ARTIGO | Dia da Orientadora e do Orientador Educacional é dia de lembrar que sindicato é mais necessário que nunca
Por Luciano Matos*
Depois de 18 anos, orientadores e orientadoras educacionais conquistaram a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição que garante o direito à aposentadoria especial (PEC 573/2006) pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara do Deputados. A conquista, realizada no último mês de novembro, marca não só a história dos(as) orientadores(as) educacionais, mas do conjunto da classe trabalhadora.
Em tempos de massificação da ideia de que empreendedorismo é sinônimo de trabalhado precarizado e sem vínculo empregatício, o sucesso dos(as) orientadores(as) educacionais teve como pilar a luta organizada por um sindicato, o Sinpro.
Indiscutivelmente, a bagagem de 45 anos de luta e compromisso com professores(as) e orientadores(as) educacionais da rede pública do DF foi decisiva para que, somada à nossa valentia, pudéssemos transpor os interesses antitrabalhadores existentes aos montes no Congresso Nacional.
É preciso reconhecer também a parceria da deputada Érika Kokay (PT-DF), uma das vozes que leva a política a sério e se manifesta em favor de trabalhadores e trabalhadoras.
Não fossem esses dois fatores – a luta organizada por um sindicato forte e uma parlamentar eleita pelo povo trabalhador –, o passo à frente rumo à garantia de um direito seria apenas um recuo sem previsão de retomada.
Mas ainda há um longo caminho pela frente. A PEC 573/2006 irá para uma comissão especial e, se aprovada, seguirá para votação no Plenário da Câmara, em dois turnos. Só então ela poderá ir para o Senado. O percurso que se apresenta exige o fortalecimento da nossa mobilização, da nossa unidade e, sobretudo, da nossa consciência de classe.
Para nós, orientadoras e orientadores educacionais, a garantia do direito à aposentadoria especial resultará em cinco anos a menos na idade mínima e no tempo de contribuição necessários à aposentadoria voluntária. É uma forma de reconhecimento da importância daquelas e daqueles que dedicam suas vidas à educação.
Para toda a sociedade (o que também nos inclui), a conquista desse direito mostra que o movimento sindical continua mais necessário que nunca e que, necessariamente, trabalhadoras e trabalhadores precisam de sindicato para construir dias melhores.
Que possamos lembrar disso neste Dia da Orientadora e do Orientador Educacional (4/12) e por toda nossa vida.
*Luciano Matos é orientador educacional da rede pública de ensino do DF e diretor do Sinpro-DF
Metafísica, ciência, laicidade e suas interfaces no ambiente escolar
Leia artigo do professor Alisson Costa Rocha, publicado no portal da Revista Xapuri. No texto, o professor debate metafísica, ciência, laicidade e suas interfaces no ambiente escolar.
Alisson é mestre em Educação pela UnB; membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Materialismo Histórico – Dialético e Educação, coordenado pelo professor Erlando da Silva Rêses; e pós-graduado lato sensu em Orientação Pedagógica pela Faculdade Apogeu.
Para ler no portal da Revista Xapuri, clique AQUI.
Metafísica, ciência, laicidade e suas interfaces no ambiente escolar
Por Alisson Costa Rocha *
Para Michel Varret, em sua clássica obra “Os marxistas e a religião”, o debate estabelecido entre metafisica e ciência, a partir do século XIX, no mundo ocidental, prevaleceu diante de uma celeuma de contradições.
Posto isso, deve ser levado em conta que o pensamento científico, ao passo que propôs o pensamento racional, não pode se comprometer com demandas estruturais em torno da verdade.
Obviamente que a construção das lentes em torno da produção científica surge em um caldeirão cultural milenar, permeado de valores e de historicidade no contexto do jeito de agir, de sentir e de pensar em uma estrutura acostumada a explicar o mundo a partir da relação indivíduo natureza e das teorias universais da filosofia.
Corroborando com o debate, o pensador brasileiro Paulo Freire em seu livro “Educação como prática de liberdade” afirma que inexiste formação fora da humanidade porque os seres humanos não estão no limbo, mas no contexto social a partir de um processo dialético mediado por contradições.
Nesse cenário, o locus fenomenológico surge, sobretudo, com o propósito de superar o pensamento filosófico e metafísico segundo os princípios fenomenológicos que explicam as demandas que permeiam a humanidade nas suas questões contextuais.
Além disso, o grande desafio do pensamento científico se deu com uma proposta de colocar os pés da humanidade no chão, tendo como ponto de partida uma perspectiva materialista para construção do conhecimento em uma escola com uma proposta de laicidade, a partir dos documentos oficiais.
Entretanto, nos dias atuais, se apresenta, na educação básica, uma cultura católica ainda predominante e, ainda, com um aumento também da influência neopentecostal.
É importante mencionar que o pensamento científico se comprometeu com os fenômenos específicos diante da incapacidade humana de explicar a imensidão de coisas que existem no mundo, algo que filósofos como Sócrates e Pitágoras já tinham percebido há pelo menos dois milênios.
Nesse sentido, o grande papel das ciências humanas se dá no campo da reflexão e na produção de conhecimento diante dos dilemas que existem no contexto social sob a perspectiva da lente do materialismo histórico e dialético e da fenomenologia, por exemplo.
Outrossim, o debate da laicidade, na escola pública do Distrito Federal, emerge em um imaginário sociológico de grande influência da religião cristã. Para Luiz Antônio Cunha na obra “Educação e religiões: a descolonização religiosa da escola pública”, a população brasileira assumiu a crença do colonizador.
O autor argumenta que até a Constituição de 1891, após a Proclamação da República, confundia-se o Estado e a igreja no sistema de padroado e, atualmente, mesmo com uma proposta de um estado laico, sem uma religião definida, no ambiente educacional, aparecem as ambiguidades que levam as determinações religiosas a definirem até mesmo as questões disciplinares.
Sob essa mesma perspectiva, Cunha esclarece que a proposta de um estado laico foi base da inspiração republicana no Brasil inserido dentro da concepção das liberdades individuais. Assim, ainda segundo esse autor, a Constituição, no Período Republicano, não negou a fé cristã, porém definiu as questões estatais colocando a religião no âmbito íntimo e privado e não mais sobre as responsabilidades do Estado brasileiro.
Desse modo, nos espaços sepulcrais passou a ser permitido ritos de outras crenças e o Brasil começou a gozar de certa liberdade religiosa. Destarte, o grande desafio atual pode passar pela superação de uma moral construída a partir de uma cultura hegemônica religiosa europeia em prol de uma proposta que privilegie o pensamento ético em favor do oferecimento de uma educação laica como está proposto nos documentos institucionais.
É válido frisar que o documento que funciona como uma diretriz para as escolas do Distrito Federal, sob a alcunha de “Currículo em Movimento”, do ano de 2014 e atualizado no ano 2018, da Secretaria do Estado de Educação do Distrito Federal, (SEEDF), afirma que a religião, no processo de formação educacional, tem que aparecer como proposta pedagógica a partir da compreensão e da reflexão histórica, filosófica e sociológica e não como súplicas ou profissão de fé.
Assim, o Currículo da SEEDF define o que já foi acordado com o fim do padroado na Constituição Brasileira de 1891: o espaço da escola e do templo, sendo a escola o espaço de produção e de reflexão a partir do preparo para o saber científico.
Além disso, Wayne Morrison, autor da “filosofia do direito”, mirando os movimentos norte-americanos conhecidos como Critical legal studies, na década de 60 e 70, em um contexto crítico em que o pensamento jurídico estava sendo analisado como uma justificativa de se manter o pensamento hegemônico, na sociedade, diante das reivindicações das minorias, observou que o mundo contemporâneo não é uma embarcação navegando em um mar calmo carregado de valores éticos racionais, conduzido por navegantes com lentes que permitam enxergar para além de uma ótica nublada.
Assim sendo, para o autor, o tecido social é costurado por influências de uma sociedade metafisica com certezas medianas.
Por outro lado, os alemães Karl Marx e Ludwig Feuerbach apontam que, por meio da visão de mundo proposta pela religião, as pessoas enxergam as coisas não como de fato são, mas por uma lente que inverte a realidade, o que a filósofa Marilena Chauí atualmente conceitua como uma ocultação da realidade.
Assim, se abusarmos, nesse texto, da análise freiriana poderíamos refletir no sentido de que a problematização acontece em um terreno carregado de emoções, de historicidades, de valores diante de uma estrutura social constituída.
Destarte, a pergunta a ser feita é se a escola, diante das questões hegemônicas postas, vai conseguir cumprir o seu papel. Algo também a ser perguntado é: qual papel a escola pública vai assumir diante do cenário posto: a ciência ou o senso comum?
Além disso, o professor Dermeval Saviani, que embasa o “Currículo em Movimento da SEEDF”, elucida em seu trabalho “Pedagogia Histórico Crítica” que os professores precisam olhar o campo para receber as experiências acumuladas historicamente pelos estudantes, na comunidade em prol de problematizá-las para produzir a catarse, a reflexão, a problematização com o intuito de obter o conhecimento sistematizado.
Desse modo, o conhecimento sensível e a ciência se complementam no sentido de que a inquietação surge a partir do objeto real, concreto e no meio social. Por isso Freire em “Cartas aos professores” aponta que a reflexão que surge, no meio popular, não se antagoniza com o saber científico porque o campo é que vai dar substância à análise e à pesquisa.
Assim, diante do reconhecimento do seu papel, a escola poderá oferecer os impulsos e os estímulos adequados por meio das dinâmicas, da acolhida dos estudantes, dos ensinamentos, dos debates e das reflexões cotidianas para que as crianças, os adolescentes, os jovens, os adultos e os idosos, os trabalhadores típicos, os atípicos, os neurodivergentes possam viver bem, no ambiente escolar, de forma harmônica em um ambiente de profissionais preparados para a diversidade e para a antecipação de crises e de conflitos comuns à comunidade escolar.
Ademais, a partir dos estudos realizados e das experiências educacionais vivenciadas, nos últimos séculos, se espera da escola uma perspectiva intelectual para debater temas como o meio ambiente, a diversidade, o ciclo da água, o corpo humano e seus sistemas, as várias crenças existentes problematizando e resolvendo questões inerentes às demandas sociais que emergem do contexto vivenciado.
Sobretudo, é papel da escola a análise dos objetos de estudo que permeiam o campo e dos temas universais existentes na humanidade.
Desse modo, o Filósofo alemão Inmanuel Kant na sua obra “Crítica à razão pura” explica que” os objetos têm que ser analisados como fenômenos e não como coisa em si”.
Outrossim, o pesquisador Luiz Antônio Cunha escreveu um livro “Educação e religiões: a descolonização religiosa da escola pública” que aponta a importância de desconstruir a hegemonia religiosa na escola pública.
O autor apresenta, em seus estudos, reflexões que afirmam que a cultura religiosa, nas instituições de ensino, tem dado conta de orientar a rotina escolar, o padrão de comportamento, o projeto disciplinar, a partir de parâmetros morais permeados por crenças e até mesmo mediados por súplicas e orações.
Obviamente que, no contexto medieval, comprometido com as relações metafísicas determinadas pela Igreja Cristã, historicamente se compreende, porém tais reflexões levam a crer que os valores ocidentais advindos da Idade Média ainda exercem poder na hora de ensinar.
Para além, Cunha reforça que o debate do Estado laico não nega as crenças e a religião, mas, na verdade, aponta para uma sociedade democrática de garantias dos direitos individuais e coletivos.
Ainda mais, Tatiane Lionço , Debora Diniz e Vanessa Carrião, em sua obra “Laicidade e ensino religioso no Brasil” afirmam que é possível uma educação democrática no país em um cenário em que as pessoas possam conviver no ambiente escolar por meio do respeito e também da diversidade.
Além das autoras ora referidas, Luiz Antônio Cunha aponta que na educação pública brasileira permeia uma ambiguidade diante de uma Constituição Federal que garante o Estado laico e uma escola que, em alguma medida, se comporta de forma confessional.
Diante do debate proposto, é importante refletir ao ponto de a escola descobrir e de se afirmar frente aos objetos e aos fenômenos, por meio da análise científica ou poderá perder a razão de ser, diante das propostas que permeiam o senso comum.
Como a militarização do espaço escolar, em uma confusão da rotina escolar dos estudantes com a realidade disciplinar dos soldados nos quartéis, do apelo às súplicas religiosas e do moralismo cotidiano comum à sociedade, importantes, entretanto, objetos de análise na educação.
Assim, pode ser necessário que o simplismo, apontado no texto a partir de Morrison, dê lugar ao pensamento crítico, no sentido de que a escola leve o estudante à percepção das contradições sociais dando lugar de destaque para o debate científico em prol da emancipação discente.
Nesse sentido, Paulo Freire, patrono da educação brasileira em seu livro “Ação cultural para a liberdade”, explica que a apropriação cultural para estudantes e professores tem que estar a serviço da reflexão e da emancipação em prol da construção de sujeitos cognoscentes.
Além disso, para Freire, a proposta educacional tem que ser simples, de modo que os temas sejam apresentados na condição de manter uma relação com a realidade dos educandos em prol da transformação das informações que se apresentam no campo para construção do conhecimento como objetivo a emancipação humana e jamais simplista ou na condição de reproduzir o que o campo oferece sem a problematização que se exige no universo escolar, educacional ou acadêmico.
Ademais, o autor pernambucano não nega a realidade, porém problematiza-a ao passo que afirma em “Educação com prática de liberdade” que “não existe educação fora das sociedades humanas e que não existe pessoas no vazio”.
Portanto, a partir deste debate, pode se perguntar se o papel da escola não é o de levar uma lente que permita enxergar as contradições nas verdades produzidas e nos rótulos estabelecidos? Será que se a escola se comprometer com o campo sem problematizá-lo perderá a razão de ser?
Essas são perguntas a serem feitas diante do currículo em movimento com uma proposta que sugere à comunidade escolar a autonomia necessária como uma embarcação que se permita a escolha do melhor caminho para chegar ao porto, porém, no caso da escola, sem abandonar o processo democrático mediado pelo conceito de alteridade que está sempre no olhar no outro.
* Alisson Costa Rocha é Mestre em Educação pela Universidade de Brasília, membro do programa de extensão da UnB Pós – Populares, coordenado pelo professor Erlando da Silva Rêses. Integra o Grupo de Estudos e Pesquisas em Materialismo Histórico – Dialético e Educação, coordenado pelo professor Erlando da Silva Rêses.
Possui graduação em Estudos Sociais pela União Pioneira de Integração Social (2011), com ênfase em História; É graduado em Pedagogia pelo Instituto Superior Albert Einstein em 2014; É pós-graduado lato sensu em Orientação Pedagógica pela Faculdade Apogeu.
Tem curso de formação continuada de trabalhadores, com abordagem Sociológica na Educação pela Instituição: (Centro de Educação Profissional de Ceilândia.); Possui curso de Formação de Alfabetizadores Populares. Instituição: CEPAFRE – Centro de Educação Paulo Freire.
É professor no INSTITUTO DE EDUCACAO E CULTURA ÁGUAS LINDAS S/S LTDA – FILOS com atuação nas disciplinas de Filosofia do Direito, Base Psicológica de Educação e Recursos Humanos. Também é professor na SEEDF em regime temporário, desde 2012, com atuação nas disciplinas de História, Ensino Especial e Atividades.
É coordenador regional em Ceilândia do Programa de extensão Pós-Populares: Democratização do acesso à universidade, nos anos de 2023 e 2024, coordenado pelo professor Elando Rêses da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília.
Foi Professor e Coordenador voluntário no pré-vestibular da Associação Comunitária da expansão do Setor “O”, nos anos de 2011 a 2015.
Novo Plano Nacional de Educação: um desafio para próxima década
A educação é um ato de amor, por isso, um ato de coragem.
Não pode temer o debate.
A análise da realidade.
Não pode fugir à discussão criadora,
sob pena de ser uma farsa. (Paulo Freire)
(*) Por Rosilene Corrêa Lima
Em junho, poucos meses antes do aniversário de 103 anos de nascimento do educador Paulo Freire (Recife, 19/09/1921 – São Paulo, 02/05/1997), Patrono da Educacional Nacional e do Distrito Federal, a Câmara dos Deputados aprovou a extensão do atual Plano Nacional de Educação-PNE (2014-2024), para 31 de dezembro de 2025.
Conforme depoimento da deputada Socorro Neri (PP-AC), a extensão se fez necessária para que não houvesse descontinuidade no planejamento educacional no Brasil, uma vez uma vez que o projeto do novo plano (PL 2614/24), de autoria do Poder Executivo, com 18 objetivos para serem cumpridos até 2034, aguarda votação na Câmara.
Enviado pelo Planalto em 26 de junho, o novo PNE, que é um plano de Estado e não de governo, requer, em seu processo de aprovação e implementação, um amplo processo de diálogo para que, nesta próxima década, o Brasil não passe pelo vexame de ver atingidos apenas 3 dos 56 indicadores aprovados no PNE de 2014.
O deputado Reimont (PT-RJ) aponta que as metas não foram cumpridas por uma descontinuidade do processo de educação que vinha sendo construído no País, como, por exemplo, o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff. Entretanto, quaisquer que sejam as razões do fracasso, a educação brasileira não pode se dar o direito fracassar por mais um decênio.
Para isso, ainda é tempo de apreender e inserir no novo PNE as contribuições inovadoras e revolucionárias de Paulo Freire, reconhecidas globalmente, para que as novas gerações possam se educar por meio de uma conscientização crítica e de uma aprendizagem dialógica, onde “educando/a e educador/a” possam colaborar, em parceria, no maravilhoso processo da aprendizagem.
Nesse sentido, o Novo PNE, elaborado a partir de consulta com os diversos setores e segmentos da Educação brasileira, sobretudo com os insumos da última Conferência Nacional de Educação (Conae), convocada pelo Decreto-Lei n. 11.697/23 e realizada em Brasília, em janeiro/24, que, em sua Plenária Final, avaliou o documento-referência do novo PNE (2024-2034).
O tema da Conae 2024 – “Plano Nacional de Educação 2024-2034: política de Estado para garantia da educação como direito humano com justiça social e desenvolvimento socioambiental sustentável”, pautou as diretrizes propostas pelo Ministério da Educação (MEC) em busca de uma melhor compreensão dos problemas atuais e das necessidades presentes e futuras da Educação brasileira.
Embora o Novo PNE apresente uma base sólida de diretrizes, objetivos, metas e estratégias para a Educação no País, seu sucesso vai depender, principalmente, de sua articulação com os planos decenais de educação nos municípios, nos estados e no Distrito Federal. Uma mesma direção pedagógica depende da adesão nacional dos e das profissionais da educação, dos governos e da sociedade brasileira. Dela depende, em grande parte, o sucesso do novo PNE.
(*) Rosilene Corrêa Lima – vice-presidenta do PT-DF. Diretora da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). Ex-diretora do Sinpro-DF.
Artigo publicado, originalmente, na Revista Xapuri, em 1º/11/2024.
Dia do Professor e da Professora: A luta pela educação pública de qualidade no DF
* Por Rosilene Corrêa
O Dia do Professor e da Professora é um momento de reflexão sobre a importância da educação e do papel essencial que esses profissionais desempenham na formação de cidadãos críticos e conscientes. No contexto do Distrito Federal, a luta do sindicato dos professores se destaca, reivindicando uma educação pública, gratuita, laica, libertadora e de qualidade socialmente referenciada. Essa batalha não é recente; suas raízes se entrelaçam com as lutas históricas por uma educação que realmente liberte.
Desafios e ataques à profissão
Nos últimos anos, a profissão de professor tem sido alvo de ataques sistemáticos que visam desqualificar não apenas a imagem do educador, mas também a própria educação pública brasileira. O desmonte das estruturas educacionais e a propagação de narrativas que desvalorizam o magistério refletem um projeto que não começou com o governo Bolsonaro, mas que se insere em uma longa trajetória histórica, desde a ditadura militar. Essa era buscou limitar o pensamento crítico e transformar o direito à educação em mercadoria, contribuindo para a formação de um país dependente e subserviente.
Essa desqualificação da educação e dos educadores se conecta a um projeto mais amplo da elite financeira e empresarial brasileira, que visa manter o Brasil em uma condição de colônia agrícola, servindo aos interesses do primeiro mundo. Ao desvalorizar a profissão docente, busca-se desarticular a capacidade dos educadores de formar consciências, transmitindo conhecimento e gerando novas ideias que poderiam desafiar essa ordem estabelecida.
A necessidade de valorização
É fundamental reconhecer que, para que a educação no Brasil alcance os resultados desejados, é imprescindível investir nos profissionais que a fazem acontecer. Centro do processo educativo, o estudante depende de professores valorizados para adquirirem conhecimento, pensamento crítico e terem uma formação cidadã. Por isso, é fundamental transformar esta ideia em realidade: sem uma valorização adequada, tanto em termos salariais quanto em reconhecimento e estrutura de trabalho, a categoria se torna desmotivada e desiludida.
Atualmente, muitos jovens se afastam da carreira docente, motivados pela percepção de desvalorização e pelas condições precárias de trabalho. Essa desmotivação é reflexo de um sistema que não investe no profissional, levando a uma queda na autoestima do professor e, consequentemente, na qualidade da educação oferecida.
Uma educação de qualidade
Para que o Brasil rompa com esse ciclo de desvalorização e se distancie do papel de fornecedor de recursos para o primeiro mundo, é vital que se construa uma escola pública e gratuita, equipada com infraestrutura adequada e que valorize seu corpo docente. É preciso garantir que os professores tenham não apenas salários dignos, mas também condições de trabalho que permitam o desenvolvimento profissional contínuo e a valorização de sua expertise.
Inspirando-se em pensadores como Paulo Freire, que defendeu uma educação que emancipe e liberte, devemos lutar por um sistema educacional que reconheça e valorize o papel do professor. A luta pela educação pública de qualidade é, portanto, uma luta pela dignidade de uma profissão que, embora fundamental para o desenvolvimento social e intelectual do país, tem sido historicamente menosprezada.
Neste Dia do Professor e da Professora, é essencial reafirmar a importância da valorização dos educadores e a necessidade de uma educação pública que realmente atenda às demandas da sociedade. O fortalecimento do magistério é um passo crucial para garantir que o Brasil não apenas se destaque no cenário global, mas também promova a justiça social e a equidade. É a hora de reconhecer que a valorização do professor e da educação pública é um investimento no futuro do nosso país.
* Rosilene Corrêa é professora aposentada da rede pública de ensino do Distrito Federal e diretora da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e vice-presidenta do PT-DF.
Bailar para longeviver ou longeviver para bailar? Sociedade do Cuidado e Longevidade
“Tempo que se eterniza no movimento, que se sincroniza,
e se desmancha nesse corpo que dança.” Paulo C. S. Ventura
Por Edna Rodrigues Barroso (*)
A Sociedade do Cuidado é contraponto à sociedade da violência, compreendendo o cuidado como um bem público e que não pode ser considerado apenas como uma questão da esfera privada, um problema a ser resolvido dentro das casas e das famílias. Ou seja, é dever do Estado e da sociedade civil organizada se importar e atuar sobre a questão porque “Cuidado é um Direito Humano”.
Uma sociedade assim pressupõe que cuidemos do outro, que cuidemos de nós, que cuidemos do mundo. Ou seja, é possível e indispensável tecer redes intergeracionais de cuidado individual, institucional e coletivo para darmos conta de viver bem nestes tempos desafiadores. Especialmente no momento em que as populações, do mundo e do Brasil, envelhecem aceleradamente.
Envelhecer cada vez mais e melhor exige que Estado e sociedade aprendam, entre outras coisas, sobre intergeracionalidade, aprendizado ao longo da vida e cultura do cuidado. Mas, do ponto de vista prático, como fazer isso? Como democratizar o cuidado, para além dos lares, das mulheres, do pessoal da saúde, educação e assistência social? Como torná-lo cada vez mais visível e valorizado?
As políticas públicas voltadas para o cuidado e a longevidade são indispensáveis e urgentes. Também são fundamentais ações que entidades como o SINPRO já realiza, voltadas para o segmento de quem se aposentou. Dentre todas as atividades, vamos destacar o Baile das Aposentadas e Aposentados.
Podemos afirmar que sua realização é um tempo/espaço de cuidado institucional, de caráter individual e coletivo. Isso porque promove encontros e reencontros; coloca corpos em movimento se deslocando e dançando; oportuniza que diferentes gerações se conectem; reconhece que a contribuição financeira e militante do pessoal aposentado deve ser retribuída; oportuniza uma noite de beleza e de produção visual; estimula a alegria coletiva e a experiência compartilhada; contradiz a ideia etarista de que pessoas 50+ não curtem ou não precisam de diversão, arte e cultura. A trilha sonora da festa retratou bem isso. Vejamos:
“Todos os dias quando acordo, não tenho mais o tempo que passou, mas tenho muito tempo…” Afinal, tempo se mede não apenas pelos relógios, mas também por sentimentos e sensações.
“Se um dia eu pudesse ver meu passado inteiro …” Pois a festa proporciona a oportunidade de rever muitas pessoas que fizeram história conosco.
“Amar até, amar até, até quando Deus quiser…” Posto que “meu caminho é cada manhã”.
“Viver e não ter a vergonha de ser feliz…” Já que podemos sê-lo aos 20, aos 40, aos 80.
Retomemos o título: Bailar para longeviver ou longeviver para bailar? Não é preciso escolher. Bailaremos para viver muito e melhor porque é nosso direito humano avançar no tempo Chronos e no tempo Kairós. E viveremos mais para dançar, rir, cantar, brincar, beber, comer, conviver, errar, acertar, aprender, lutar, cuidar, ser cuidada/o, amar.
Segue o baile, vida que segue!
“Não quero morrer, pois quero ver como será que deve ser envelhecer
Eu quero é viver pra ver qual é, e dizer venha pra o que vai acontecer”. Arnaldo Antunes
(*) Edna Rodrigues Barroso, professora da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal.
O IDEB E A AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DA EDUCAÇÃO BÁSICA
Júlio Barros (*)
O IDEB é um mecanismo inacabado para avaliar a qualidade da educação básica.
Pior que classificar a escola como ruim é subtrair a autoestima da comunidade usuária e colocá-la em confronto com a instituição. Transferir a baixa qualidade da educação básica para estudantes e educadores é uma grande injustiça! Não dá para comparar escolas cuja origem social dos estudantes é tão distinta, pois existe uma correlação entre o desenvolvimento acadêmico e o nível socioeconômico dos estudantes.
O processo de avaliação é importante para mensurar e diagnosticar os problemas da qualidade de ensino. Porém, ao restringir elementos que integram ou interagem com os conceitos de qualidade na educação, o IDEB fica extremamente limitado e fornece resultados duvidosos.
Para aferir com maior eficácia os níveis de qualidade de ensino é necessário observar conceitos como políticas pedagógicas, financiamento, currículo, formação, salário, saúde e fundamentalmente Gestão Democrática.
Entendemos que há outros fatores que devem ser considerados na avaliação da qualidade da educação: as condições de realização do trabalho docente, questões de formação profissional, avaliação rigorosa das instituições de ensino que formam professores, entre outras que demandam um constante repensar sobre as práticas educativas, com fins a uma formação integral e humanizadora do sujeito. Cair no discurso do ranqueamento, assim como a mídia comercial tem repetidamente feito, como se esta fosse a solução dos problemas da educação, só faz aumentar a difusão de uma concepção equivocada dos objetivos que deve ter uma avaliação de larga escala.
A avaliação da educação requer conceito diverso ao posto em prática, em escala mundial, sob a orientação anacrônica do Banco Mundial e outros organismos multilaterais, que privilegiam conteúdos mínimos voltados para as exigências do mercado e se expressa em rankings entre nações ou estados e municípios de um mesmo país, como também entre as escolas de uma mesma unidade da Federação.
É preciso inovar nas concepções pedagógicas, deixar para trás métodos cartesianos e economicistas, que insistem em empregar fórmulas exatas à educação, desconsiderando sua essência humana e filosófica – os quais condicionam os sistemas de ensino a priorizarem currículos de competências, desprezando fatores de qualidade social e isso demanda um constante repensar sobre as práticas educativas.
Assim como no ambiente escolar defendemos uma avaliação diagnóstica e processual, também aqui fazemos a defesa de uma avaliação do sistema, que tenha como objetivo central o diagnóstico das deficiências nas redes de ensino e, a partir dessa análise, a necessidade de se repensar as políticas educacionais voltadas para cada etapa da educação básica.
Fatores negativos, como sucateamento das unidades de ensino, terceirização dos serviços escolares, precarização do trabalho dos educadores e restrição do acesso à população a diversas etapas do ensino; além de comprometer os objetivos sociais da educação, essas ingerências expressam a ausência de uma visão sistêmica que concilia, simultaneamente, as políticas estruturantes de financiamento, currículo, formação e valorização dos profissionais da educação. Não se faz educação de qualidade sem valorização dos professores, e essa política pública precisa deixar de ser promessa de políticos em campanha eleitoral para se transformar em realidade efetiva.
Sobre financiamento por exemplo, até hoje não foi instituído o custo aluno qualidade (CAQ) conceito previsto na Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para apontar os investimentos necessários em cada etapa e modalidade de ensino, o CAQ torna-se primordial para orientar os orçamentos públicos diante das metas dos planos educacionais.
Na questão do currículo, percebe-se que a base nacional – orientada pelo Ministério da Educação e seguida pelos sistemas de ensino – tem se pautado com maior ênfase pela pedagogia das competências, introduzida no Brasil pelas reformas neoliberais dos anos 1990, ou seja, a visão de mercado tem prevalecido frente a um currículo questionador, criativo e amparado na realidade do sujeito social (histórico), a exemplo do que ensinou Paulo Freire.
Entendemos que a qualidade da educação pública reflete as políticas e o compromisso do Estado e da sociedade para com essa prática social, assim como na participação social nas instâncias de decisão dos sistemas de ensino e das escolas. Essas são políticas de caráter sistêmico, que precisam ser urgentemente ampliadas e aprofundadas para romper com as discriminações e exclusões e garantir a efetiva oportunidade para todos e todas.
Enfim, a gestão democrática precisa ser assumida como fator de melhoria da qualidade da educação e de aprimoramento e continuidade das políticas educacionais como políticas de Estado (para além das mudanças de governo). Para o professor Genuíno Bordignon, a gestão democrática das instituições educacionais e do sistema é colocada como fundamento, condição essencial, da qualidade social da educação defendida pela CONAE 2010 na qual a educação é um direito subjetivo de todos e todas, devendo voltar-se à formação integral do cidadão e da cidadã e ao desenvolvimento com inclusão social e sustentabilidade.
A avaliação da qualidade básica da educação não deve ser feita nos termos da gerência de qualidade total, baseada na lógica econômica e empresarial, em que o objetivo central limita-se a atender exigências do mercado. Como vimos, a qualidade da educação é um conceito em disputa na sociedade.
Júlio Barros: Professor de História do CEF 25 Ceilândia – Diretor do Sinpro/DF e Coordenador do Fórum Distrital de Educação/FDE e Mestre em Educação pela UnB.
Vamos falar de amor. Um amor intenso e sereno, maduro e novo. Esse amor trouxe-me para um lugar desconhecido de sensações únicas, mas também revisitadas.
O AMOR de avó/avô.
Ao olhar e pegar a minha neta no colo pela primeira vez, meu coração foi inundado de um amor imensurável. Sensações de renovação e esperança preencheram um lugar, até então desconhecido.
Os momentos de convivência no cotidiano de ser avó são preciosos, impagáveis e eternos. Um amor renovado a cada encontro, a cada sorriso. A primeira papinha, o engatinhar, andar, falar vovó, pedir colo, o aniversário do primeiro ano, a entrada na creche, as festas escolares, enfim, esses cotidianos, que transformam os dias em felizes e especiais.
Cotidianos de descobertas, sorrisos largos, abraços doces, beijos melados, caminhadas de mãos dadas. Momentos eternizados de puro amor. Todos os dias são de novidades, aprendizagens, leveza e renovação.
Busco em Bituca, nosso Milton Nascimento, licença para poetizar esse amor, na sua bela canção – Coração de Estudante.
“Mas renova-se a esperança
Nova aurora a cada dia
E há que se cuidar do broto
Pra que a vida nos dê flor
Flor e fruto”
Renovar a esperança.
Sim. Ser avó renovou a minha esperança. A esperança do verbo ESPERANÇAR, como tão bem disse o Mestre Paulo Freire.
A Esperança que anuncia novidades, a construção de pontes, persistências, possibilidades de mudanças. Assim, nasce uma criança, repleta de novidades, mas carregada de historicidade.
O acontecimento do nascimento, paradoxalmente, revelou-me dois sentimentos: o primeiro é o amor já declarado e o segundo, um incômodo. O incômodo pelo direito das crianças, das meninas. Da condição de ser mulher em uma sociedade machista e, ainda, tão patriarcal.
Há dois anos nasceu o meu neto. Hoje sou avó da Luna e do Ravi. Dois seres humanos que inundam e me fazem transbordar de amor.
Com o nascimento do meu neto a esperança da renovação veio carregada do desejo, que o seu olhar fosse sensível com outro e para o mundo. Um homem forte com doçura, amorosidade e sinceridade. Um homem, que lembre, primeiramente, da sua condição humana. Um homem que não tenha receio de demostrar sentimentos e permita-se chorar de alegria/tristeza e ou emoção.
A luta é transformar o incomodo por justiça social. São muitas as lutas que estão no nosso cotidiano.
Como contribuir para que as crianças possam viver em um mundo/país que respeitam os Direitos Humanos?
O que podemos fazer para ensinar o cuidado com os seres humanos?
Como podemos garantir que todos os humanos tenham a garantia do direito à liberdade, à igualdade e à dignidade, com o respeito a sua imensa diversidade?
“Há que se cuidar da vida
Há que se cuidar do mundo”
Esse mundo é possível?
Impossível é não pensar na possibilidade da luta, no coletivo, na educação e no amor.
Nossa luta é:
Um mundo sem miséria; respeito à infância e sem trabalho infantil; educação e saúde públicas de qualidade; salários e condições de trabalhos dignos; respeito e dignidade aos idosos, aposentados e pensionistas; saneamento básico; segurança; preservação do meio ambiente, da fauna e da flora; proteção aos rios, florestas e ecossistemas e de suas respectivas populações; garantia de ir e vir; garantia da liberdade de expressão e de pensamento; respeito a nossa identidade étnicas, raciais e de gênero; respeito a memória, a história, a cultura, ao patrimônio…
A defesa da Democracia é a defesa dos Direitos Humanos, um país de fato democrático é humanizado para todos, todas e todes.
Um Estado Democrático de Direito é um Estado que cuida e zela pela garantia dos Direitos Humanos, e principalmente da infância, das crianças e jovens que é o nosso futuro.
A todas avós e todos avôs que amam seus netos, sejam crianças, adolescentes ou adultos. Desejo que não percamos a capacidade de lutar e, principalmente, a capacidade de falar das lutas necessárias, na consolidação dos Direitos Humanos.
E há que se cuidar do broto
Pra que a vida nos dê flor
Flor e fruto
(*) Por Kátia Franca Vasconcellos, professora aposentada da Secretaria de Estado da Educação do Distrito Federal (SEE-DF e, atualmente, diretora de Direitos Humanos/Instituto Horizonte)
Os direitos das pessoas com deficiência referem-se às oportunidades de se desenvolver, de ter acesso à saúde e à educação, de se divertir, de usufruir da cidade tanto quanto as demais pessoas. É um dever do Estado garantir que se cumpra a Constituição, que destaca que todos e todas são iguais; e para haver igualdade, há políticas públicas dirigidas para determinados segmentos da população, como o das Pessoas com Deficiência.
Entretanto, muitas pessoas com deficiência ainda enfrentam realidades muito difíceis no seu dia a dia, justamente por falta dessas políticas públicas. Na legislação, as garantias são amplas, mas entre a legislação e a prática, há uma grande distância.
Recentemente, gaúchos e gaúchas foram atingidos pela maior tragédia ambiental da história do seu estado. Foram situações extremas: as grandes enchentes fizeram com que a água invadisse as casas, ao mesmo tempo em que faltava água potável. Faltaram alimentos, produtos de limpeza e de higiene. Mas como foi garantida a prioridade de atendimento às pessoas com deficiência? Certamente, elas foram mais impactadas.
Da mesma forma que as mudanças climáticas são uma realidade que possivelmente provocará outras situações como essa, os tempos de hoje também têm outra característica: a revolução tecnológica. Ela abre novas possibilidades para o tratamento e para o dia a dia das pessoas com deficiência, porém, como tudo no sistema capitalista, as novas tecnologias não estão disponíveis igualmente para todos. E mais: as novas tecnologias também vêm causando alterações profundas no mundo do trabalho, o que também atinge de forma diferenciada as pessoas com deficiência.
Todos esses temas estiveram na pauta da COSP 17 – 17ª Conferência da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência -, que aconteceu em junho deste ano na cidade de Nova Iorque. O evento reúne representantes de países signatários da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, documento internacional que visa a proteger os direitos e a dignidade desse segmento.
A articulação internacional, que a conferência possibilita e representa, permite também uma rica troca de experiências que envolve governos, parlamentos e sociedade civil. No Brasil, temos dois importantes produtos da nossa mobilização e dessa articulação internacional, que são a Lei Brasileira de Inclusão (Estatuto da Pessoa com Deficiência) e a Lei de Cotas.
Para nós, do movimento sindical, a Lei de Cotas tem um significado especial, porque se trata de uma elaboração coletiva que interfere na organização do trabalho. Ela precisa estar em permanente atualização e aprimoramento, e esse é um tema central para o Coletivo de Pessoas com Deficiência da CUT-DF e para o Coddede (Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Distrito Federal).
No caso da Educação, há dois enfoques necessários: os trabalhadores e trabalhadoras da educação e os estudantes. É obrigação do Estado oferecer ensino de qualidade 100% acessível para toda criança ou adolescente com deficiência, seja qual for sua condição. Para isso, são necessários profissionais de educação qualificados, valorizados e preparados para esse atendimento. É necessário que a escola disponha de um espaço acessível e que as salas de recurso estejam adequadamente equipadas para receber esses estudantes.
Ou seja: para garantir o direito das crianças e jovens com deficiência, é necessário investimento em educação especial na perspectiva da educação inclusiva. Essa é uma bandeira que o Sinpro levanta e que tem reforçado ainda mais através da campanha atual.
As conexões internacionais acerca dos direitos das pessoas com deficiência possibilitam ampliar horizontes, socializar estratégias e fortalecer as lutas. É muito importante, portanto, que o movimento sindical participe desses espaços e se responsabilize pelas suas resoluções.
* Carlos Maciel é dirigente do Sinpro-DF, coordenador do Coletivo de Pessoas com Deficiência da CUT-DF e para o Coddede (Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Distrito Federal).
Entre resistências e lutas: saúde mental da população negra ainda em xeque
(*) Por Mariana Almada
Antes de começarmos a conversa, um breve silêncio se faz… Pelas resistências, pelas mulheres pretas e pardas, por nossa ancestralidade, pela história que foi, e com ela a necessidade de representar os que se foram e nos deixaram memórias registradas também em nossa pele e nossa luta.
Falemos aqui das duas questões que recaem sobretudo naquilo que chamamos de emoções e colocam em xeque a saúde mental da população negra, são elas: a exclusão social e o racismo. Conforme as regras do xadrez, a condição de quem se encontra em xeque evidencia situação de risco, ameaça, perigo
No campo da exclusão: saúde mental em xeque!
Excluir é deixar de fora, é o que entendemos por não pertencimento. Todas as pessoas querem sentir-se de alguma forma pertencidas a coletivos, e que tal condição permita agregar valor, falemos em pertencer a uma árvore genealógica, a um clã, a um núcleo, a uma classe, ou a quaisquer outros segmentos sociais. Um direito, refutado desde o momento em que pessoas negras foram retiradas de suas próprias histórias e trazidas à escravidão.
Nossos antepassados saíram das senzalas para as ruas, para as periferias urbanas, ‘exclusive’ para casas ou empregos dignos. Não havia lugar para morrer ou para viver.
Desta forma, a vontade de construir algum vínculo de pertencimento é sofrida quando não validada e por isso há necessidade das lutas e resistências sobretudo na coletividade, uma maneira de obter respostas às questões internas ainda não respondidas. Aí acontece o sofrimento mental, uma oportunidade de olhar para tudo o que nos fez chegar até aqui. E isso é muito importante!
No campo do racismo: saúde mental em xeque-mate!
O racismo no que tange às questões de ansiedade e depressão, abrange todas as lutas internas, passadas e atuais, o que não são “pieguices” como dizem os reacionários que estão de fora. Essa prática se constitui em um outro caso de doença mental. Por isso, a importância da consciência negra e do conhecimento sobre os casos de racismos (racismo estrutural, ambiental, religioso, etc.) que testemunhamos, sofremos e que precisa levar-nos a gritar, contestar e levantar os punhos, algo que nos conduza refletir o quanto isso nos afeta enquanto seres humanos.
Sofrer injúrias, ataques que inferiorizam, desumanizam, abordagens policiais abusivas, são situações que podem nos remeter a todos os possíveis traumas da infância, os medos internos, gatilhos que nos remetem a tais sofrimentos. E lá vamos nós às nossas terapias (diga-se de passagem, inacessíveis para a maioria da população negra) buscar novos significados às dores causadas pelo racismo. Ao que ele nos causa: xeque-mate (ergamos os punhos novamente).
Dentre as complexidades, a matemática é simples: ao não pertencimento, em consonância com o racismo, entendamos que o que temos para hoje são as relações com tudo o que nos cerca. Tais violências subtraem a nossa condição humana.
Por isso, na coletividade negra, “escurecer” sobre a importância de nos reconhecermos frente às lutas, valores, oralidades, religiosidades, cooperativismos… como faziam nossos ancestrais, significa multiplicar potencialidades.
Erguer os olhos do coração, em posição de luta, importar no intuito de trazer para dentro de nós a força e a coragem por meio das mudanças que almejamos para o futuro, faz-se necessário.
Neste julho das ‘pretas’, façamos sempre mais! (ergamos os punhos novamente, compreendendo a dimensão simbólica que tal gesto enseja).
*Mariana Almada é professora, psicanalista e fotógrafa.