítica e autocrítica, mas também ter uma visão criadora”, disse ele, em seu último discurso, em Buenos Aires.
“Lutar pela democracia não é só defender um voto de vez em quando, ou escolher um governante. Do ponto de vista do progresso humano, é lutar utopicamente por uma civilização melhor. Se melhorarmos a divisão (da riqueza), se fôssemos absolutamente equitativos, mas seguindo nessa espiral de progresso defendida pelo capitalismo, continuaremos no caminho do mesmo buraco”, acrescentou.
“Essa realidade de profunda desigualdade que nos golpeia se evidencia no fato de que 35 pessoas possuem mais riqueza que 50% da humanidade”, explicou.
Brasil
Mujica, que esteve na cela de Curitiba visitando sue amigo Luiz Inácio Lula da Silva (“o pacificador das contradições do Brasil”, segundo ele), disse que o viu bem de ânimo, “mais magro, sempre com seu temperamento brincalhão por um lado, mas também horrorizado pelo que está acontecendo no Brasil, do ponto de vista da destruição do patrimônio do Estado e a transformação da legislação trabalhista”.
“Lula considera que todo esse episódio, que inclui a destituição da Dilma Rousseff, é parte de um projeto para mudar as condições do país. Para que, se um dia os governantes progressistas voltarem a comandar o país, se vejam praticamente amarrados pelos compromissos estabelecidos a longo prazo a nível internacional. Lula é o único que está em condições de permitir que o Brasil volte à sua natural alegria de viver.
O ódio
“Tenho uma bronca do ódio e do fanatismo. Uma coisa é a paixão, e outra coisa é o fanatismo. O ódio é cego como o amor, e o amor tem a vantagem de que é criador, reprodutor. O ódio não, é destrutivo. Quem vive olhando para trás, tentando cobrar o outro por coisas que não existem, e não vive o futuro, ficará dando voltas sem parar em torno de uma coluna. A natureza é sábia. Seria bárbaro se tivéssemos um olho atrás, ver o que acontece às nossas costas. Mas temos os olhos na frente, porque a vida é amanhã, é o que está por vir. Tenho lembranças de dor e de angústia”.
“Do que eu me arrependo? Puxa… tenho um monte de coisas. Do que mais me arrependo é da falta de velocidade para disparar. Aguentei um tempo em cana (preso) porque me capturaram. Deveria ter corrido um pouco mais rápido. Uma falha atlética”.
Argentina está fodida
Em julho passado, Mujica se solidarizou com as mulheres argentinas que lutam pelo aborto legal. O ex-mandatário, que legalizou a interrupção voluntária da gravidez em seu país, disse que a sociedade é “cínica”, porque proíbe o aborto “acha que essa proibição vai evitá-los”. Ademais, pediu aos homens “que não entendem do tem” que “calem a boca”, em um vídeo onde trazia um lenço verde (símbolo da campanha pela legalização) em suas mãos.
“Sou uruguaio, ou seja, um argentino chutado do porto de Buenos Aires. Essa é a história verdadeira, e não me convém falar muito sobre como vejo a Argentina. O que posso dizer, com preocupação, pela história, é que quando a Argentina vai mal, isso logo termina nos afetando também fortemente. O que mais me assusta nesse endividamento (do governo argentino), que terá que ser pago em algum momento, é que eu sei como isso aconteceu, e o que vai acontecer. A história se repete”.
“Também estou cansado dessa ladainha de que a Argentina está falida. Não, ela não está falida. A Argentina está fodida, mas não está falida. Porque depois pode se recuperar. É um país que tem a desgraça de ter enormes recursos naturais, e por isso se deixa cair no desperdício. Mas esse país também é o meu povo, e isso me dói”.
Crise ética
“Pensávamos que o mundo seria mudado somente modificando as relações de produção e de distribuição. Mudando a estrutura, parecia que teríamos um homem distinto, e melhor. E não percebemos que talvez um sistema seja também um gerador de uma cultura que lhe é funcional a longo prazo. Fomos substituindo as velhas religiões pela nova religião, que é o mercado”.
“Isso é mais forte que os exércitos e que as questões de força, porque é uma cultura tácita, subliminar, que está atuando no seio da sociedade, em todos os lares. Então, milhões de pessoas pobres que demandam mais, e que são potenciais consumistas, achando que isso é o equivalente a ser mais feliz”.
“Essa cultura nos leva, por um lado ao desperdício de recursos, que terminam sendo bastante supérfluos, e por outro, a não atender as necessidades vitais que a maioria da população tem. Se os africanos pudessem comer a quantidade de vezes que os cachorros europeus não estariam lutando contra a morte, nem se afogando no Mediterrâneo”.
“Aqui há uma profunda questão ética, e a política abandonou há muito tempo as perguntas mais elementares, e se transformou num apêndice da econometria: estamos fazendo isso para as pessoas serem mais felizes? Estamos nos preocupando demais ou somente com o desenvolvimento? É muito discutível essa ideia de que estamos melhor porque o PIB aumento. A sociedade japonesa é mais feliz que os pouquinhos aborígenes que restam na Amazônia?”.
“Temos uma única riqueza, que é o milagre de estarmos vivos, mas a vida nos escapa, e não há supermercado que nos venda anos de vida. Quando compramos algo, não compramos com dinheiro, compramos com o tempo da nossa vida. O mundo nunca produziu mais do que o produzido hoje, e ainda assim as desigualdades aumentaram como nunca”.
A alternativa
“É muito difícil imaginar como se constrói uma correlação de forças que signifique desaprender muitas coisas que são parte do sentido comum das nossas sociedades e construir um paradigma que busque um equilíbrio entre o eu e o nós. Somos antropologicamente gregários, necessitamos da sociedade. Tudo o que a civilização alcançou e avançou é a consequência de ter vivido e erigido sociedades. Todo o progresso que nos rodeia é consequência dessa construção. A civilização é a solidariedade intergerações, embora sejamos indivíduos”.
“A política existe para atenuar os conflitos entre os indivíduos, quando esses constroem a sociedade. Podemos discutir muito. Eu não posso mudar o mundo sozinho. O que posso fazer é educar as pessoas para que não sejam tão estúpidas ou que se deixem manipular. É preciso lutar muito nesta vida, para não se deixar levar por essa cultura que te transforma num pagador de contas. Ter liberdade é ter tempo livre para fazer o que a você gosta”.
“Sempre desconfiei que América Latina voltaria a um período de retrocesso. Eu tenho uma interpretação pendular da história humana. Se fala muito sobre a esquerda somente a partir das divisões na Revolução Francesa. Mas a sensibilidade para com a dor dos mais fracos não é um sentimento moderno. É tão velho quanto o homem andando sobre a terra, e o homem tem estado permanentemente tentando travar essa batalha. Por isso, essa onda reacionária irá fracassar, nunca poderá triunfar definitivamente, porque a nossa tampouco triunfará definitivamente”.
“Não há derrota porque tampouco há triunfo definitivo. A luta é ir avançando degraus a favor da civilização humana. Acreditávamos que nossa luta era pelo poder. Na verdade, nossa luta é para melhorar o conteúdo dessa herança que se chama civilização”.
“Devemos pensar que, por nossas imperfeições são inevitáveis os conflitos nas sociedades. Então, o capital da tolerância para conviver não é, como pudemos pensar em alguma época, um subproduto liberal da burguesia, e sim um valor para o gênero humano, com o qual não devemos retroceder, e sim defendê-lo. Diria até que é a coisa mais essencial de um ideário de democracia. Como conviver em democracia se não suportamos as diferenças que se dão na convivência?”.
“A burguesia fundadora, que mitifica o trabalho e a economia e a defende como o orgulho nacional, é diferente da burguesia acumulativa e especulativa do nosso sistema financeiro contemporâneo. Não são a mesma coisa, há diferenças, por mais que pertençam à mesma classe, certo?”.
“O capitalismo semeou uma ideia de progresso permanente que está ligada à melhoria da economia para consumir mais coisas. Então melhorar significa consumir mais. Logo, se criou a ideia de que o progresso nunca tem fim. E aí surge a outra pergunta: nesse progresso, o homem é mais feliz? As pessoas que têm 20 ou 30 anos acreditam que tendo mais coisas serão mais felizes, ou tendo mais poder, mais fama, mais dinheiro. Mas quando começam a passar dos 50, elas começam a pensar diferente”.
O declínio progressista
“Penso que algumas causas fundamentais para o declínio dos governos progressistas estão no esgotamento das possibilidades dadas pelo próprio sistema, e por não ter superado as contradições desse sistema. E algo muito importante: não ter estabelecido uma batalha no campo da cultura, uma batalha que substitua a cultura do consumo”.
“Houve uma época na qual pensamos que mudando as relações de produção e distribuição mudaríamos matematicamente a sociedade, e isso foi um grave erro. Sabemos que a cultura tem um papel determinante, cada vez mais, e nós decidimos não fazer essa batalha cultural. Nós, dirigente políticos (da esquerda de hoje), sofremos do mesmo problema: nos sentamos na mesma mesa na qual eles se sentavam. E depois de tanto negociar e acomodar o corpo, creio que repassamos essa confusão às pessoas”.
“Há um pêndulo histórico que agora se move agora para a direita, e que está fora da América Latina, está no mundo. Os discursos da ultradireita não me impressionam, e sim as pessoas que seguem esses discursos, que não são marcianos, são parte da sociedade estadunidense e europeia, das potências mundiais. Quando escuto os que votam contra Merkel como se ela fosse um epicentro da revolução mundial, me preocupa. Por favor! Como alguém pode pensar que Merkel é uma revolucionária? Estamos num momento complicado da conjuntura mundial, e isso também influi na América Latina”.
“Para mim, isso é uma consequência não planejada do efeito do auge da globalização, da economia baseada nas multinacionais, que estão produzindo, entre outras coisas, uma concentração da riqueza de carácter pavoroso, acentuando a desigualdade. Não é que multiplica a pobreza, multiplica a distância entre os ricos e os pobres, a desigualdade”.
Venezuela, a integração
“Ninguém de fora tem o direito de se intrometer na Venezuela! Mas, além disso, é uma coisa muito sarcástica, porque os erros (cometidos pelo país) são deles e eles é que devem resolver, e não me encham o saco com a democracia ou não na Venezuela, sem dizer uma só palavra do que acontece na China, ou na Arábia Saudita. Mas sobram dedos apontados para a Venezuela, falando sobre o que são pequenas verrugas ao lado dos desastres que se provocaram no mundo”.
“Em outros casos ninguém diz nada. São potências que influem nas decisões do mundo de hoje as que cometem esses desastres. Então, não posso denunciar a tolerância dos Estados Unidos com alguns países que são seus amigos. É uma política bastante cínica, ao utilizar os direitos humanos. Não me fodam! Direitos humanos? Se vemos o que fizeram os Estados Unidos e seus aliados nos últimos anos, temos um balanço nefasto”.
“Nos lugares onde se intrometeram, não há outra coisa senão desastre, desarticulação: Afeganistão, Iraque, Líbia, Síria… Olhem só o que fizeram! Aposto que o modelo que têm para a paz na Síria é a balcanização, fazer o que fizeram na Iugoslávia, balcanizá-la, aproveitar uma Síria xiita, outra sunita, o Curdistão, e depois que estiverem atomizados, utilizá-los, um após o outro”.
“A Venezuela está sobretudo no que Chávez semeou, tudo! O mais colossal batalhador pela integração latino-americana, sem dúvida. O governo mais generoso que conheci na história, nos anos em que posso medir a história da América Latina”.
“A América Latina carrega uma tragédia nas costas. A tragédia de ser 10% da economia do mundo, de não ter massa crítica para nada, e de ter fracassado em suas tentativas de integração, como nesta mais recente. A integração é um imperativo, uma necessidade. Não teremos possibilidade de pesar na balança do mundo por falta de massa crítica, porque não podemos criar um sistema de investigação que nos dê liberdade na criatividade, porque sequer temos o controle de certas tecnologias, porque nossas universidades estão divorciadas entre si, porque nossos investigadores são poucos”.
“Tudo isso nos obriga a apostar na integração. Além do mais, neste mundo, quem vai nos levar a sério separados? Como negociar com a China ou com os países da Europa? Países como Equador ou Uruguai podem negociar em igualdade com a China? Recolheremos o que for possível, em determinada conjuntura, mas nunca em termos de igualdade, porque não pesamos. Uma coisa é um chanceler do Equador ou do Uruguai a negociar sozinhos, outra coisa é que apareça um em nome de toda a América Latina”.
“Nossa tragédia é a balcanização. Por outro lado, temos a nosso favor um pacote de recursos naturais muito valiosos. Provavelmente, somos o continente reserva mais importante que o mundo tem, mas também temos grandes desafios. O mundo continua crescendo loucamente, e nesse sentido a integração passa a ser a prioridade cronológica mais importante dos nossos dias”.
“Tivemos a possibilidade da integração muito próxima, mas fomos travados pelas necessidades dos nossos projetos nacionais, presas de nossas respectivas preocupações. Essa foi a maior falha dos governos progressistas e é um pouco cruel dizer, mas é preciso dizer para as gerações de progressistas que virá, para que saibam, e que cometam os seus erros, mas não os nossos. Para mim, a integração é uma condição sine qua non para a América Latina”.
Depois de todas essas palavras, Pepe Mujica abandonou o cargo de senador. E prometeu aos seus 83 anos, seguir militando na política – e, talvez, seguir cultivando flores em sua chácara em Rincón del Cerro, ao lado de uma escola agrária para 60 jovens alunos, construída por ele, que depende da Universidade do Trabalho do Uruguai (UTU).
Rubén Armendáriz é jornalista e cientista político uruguaio, analista do Centro Latino-Americano de Análise Estratégica (CLAE)
*Publicado originalmente em estrategia.la | Tradução de Victor Farinelli

CUT Brasília lança Plataforma da Classe Trabalhadora para as eleições de 2018, segunda (20)

“Um trabalho conjunto, ouvindo cada sindicato”. É como se define a elaboração da Plataforma CUT da Classe Trabalhadora para as eleições de 2018, segundo o presidente interino da CUT Brasília, Rodrigo Rodrigues. O material, construído pela Central Única dos Trabalhadores de Brasília e suas entidades filiadas, elenca as principais pautas por segmento e será entregue aos candidatos ao GDF em ato realizado no dia 20 de agosto, às 19h, no Teatro dos Bancários.
Para composição do documento, a Central fez uma construção participativa, reunindo seus coletivos, ouvindo as entidades sindicais, realizando plenárias participativas e assembleias para que todos os trabalhadores e trabalhadoras do Distrito Federal estejam representados na coletânea.
“O que estamos construindo é o espelho do que esperamos para o DF e o Brasil, tanto do Executivo quanto do Legislativo, e vamos entregar essa Plataforma a cada candidato para que ele assuma o compromisso de honrar a vontade da classe trabalhadora”, conta Rodrigues.
Nesse momento de aprofundamento do golpe, frente a toda retirada de direitos, o dirigente reforça a necessidade da CUT assumir o protagonismo na proposição de temas relevantes, em especial ao que se refere à garantia das conquistas trabalhistas e sociais, reafirmando-se como o principal instrumento de luta da categoria no país. “A Plataforma, que reúne um conjunto amplo de propostas elaboradas coletivamente, é uma referência para posicionamentos, negociação, mobilização e acompanhamento das políticas a serem implementadas a níveis distrital e federal. Além disso, ela tem como objetivo contribuir para uma relação de forma mais igualitária entre o capital e o trabalho”.
 Clique e leia o material na íntegra 

Movimento estudantil protesta contra corte de orçamento na educação

Estudantes secundaristas e universitários organizaram manifestação nesta terça-feira (14) pela manutenção da verba destinada à educação do país. Alertando para o desmonte da educação no país, o #EducaçãoSemVeto, como foi chamado, ocorreu na Câmara dos Deputados, que foi palco nesta manhã da Comissão de Educação que debatia o impacto da PEC do teto de gastos no orçamento para a educação.
O Congresso aprovou, em julho, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que orienta o orçamento do Ministério da Educação (MEC) e garante, com a inclusão do artigo 22, que a verba para a educação e pesquisa em 2019 seja a mesma deste ano, acrescida da correção da inflação. Contudo, a União Nacional dos Estudantes (Une) e a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), protagonistas do protesto, argumentam que o Governo Federal pretende aprovar um orçamento com R$ 2,8 bilhões a menos que o previsto.

Em 2018, a pasta teve 23,6 bilhões, mas, em nota conjunta com o MEC, publicada em 3 de agosto, o Ministério do Planejamento (MP) afirmou que o orçamento será de R$ 20,8 bilhões, em função de restrições fiscais. “O referencial monetário inicial (limite para detalhamento do Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2019) encaminhado pelo MP para essas mesmas despesas é de R$ 20,8 bilhões, em razão das restrições fiscais para 2019. O limite foi repassado proporcionalmente para a Capes”, diz a nota. O presidente Michel Temer tem até hoje (14) para sancionar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA).

Ministro do Planejamento passou por sabatina

No Câmara, o ministro Esteves Colnago foi sabatinado por deputados a respeito do corte. Ele reconheceu a necessidade de repensar os gastos públicos na área. “Os desejos são ilimitados em todos os setores. Precisamos parar e olhar. Quais projetos são os temas que precisamos repriorizar? O governo tem feito muitos gastos e investimentos, aumentando a tributação. Está na hora do poder executivo e do Congresso decidir o que é importante”, ponderou.
O ato do veto, esclareceu o ministro, pertence unicamente ao presidente Michel Temer. Ao dizer isto, o ministro provocou indignação da plateia. “E cadê ele?”, gritaram os estudantes. No início da sessão, o ministro já havia sido recebido pelo movimento com um abacaxi, simbolizando o protesto e os problemas que recaem sobre a pasta.

Movimento critica inclusão da educação no teto de gastos

Presente na sessão, Marianna Dias, presidente da Une, definiu os cortes como a “morte da educação pública no país”. “Viemos questionar por que a educação, neste governo, é vista como gasto e é colocada dentro da PEC do teto de gasto. Isso decreta o fim da universidade pública e dos direitos que nós conquistamos. Ainda há a possibilidade de, em 2019, a educação não entrar na PEC. Nós viemos aqui para dizer ao ministro que a educação não pode pagar por uma PEC irresponsável, criada pela cabeça do governo”, disse.
“A mensagem que Michel Temer passa para a juventude é de desesperança. Queremos resgatar essa a esperança de volta”, completou Flávia Calé, presidenta da Associação Nacional dos Pós-graduandos (ANPG). “A juventude lutará para garantir que que seja sancionada a LDO e que haja garantia do investimento na educação”, afirmou Pedro Górki, presidente da Ubes.
O deputado Chico Alencar (PSOL) afirmou que a comissão foi esvaziada pela base do governo. “É o custo da pressão da alta privilegiatura que sensibiliza o governo. É o governo das cúpulas, das elites”, definiu. Para ele, os cortes na pesquisa têm sido progressivo nos últimos dois anos e as bolsas da Capes seguem em risco. “O governo acalmou um pouco a situação a partir do grito da própria Capes em relação ao corte brusco e violento das bolsas de pós-graduação. Nessa política de cortes assumida pelo governo, o que nos permite dizer que as bolsas atuais não sofrerão cortes a partir de agosto do ano que vem?”, questionou.
O deputado pernambucano Pedro Cabral (PSB) lamentou a ausência de Rossieli Soares da Silva, ministro da Educação, na sabatina. “Era fundamental a presença do ministro. O prazo acaba hoje e queríamos levar ao governo as diversas visões sobre o tema. A sociedade civil organizada esteve aqui e também cumpriu o seu papel.”
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