MULHERES EDUCADORAS: AMAR O MUNDO E MUDAR A SOCIEDADE NOS INTERESSA MAIS
Em artigo publicado na revista Mátria, a professora, vice-presidenta do PT/DF, diretora da CNTE, ex-Dirigente do Sinpro-DF e conselheira da Revista Xapuri, Rosilene Corrêa, fala sobre a importância das mulheres educadoras.
Neste março, mês das mulheres, rendo minhas homenagens às mulheres que, em uma luta que não vem de hoje, investiram na educação como uma forma de mudar a sociedade para, aprendendo e ensinando, fazer deste nosso planeta um mundo mais justo, mais terno e mais solidário Conta a história que Madalena Caramuru, do povo Tupinambá, foi a primeira mulher alfabetizada em terras brasileiras, entre 1534 e 1561. E que, logo em seguida, por volta dos anos 1570-1580, Branca Dias, portuguesa perseguida pela Inquisição, fundou no Recife a primeira escola de meninas do Brasil. Teria sido Branca Dias a primeira professora do Brasil?
MasfoisónametadedoséculoXIXquealgumasmulheresbrasileirastiveram condiçõesdereivindicarseudireitoàEducação.Em1827,vieramasprimeiras matrículas em estabelecimentos de ensino. E foi somente 52 anos depois, no ano de 1879, que nossas mulheres brasileiras puderam, enfim, cursar uma faculdade. Em 1810, Nísia Floresta fundou, no Rio Grande do Norte, sua própria escola para ensinar às meninas, além de prendas domésticas, matemática e ciências. Maria Firmina dos Reis, autora de “Úrsula”, o primeiro trabalho literário crítico à escravidão no país, foi fundadora da primeira escola mista e gratuita do Maranhão, em 1880.
Já no século XX, em 1922, a professora Antonieta de Barros criou em Santa Catarina um curso para alfabetizar crianças socialmente vulneráveis. Eleita, em 1934, como a primeira deputada estadual negra do Brasil, foi a partir de um projeto de lei de sua autoria que o dia 15 de Outubro foi oficializado como o Dia do Professor. Mas foi apenas no ano de 1982, ainda no regime militar, que uma mulher, a professora Esther de Figueiredo Ferraz, veio a assumir um ministério, não por acaso o Ministério da Educação e Cultura (MEC), no lugar de um general da ditadura. E se passaram outras três décadas até que, nos anos 2000, Débora Seabra, do Rio Grande do Norte, fosse reconhecida como a primeira educadora com Síndrome de Down no Brasil.
BRASÍLIA Em 15 de outubro de 1957, foi inaugurada em Brasília, na Candangolândia, a primeira escola de Brasília. Com projeto de Oscar Niemeyer, construída em madeira, sobre pilotis, em apenas 20 dias, a escola recebeu o nome de Grupo EscolarJúliaKubitscheck,emhomenagemàmãedopresidenteJK,que também era professora.
Sob supervisão do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, dirigido por Anísio Teixeira, a escola, que oferecia educação em tempo integral, teve como primeiras professoras Amábile Andrade Gomes, Maria do Rosário Verner, Célia Cheir, Maria de Lourdes Moreira, Maria de Lourdes Cruvinel, Santa Alves Soyer, Carmen Daher e Ana Pereira Leal foram as primeiras educadoras do Distrito Federal. Desde então, muitas mulheres-educadoras continuaram fazendo história na Educação do Distrito Federal. Aprovada no primeiro concurso público para professora do Distrito Federal, em 1960, Martha Cintra fez parte da primeira diretoria do Sinpro-DF. Lutou contra a ditadura e pelos direitos da categoria. Faleceu em 20/07/2022, aos 84 anos.
Isabel Portuguez, diretora do Sinpro-DF dedicou, durante toda sua carreira, a lutar em defesa de uma educação pública de qualidade e políticas públicas de valorização da carreira do Magistério. Defensora incansável dos professores aposentados do Distrito Federal é dela a frase “Inativo é quem não luta”, que até hoje nos move e nos motiva. Faleceu em 27/12/2015.
Tambémex-diretoradoSinpro-DFemilitantepolítica,aprofessoraLúciaIvanov, companheirafundamentalnosprocessosdecriaçãodaCNTE(Confederaçãodos Trabalhadores Nacional da Educação) e da CUT (Central Única dos Trabalhadores), continua imprescindível em todas as lutas em defesa da Educação e da democracia no Brasil.
É em honra dessas grandes mulheres educadoras que nos inspiram no olhar da esperança de um país com uma educação libertadora que desejo a cada mulher e cada professora muita força e muita energia para seguir lutando porque, afinal, como nossas predecessoras, amar o mundo e mudar a sociedade é o que mais nos interessa, não é mesmo?
Rosilene Corrêa –Professora. Vice-Presidenta do PT/DF. Diretora da CNTE. Ex-Dirigente do Sinpro-DF. Conselheira da Revista Xapuri
Educação Alimentar Vs Mercado: como a lei da oferta e da demanda pode influenciar na alimentação saudáve
Um dos bordões mais utilizados nos dias de hoje: “você é o que você come” demonstra que a nossa sociedade tem se voltado cada vez mais para a necessidade de cuidar da saúde a partir da alimentação. Aliada à prática de exercícios físicos regulares, hidratação e as tão sonhadas oito horas de sono por dia, em média, a alimentação saudável figura entre os assuntosmaispesquisadosna Internet e discutidos nos mais variados ambientes, da academia à academia…
Contudo, como não poderia ser diferente, em uma sociedade de Economia Capitalista, o Mercado tem observado essa tendência, ou melhor dizendo, essa demanda. E através dos seus “tentáculos invisíveis” exerce de maneira fria e cruel o que determina uma das suas leis, oferta e demanda, e eis que o preço de alimentos naturais e orgânicos aumenta a cada dia, em um ritmo muito maior do que os industrializados.
Na pesquisa intitulada “Panorama do consumo de orgânicos no Brasil 2021”, apresentada pelaForbes1emjaneirode2022,oconsumodeorgânicosentre os brasileiros vem aumentando, motivados pela qualidade do alimento ou pelo fetiche do modismo, também cresce entre a nossa população a conscientização a respeito dos danos causados pelo uso irresponsávelde agrotóxicos por uma grande parcela do agronegócio, como aponta a matéria “Uso de agrotóxicos no Brasil dobrou entre 2010 e 2021”2publicada no site do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Não bastasse o fato de que a desigualdade social determina quem pode ou não ter acesso aumaalimentaçãodequalidade,nósaindatemos mais um problema decorrente da crueldadedocapitalismo: o crescimento da obesidade na classe trabalhadora. Sim, a mesma classe que padece da subnutrição, também enfrenta o problema da obesidade, como aponta a matéria da BBC News Brasil, “Por que um terço dos países mais pobres enfrenta ao mesmo tempo epidemias de obesidade e de desnutrição”. Isso é o resultado dos altos preços praticados pelo mercado em relação aos alimentos naturais e orgânicos, em detrimento dos alimentos industrializados.
Sim, agora podemos chegar ao nosso título, Educação Alimentar Vs Mercado. A Lei nº 13.666/2018 que altera a Lei nº 9.394/1996 (LDB), inclui “o tema transversal da educação alimentar e nutricional no currículo escolar”. Para fazer sentido, a partir da premissa da educação como processo de emancipação humana, é preciso tratar a alimentação como necessidade básica humana, vital. Ou seja, desfetichizar, tornar natural e humanizar a alimentação.Contudo,esseprocessosó é possível a partir do rompimento da lógica capitalistadesumana,cruelecausadora,também,dosproblemasalimentaresque enfrentamos na modernidade.
Aocontemplara Educação Alimentar no currículo escolar, podemos trabalhar com as crianças, adolescentes, jovens adultos e idosos, questões centrais como o problema dos latifúndios, das monoculturas, dos agrotóxicos e da especulação dos preços dos alimentos pelo mercado. A desigualdade que causa a fome também causa a obesidade e tantos outrosproblemasdesaúdequea classe trabalhadora enfrenta todos os dias. Dessa maneira,paraalémdaquestão alimentar,épossívelconscientizardosmalesque o Capitalismo produz e reproduz.
A frase do título, retirada de uma das composições de Renato Russo, sugere certa contradição. Contudo, neste fim de ano, a cena de uma multidão reunida em Paris materializou o que o poeta afirmava na canção. Milhares de pessoas, em frente à Torre Eiffel, fascinadas pela queima de fogos, apontavam os celulares no intuito de registrar cada explosão que iluminavam o céu. Compreensível o fascínio, mas, incômodo o fato de que cada pessoa agisse como se, apesar de outras pessoas ao lado, estivesse sozinha. A imagem parece mais uma aglomeração de celulares do que uma reunião de pessoas. Embora os corpos estivessem muito próximos, cada indivíduo se resumia a seu celular, e à incapacidade do aparelho para o afeto e humanidade. Essa cena chama atenção porque parece ser o emblema deste tempo histórico em que estamos vivenciando. O abraço, o aperto de mão e o toque de carinho foram substituídos pela impessoalidade do provável compartilhamento mediado pelo aparelho. Mas, o problema real não é o aparelho, é o déficit de humanidade que vivenciamos atualmente.
Com bem afirma o sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman na sua obra “Amor líquido”, vivemos num mundo em que tudo é líquido, ou seja, vivemos na cultura do descarte, e, nessa perspectiva, alimentar afetos requer tempo, e, tempo é dinheiro. Considerando a necessidade imperiosa em utilizar para ganhar dinheiro, é mais do que adequado fazer uma boa foto para demonstrar nas redes sociais que a vida vai bem do que despender tempo para compartilhar afetos. Nas redes sociais, nos grupos de relacionamentos virtuais, qualquer pessoa pode ser o que desejar, e uma boa foto é a comprovação de que, virtualmente, está tudo às mil maravilhas. Há pesquisas que dão conta de que as pessoas, atualmente, ficam quase metade do tempo diário conectadas nas redes sociais e em grupos de relacionamentos virtuais. Dessa forma, a vida real é parte da vida virtual, transformando o indivíduo em uma personagem de sua própria existência. A questão é que o modo de vida virtual se assenta, sobre uma proposta de homogeneidade de comportamentos, de estética e de linguagens aos indivíduos. Essa ideia de homogeneidade que ganha força com a utilização massiva das redes sociais, vem, contudo, desde muito antes, alimentada pela proposta capitalista que estabelece modelos ideais de indivíduos. Uma vez que as redes são produzidas e alimentadas pela lógica capitalista cada indivíduo tenta demonstrar o quão próximo está dos modelos ideais ao postar fotos sobre viagens constantes, bens adquiridos, participação em grandes eventos etc. Todos os registros com muitos sorrisos e expressões padronizadas.
Nesse sentido, ao não compreenderem que os modelos ideias estabelecidos pelo sistema capitalista são baseados no consumo desenfreado, a maioria das pessoas aceita que a aparência é mais importante que a presença. Comportamento que ajuda a entender o porquê do fato de centenas de pessoas se reunirem em uma praça de Paris, fascinarem-se com o brilho dos fogos, mas, não se darem conta do (a) outro (a) que está ao seu lado. O distanciamento afetivo, apesar da proximidade física, é também causa da insensibilidade em relação ao sofrimento a que milhões de pessoas são submetidas em todas as partes do mundo. Há algumas décadas, a informação sobre infortúnios vivenciados por pessoas e comunidades mundo afora, demorava muito tempo para ser divulgada. Hoje, é instantânea. O mudo fica sabendo o que ocorre em qualquer lugar do planeta quase que em tempo real. Mesmo assim os sofrimentos não causam indignação ou, quando causam algum sentimento, ensejam uma indignação passageira. No Brasil, por exemplo, durante a pandemia do novo coronavírus, centenas de indígenas e populações carentes foram abandonados à própria sorte, ou óbvio infortúnio, pela insistência do ex-presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), em desconsiderar a gravidade da covid-19. Nesse cenário de descaso, estima-se que se tivesse havido um processo célere de aquisição de vacinas e incentivo à vacinação em massa cerca de 400 mil vidas poderiam ter sido preservadas. Contudo, o Brasil perdeu mais de 700 mil vidas, o que representa, cerca de 10% das vítimas fatais em todo o mundo, sendo a população total do País pouco mais de 3% da população mundial. Vale ressaltar que, apesar desse fato, o ex-presidente conseguiu mais de 30% dos votos dos eleitores brasileiros, que ao desconsiderarem a realidade objetiva optaram pelas versões e justificações disseminadas através das redes sociais.
A insensibilidade ao outro somada ao fascínio pelo objeto tem construído uma sociedade do ilusionismo e insensível, uma sociedade sem afeto, em que ter e parecer é mais importante do que ser. Ao abdicar da condição de ser, o indivíduo perde a perspectiva de humanidade, colocando-se na condição de “coisa” incapaz de afeto e de sentimentos de pertencimento a uma comunidade de seres humanos. Perde o sentido da importância do coletivo. A humanidade que produziu tantos avanços tecnológicos, que potencializou o espírito humano por meio da arte e da cultura, tem, hoje, o grande desafio de construir a dimensão humanista do afeto, da generosidade, da alteridade e da indignação frente a toda ação que ameaça ou destrói a vida. É preciso substituir a distância alimentada pelo individualismo e pelo consumismo desenfreado, pelos afetos que se materializam na vida em comunidade e no acolhimento das necessidades individuais como necessidades coletivas.
(*) Por Cleber Soares, professor da rede pública de ensino do Distrito Federal e diretor do Sinpro-DF.
Nós, que somos da Educação, sabemos bem que a avaliação é uma ferramenta importante, que pode contribuir para a formulação de um diagnóstico onde se encontram fragilidades e fortalezas, e indicativos de ações a serem tomadas para melhorar. É por isso que o Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) não é uma avaliação relevante, aliás, mal pode ser chamado de avaliação.
Em primeiro lugar, trata-se apenas de uma prova de desempenho aplicada em estudantes a cada três anos, desconsiderando todos os demais ângulos do fenômeno educacional. Quem realiza o exame é a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que, por ser uma entidade da economia, tem padrões próprios a partir dos quais entende e analisa a educação.
Além disso, é praticamente impossível estabelecer uma referência única para 80 países, conjunto que apresenta uma ampla diversidade econômica, cultural, religiosa, social e política. Comparar esses países tão diversos (e desiguais) entre si não ajuda em nada, porque é óbvio que um estudante de um país rico se sairá melhor que um estudantes de um país pobre – e o problema aí não é educacional, mas socioeconômico.
Ou seja, o resultado do Pisa não necessariamente expõe a qualidade da educação. Avaliações são processos bem-vindos porque efetivamente podem ajudar. No entanto, o Pisa vende gato por lebre, porque se trata de um exame de desempenho muito mais próximo de um vestibular que de uma avaliação institucional.
Por tudo isso, quem acredita no importante papel que ferramentas de avaliação institucional podem cumprir não se ilude com o Pisa. E adicionalmente, é importante ficarmos atentos para que não se criem distorções como premiações a escolas e professores, afinal, a finalidade de uma avaliação não é e nem pode ser comercial ou dentro de uma lógica competitiva – isso comprometeria frontalmente o processo e o resultado.
Uma avaliação de verdade envolve o próprio objeto em avaliação, é construída democraticamente e tem padrões claros e resultados objetivos, de preferência em relatório, para que possa efetivamente ser instrumento de melhorias. Fora disso, a chance maior é de tornar-se apenas um grande recurso ideológico ou de marketing.
* Letícia Montandon é coordenadora da Secretaria de Imprensa do Sinpro-DF.
Início de mais uma jornada pela inclusão e pela justiça social
* Por Berenice Darc
A terceira eleição de Lula para a Presidência da República, como as anteriores, foi marcada pela percepção de que é necessária a criação e o fortalecimento de mecanismos de inclusão, distribuição de renda e justiça social. Embora o governo seja formado por uma coalizão, com posições diversas, o governo Lula, já em seu início, vem tomando iniciativas importantes nessa direção.
Embora alguns propagadores de fake news e difusores do apocalipse disseminassem, durante a campanha, que o então candidato Lula tiraria a casa das pessoas, o presidente foi na direção contrária. Em vez de gastar dinheiro público na cobrança e no despejo de inadimplentes do programa Minha Casa Minha Vida, decidiu investir esse mesmo dinheiro público no povo: beneficiários do BPC (Benefício de Prestação Continuada) e do Bolsa Família serão isentos das parcelas restantes.
Na prática, o governo zerou as dívidas do programa para quem recebe Bolsa Família ou BPC. Segundo os técnicos do poder executivo, o impacto fiscal dessa medida tende a ser zero. Ou seja, trata-se mesmo de uma questão de escolha política. Um belo gol do Governo Federal.
Na área da Educação, duas medidas foram anunciadas recentemente com o objetivo de beneficiar estudantes de baixa renda. No início de novembro, o presidente Lula determinou que cerca de 1,2 milhão de estudantes ou formados inadimplentes com o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) podem renegociar suas dívidas com até 99% de desconto.
A pessoa não precisa estar em dívida com o Fies para buscar negociar o refinanciamento em condições vantajosas. Com isso, promove-se a ocupação pública de vagas privadas no ensino superior, e ampliam-se as oportunidades para pessoas em situação de maior vulnerabilidade, para que possam investir na sua carreira ou para que não precisem largar seus estudos.
Favorecer a permanência nos estudos e combater a evasão também é o mote da medida provisória nº 1.198, publicada no final de novembro. O objetivo da proposta é instituir uma poupança destinada a estudantes do ensino médio de baixa renda, com foco, especialmente, em jovens de famílias inscritas no Cadastro Único, para que se mantenham na escola até concluírem a educação básica.
O governo federal aportará até R$ 20 bilhões em um fundo especial que será criado para esse fim. Para ser beneficiado, será exigido do ou da estudante frequência mínima, aprovação no ano letivo e participação no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e no Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica).
Combater a evasão escolar e incentivar os jovens de baixa renda a acessarem o ensino superior são grandes desafios atuais; e também estratégias importantes para democratizar a educação e as oportunidades. Sem educação, não se faz justiça social.
Essas foram iniciativas tomadas neste primeiro ano do terceiro governo Lula que indicam que o presidente pretende fazer do seu mandato um instrumento da democratização do Estado. A distribuição de renda e a promoção da igualdade de oportunidades são condições para que todos e todas possam viver em paz e com dignidade! Que assim seja, e que se aprofunde.
* Berenice Darc é diretora da Secretaria de Políticas Educacionais do Sinpro-DF.
O que a guinada à direita da Argentina nos ensina?
Por Raimundo Kamir*
No dia 19 de novembro, o mundo viu a Argentina dar uma inquestionável guinada à extrema direita. Mais uma sociedade sucumbiu ao discurso fácil do “contra tudo isso que está aí, abaixo o sistema”, um discurso raso, irresponsável e inconsequente. E, acima de tudo, um discurso no qual se emprega, de maneira falsa e hipócrita, a ideia de “Liberdade”.
Do discurso para a prática, a distância é sempre muito grande. Fechar o Banco Central, romper relações com a China e com o Brasil são atos simplesmente suicidas para a Argentina. Não tem como dar certo. Se o discurso de campanha estava cheio de coragem e testosterona, o governo deverá ser de raciocínio, ponderação e contemporização. Estará o presidente eleito Javier Milei preparado para isso? Estará a Argentina a salvo dos arroubos inconsequentes de um ser que afirma, bizarramente, que recebe orientações do espírito de seu cachorro morto?
A América Latina assiste ao pêndulo ideológico se mover muito rapidamente para a direita. No Chile, após a eleição de Gabriel Boric, as forças de oposição enfraqueceram muito rapidamente o governo eleito. O resultado: uma nova constituição reprovada pelo voto popular, e segunda Assembleia Constituinte convocada. E a nova Carta Magna do país, reescrita por essa segunda Assembleia, amplamente de direita, vai a votação popular no dia 17 de dezembro, mas já é rechaçada pela população. Ao que tudo indica, o Chile não terá uma nova constituição, pois não será convocada nova Assembleia Constituinte caso esta nova Carta Magna seja rejeitada. Na Colômbia, o governo de Gustavo Petro também sofre com ataques da direita. No Equador, um liberal de direita acaba de tomar posse como presidente. Também está enfraquecido o governo do boliviano Luis Arce.
Mas essa aparente vitória da direita na América Latina, ante o “fracasso” (entre aspas) da esquerda, representa uma derrota para a própria direita. Explico.
Quem ascende ao poder na América Latina não é a direita moderada, ponderada, racional, e sim a extrema direita radical. Essa ala mais extrema do espectro ideológico traz para onde quer que vá a autocracia, o descrédito de instituições como o Poder Judiciário, movimento civil organizado (como os sindicatos), eleições e imprensa livre, e instaura o fascismo. Eis aí como as democracias morrem: com altas doses de fascismo administradas pela extrema direita.
Sindicato e resistência
Além disso, tratar a esquerda moderada como pária social não é positivo para a sociedade. Historicamente, o processo de ascensão do fascismo (e do nazismo) deixa bem claro que o discurso fascista é permeável e absorvível por quase toda a sociedade. O quase dá brecha a uma exceção: o sindicalismo. Palavras do insuspeito filósofo norte-americano Jason Stanley, autor de “Como funciona o fascismo: a política do “nós” e “eles”.
Nesse livro, de 2018, ele explica que um dos obstáculos para o que ele chamou de política do “nós contra eles” (em que o nós representa os fascistas, superiores e o eles representa o resto da sociedade, seres inferiores) é justamente “a unidade e a empatia intraclasses, exemplificadas nos sindicatos. Nos sindicatos em funcionamento, os cidadãos brancos da classe trabalhadora [lembrando que o livro descreve a ascensão do fascismo na primeira metade do século XX na Europa] se identificam com os cidadãos negros da classe trabalhadora, em vez de se ressentirem deles. Os políticos fascistas entendem a eficácia que essa solidariedade tem em resistir às políticas de divisão e, portanto, procuram desarticular os sindicatos. Apesar de condenar as “elites”, a política fascista procura minimizar a importância da luta de classes.
Stanley prossegue, cirúrgico: “o sindicato é o principal mecanismo que as sociedades descobriram para vincular pessoas que diferem em vários outros aspectos. Os sindicatos são fontes de cooperação e de comunidade e de igualdade salarial, bem como mecanismos para fornecer proteções às vicissitudes do mercado global. De acordo com a política fascista, os sindicatos devem ser esmagados para que os trabalhadores individuais tenham que se virar sozinhos no mar do capitalismo global e passem a depender de um partido ou líder. A aversão pelos sindicatos é um tema tão importante na política fascista que o fascismo não pode ser totalmente compreendido sem um entendimento disso.”
Corta para o início do século XXI, onde o mundo viu o enfraquecimento dos sindicatos. Aqui, no Brasil, os sindicatos sofreram com a “reforma trabalhista”, travestida de modernização. Muitos sindicatos fecharam suas portas, e em 2022, pela primeira vez, o Brasil tem menos de 10% dos ocupados sindicalizados, e várias categorias sofrem com perdas salariais significativas e trabalho precarizado como consequência direta da perda de direitos trabalhistas.
Isso corresponde a um contingente de 9,1 milhões de empregados. https://oglobo.globo.com/economia/noticia/2023/09/15/numero-de-trabalhadores-sindicalizados-no-pais-cai-ao-menor-nivel-em-uma-decada.ghtml
O pêndulo ideológico precisa de equilíbrio. Enfraquecer forças à esquerda significa fortalecer as forças da direita. Uma sociedade com esquerda fragilizada vai pender para a extrema direita – para quem qualquer um é “comunista”. Isso não é bom, isso não é positivo, isso não é saudável.
Em 2022, o Brasil não elegeu um governo de esquerda, tampouco um governo de coalizão. No ano passado, os eleitores elegeram Luiz Inácio Lula da Silva, o único capaz de ameaçar a hegemonia da direita. Palavras de Steve Bannon, o estrategista da direita mundial, aliado dos Bolsonaro aqui no Brasil. Enfraquecer Lula, portanto, nas palavras da própria direita, é fortalecer o fascismo no Brasil.
Enfraquecer e desrespeitar a esquerda, em nível continental e mundial, é abrir alas para a ascensão do fascismo em nível mundial. O mundo já vi a ascensão do fascismo, há exatos 100 anos. E não deu bom.
De volta à Argentina, as “ideias” do presidente eleito podem levar o país da crise séria ao caos absoluto e de difícil retorno. O Brasil pode sentir o refluxo dos problemas econômicos do vizinho que é o terceiro maior exportador e importador de produtos brasileiros.
A esquerda e o sindicalismo não são o problema. Pelo contrário, podem ser a solução. Inclusive para a direita moderada.
Raimundo Kamir é diretor do Sindicato dos Professores no Distrito Federal – Sinpro/DF
A Primavera Secundarista resiste por uma escola do tamanho dos nossos sonhos
(*) Por Beatriz Nobre
Nos anos de golpe e ascensão do fascismo no Brasil, as e os estudantes foram aqueles e aquelas que sempre estiveram na luta em defesa da democracia e de um país soberano para todos. Organizamos os grandes Tsunamis da educação, ocupamos escolas anunciando a tragédia que seria a implementação do Novo Ensino Médio e contra a PEC 241/2016, que limitava os investimentos na educação e ameaçava o futuro das Universidades e Institutos Federais, esse momento ficou marcado na história como a Primavera Secundarista.
Após seis anos, os frutos de um projeto elaborado sem qualquer diálogo com os diversos setores da educação são desastrosos para a juventude brasileira, acentuando a desigualdade e precarizando o ensino público.
A reforma do Ensino Médio, em seu contexto foi criada pelo interesse da elite econômica em ditar qual o tipo de educação deve ser ofertada no Brasil, fazendo com que o ensino seja cada vez mais sucateado e que se privatize a oferta educacional direta cada vez mais. Na realidade não adianta mudar todo o currículo educacional sem cumprir demandas que já existiam anteriormente: como a construção de laboratórios, salas de aulas, e a ampliação de escolas, especialmente as escolas técnicas e seus respectivos profissionais já que o NEM aumenta drasticamente a demanda por ensino técnico e profissional.
Temos uma grande evasão escolar em todo o Brasil que aumenta dia após dia, a pandemia da Covid-19 contribuiu para o aumento da evasão escolar, mas a implementação do NEM à intensificou mais ainda, a pesquisa do IBGE registrou pela primeira vez em números que das cinquenta milhões de pessoas com idades entre 14 e 29 anos, dez milhões, ou seja, 20% delas, não tinham terminado alguma das etapas da educação básica. No índice, a grande maioria é de pretos e pardos.
O principal motivo da evasão de mais da metade da população, é a necessidade de trabalhar para sustentar a casa, além do desinteresse no modelo de ensino ofertado, ao invés de manter os nossos estudantes nas salas de aula e ser algo que realmente contribui para sua formação, esse modelo está os expulsando das escolas, já que não condiz com as condições reais de vida da população brasileira.
É de extrema importância o debate de uma formação cidadã, que compreenda as relações do mundo do trabalho e o ingresso na Universidade, utilizando o potencial da nossa geração para o desenvolvimento do país, gerando perspectivas para a vida pessoal e profissional da juventude.
Por todo o país milhares de estudantes denunciam diariamente as desastrosas consequências do NEM, construímos uma campanha gigante que atingiu escolas desde a periferia, interior à capital reinvidicando a revogação do Novo Ensino Médio e pautando uma educação do tamanho dos nossos sonhos.
Tivemos diversas conquistas nesse período, tais como: a recomposição orçamentária das Universidades e Institutos Federais, revogação do Programa de Escolas Cívico-Militares (PECIM), recomposição da verba da merenda escolar, a importante aprovação do PL da lei de cotas na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, a implementação do NEM foi suspensa e o Ministério da Educação realizou uma consulta pública para escutar estudantes de todo o Brasil sobre suas vivências desastrosas com esse novo modelo de ensino. Os resultados da consulta só consolidou o que denunciamos todos os dias: o Novo Ensino Médio precisa ser revogado urgentemente e é necessário a construção de uma nova lei que seja construída com os estudantes e profissionais de educação.
No dia 24/10 tivemos uma importantíssima vitória, o Presidente Lula enviou à Câmara dos Deputados o PL de reestruturação do Novo Ensino Médio, PL esse que é fruto da luta das e dos estudantes secundaristas e aborda os nossos principais pontos, tais como:
Recomposição da carga horária da Formação Geral Básica do EM para 2.400 horas para estudantes do ensino médio sem integração com o curso técnico
Volta de todas as disciplinas obrigatórias (isso significa a volta de materias imprevisíveis como Sociologia, História entre outras que forma cidadãos críticos) do ensino médio em toda a rede no prazo de 3 anos
Inclusão do Espanhol como 13° disciplina obrigatória
Permissão execpcional para que as redes de ensino ofertem a Formação Geral Básica em 2.100 horas, desde que articulada com um curso técnico de no mínimo, 800 horas
Fim dos itinerários formativos de carater neoliberal, chega de aulas de “brigadeiro caseiro”, “RPG” e semelhantes
Compreensão do Ensino Médio como uma etapa do nosso ciclo de formação e não o fim, tendo 600h de aprofundamento em quatro áreas de conhecimento para nossa formação cidadã e para acesso ao Ensino Superior
Exigência de que cada escola oferte, pelo menos, 2 dos 4 percursos
Construção de parâmetros nacionais para a organização da integração de estudos, definindo quais componentes curriculares deverão ser priorizados em cada um deles
Veda a oferta dos componentes curriculares da formação geral básica na modalidade de educação a distância
Revoga inclusão de profissionais não licenciados, com reconhecimento notório saber, na categoria de magistério. Serão definidas as situações nas quais esses profissionais poderão atuar, execpcionalmente, na docência do ensino médio
Sabemos que ainda há muito para avançar, é importante que esse PL seja articulado juntamente com políticas públicas que garantam que os nossos jovens não evadam das salas de aula. Sonhamos com um ensino médio que tenha como base a vida e realidade das e dos estudantes secundaristas, que seja um modelo construído estrategicamente para ampliar a formação em seu sentido mais amplo: crítica, cultural, social e cidadã.
Seguimos mobilizando estudantes dos quatro cantos do país para que esse PL seja aprovado sem alterações em seu texto na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
A reconstrução da educação e do Brasil perpassa pelas mãos das e dos estudantes, a Primavera Secundarista resiste em cada estudante por uma escola do tamanho dos nossos sonhos
(*) Beatriz Nobre é diretora de Mulheres da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes).
No mês da Consciência Negra, o Sinpro defende preto e pobre na escola pública
Artigo de Márcia Gilda Moreira Cosme, coordenadora da Secretaria para Assuntos de Raça e Sexualidade do Sinpro-DF, divulgado no Brasil de Fato,Revista Fórume Jornal Brasil Popular. Nele, a diretora do sindicato analisa e propõe, no Mês da Consciência Negra, a importância de todos e todas defenderem, diuturnamente, a inclusão total de pretos e pobres na escola pública. Confira o artigo a seguir e também na aba de artigos do site do Sinpro.
No mês da Consciência Negra, o Sinpro defende preto e pobre na escola pública
(*) Por Márcia Gilda Moreira Cosme
Em toda a sua existência, o Sinpro-DF pautou, na sua luta diária em defesa dos direitos da categoria docente e da classe trabalhadora em geral, o fim do racismo como elemento primordial para uma sociedade mais justa no Brasil, e, quiçá, no mundo. Contudo, vencer o racismo e outras forma de preconceitos e discriminações, como o antissemitismo, por exemplo, é uma batalha hercúlea e, muitas vezes, ao darmos um passo à frente no sentido de erradicar esse tipo de “fenômeno” no mundo, ocorrem situações em que a humanidade dá muitos passos para trás.
O genocídio que Israel tem executado, nestes últimos 30 dias, contra o povo palestino é um exemplo disso. Claro que, reservadas as devidas proporções e considerados todos os motivos desta guerra, o antissemitismo constitui também um dos fatores que têm estimulado o massacre e levado, há 75 anos, o Estado de Israel – com colaboração de países imperialistas ocidentais – a executar a denominada “limpeza étnica” em quase todos os países do Oriente Médio, com foco no povo palestino.
O antissemitismo também se localiza dentro desse processo denominado “racismo estrutural”. No Brasil, como em todos os países do mundo, o racismo é um elemento estrutural na construção da sociedade. Silvio Almeida,1 advogado, professor universitário, presidente do Instituto Luiz Gama e, atualmente, é também ministro dos Direitos Humanos, escreveu, em sua obra “O que é racismo estrutural?” que “todo o racismo é estrutural porque o racismo não é um ato, o racismo é processo em que as condições de organização da sociedade reproduzem a subalternidade de determinados grupos que são identificados racialmente”.
Assim, neste novembro, mês da Consciência Negra, reforçamos o debate diário sobre o fim do racismo, cuja culminância ocorre no dia 20, Dia Nacional da Consciência Negra. Este ano reforçamos, mais uma vez, a nossa luta irrevogável e cotidiana pela inclusão dos(as) pretos(as) e pobres na escola pública com muito orgulho. O Brasil precisa se conscientizar, definitivamente, que, na matemática da vida, como bem lembra o poeta brasiliense GOG, os números reais mostram que o povo preto trabalha mais e ganha menos; morre muitas vezes mais que os considerados brancos; é minoria no Ensino Superior e maioria nos camburões. Essa é uma lógica tão cruel quanto real para manter o privilégio do 1% de ricos do Brasil e do mundo. Para investir na erradicação do racismo e construir uma sociedade mais justa, é preciso haver educação antirracista, libertadora, laica, gratuita, pública, democrática, não sexista, inclusiva, financiada pelo Estado nacional e de qualidade socialmente referenciada. Só assim para uma engendrar uma sistemática construção dessa sociedade mais justa que sonhamos.
A educação que emancipa, que soma na formação de pessoas críticas, deve reconhecer e fazer reconhecer que o povo preto, semita, judeu, indígena etc. é potência, é motivo de orgulho. No caso do povo negro, é importante reforçar a ideia de que o “Negro é lindo”, como disse Jorge Ben Jor em sua canção <https://www.youtube.com/watch?v=8sz3Ffp0Qz4>. No entanto, no curso na história, essa potência foi atacada, a cultura do povo preto explorada e sua religião-filosofia marginalizada pela colonização europeia. Sempre foi a imposição do poder da forma mais vil para a manutenção do privilégio branco.
Quando a Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, incluiu, no currículo oficial da rede de ensino, a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”; ou quando o Estatuto da Igualdade Racial afirma que nos Ensinos Fundamental e Médio é obrigatório o estudo da história geral da África e da população negra no Brasil; ou quando o Currículo em Movimento da Educação Básica do DF tem como eixos transversais a Educação para a Diversidade, Cidadania e Educação em e para os Direitos Humanos, estamos falando dessa necessidade de reconhecer a grandiosidade do povo preto e a urgência da reparação racial. Estamos falando não só de uma obrigação moral, mas de um compromisso legal de se ter nas escolas uma educação antirracista.
Todo preto, independentemente de ser pobre ou não, deve encontrar na escola o espaço acolhedor de respeito, de promoção da autoestima e da identidade racial, de práticas pedagógicas de enfrentamento e de combate ao racismo. Todo(a) professor(a) e orientador(a) educacional deve encarar essa luta como dever. O lugar de preto e pobre é na sala de aula. Aprender de forma igualitária é irrenunciável para que crianças e adolescentes possam se desenvolver plenamente. É na sala de aula que se ampliam horizontes, que se constroem sonhos e oportunidades, que se desmantelam estereótipos que perpetuam preconceitos.
Nós, do Sinpro-DF, sabemos do compromisso da nossa categoria com a construção de um futuro de paz, de respeito à diversidade e a todos os direitos humanos. Um futuro antirracista e sem guerras. Somos, incontestavelmente, contra qualquer tipo de preconceito ou discriminação. Somos contra limpezas étnicas e todo tipo de genocídio. Na sala de aula – e na vida – não deve haver lugar para o racismo.
Não é possível pensar no futuro do movimento sindical sem pensar no empoderamento da juventude
(*) Por Tiago Bitencourt
A participação da juventude trabalhadora foi um dos destaques do 14º Congresso da CUT (CONCUT), que aconteceu de 19 a 22 de outubro, em São Paulo. Dos cerca de 2 mil delegados e delegadas no evento da maior central sindical da América Latina, 155 eram jovens. Lá, o grupo defendeu suas pautas emergenciais e representou milhares de trabalhadoras e trabalhadores do país que não puderam estar presentes na atividade.
Mas, apesar da considerável colaboração da juventude, o Congresso deixou claro que muitos desafios precisam ser superados. O mais urgente deles é a ampliação do número de trabalhadores jovens nas direções das entidades sindicais Brasil afora. É uma ação necessária, que aproximará da luta aqueles que estão distantes. É, essencialmente, sobre representatividade.
O trabalhador jovem precisa se enxergar nas entidades que o defendem. E a construção dessa identidade e do sentimento de pertencimento só vai acontecer quando o movimento sindical se permitir renovar.
Isso não quer dizer que os sindicalistas que atualmente estão nas direções precisam sair de cena. Muito pelo contrário, são eles que, ao longo dos anos, têm encabeçado as principais mobilizações em defesa dos nossos direitos, e serão eles os responsáveis por passar o conhecimento para aqueles que virão. Assim, realizaremos um trabalho conjunto e criaremos um espaço democrático em que todos os segmentos de trabalhadoras e trabalhadores se sintam representados.
É fato que a classe trabalhadora tem outro perfil. Não há como negar. Essa nova cara tem organização diferente daquela que estamos acostumados a lidar e, infelizmente, pouca proximidade com o movimento sindical.
E são justamente esses trabalhadores mais distantes dos sindicatos que sentem na pele os retrocessos da precarização das relações de trabalho. Em sua grande maioria, estão em empregos mais precários, sem direitos e sem proteção. E, por não se sentirem representados pelas entidades sindicais ─ principal instrumento de luta ─, se encontram sem voz.
A CUT, como maior central sindical da américa Latina e uma das maiores do mundo, tem o dever de encabeçar essa mudança pelo empoderamento da juventude no movimento sindical.
Nesse processo de aproximação, a comunicação é uma ferramenta primordial. É urgente que o movimento fale a língua do jovem. E ninguém melhor para isso do que o próprio jovem. Sindicalista jovem falando para o trabalhador jovem. Não tem erro! Só assim, conseguiremos quebrar as barreiras entre as entidades sindicais e aqueles que constroem o país.
Mas não basta apenas trazer os jovens para as direções. É preciso também realizar mais cursos de formação, para que esses novos sindicalistas tenham o alicerce necessário para atuar nas bases e desempenhar um trabalho que priorize o senso de coletividade em detrimento da luta individual.
É hora da mudança! O tempo é agora. Não é possível pensar no futuro no movimento sindical sem pensar no empoderamento juventude trabalhadora.
*Tiago Bitencourt é comerciário e secretário da Juventude da CUT-DF
Juntos pelo Brasil por mais e melhores serviços públicos
Por Rodrigo Rodrigues
O Orçamento de 2023, aprovado em dezembro de 2022, prevê mais de R$ 16,7 bilhões para novos concursos públicos. Neste ano, já foram anunciadas 8 mil vagas para o funcionalismo público, e segundo a ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, o Governo Federal planeja reforçar a rodada com 10 mil novas vagas.
Pela primeira vez na história do Brasil, será realizado um Concurso Nacional Unificado (CNU) para a seleção de servidores públicos federais nas vagas autorizadas em diferentes órgãos e entidades públicas do Governo Federal. Uma espécie de “Enem dos concursos”, que pretende democratizar as vagas do serviço público.
Se amargamos mais de meia década com a investida pesada pela desidratação dos serviços públicos e desvalorização dos servidores e das servidoras, ao que tudo indica, agora fazemos o caminho inverso.
Mas o que de fato o Governo Federal quer com isso? E o que isso representa para a sociedade?
Certamente o exemplo mais concreto da importância dos serviços públicos está em um passado recente: a pandemia da Covid-19. Mesmo com o boicote do ex-presidente inelegível Jair Bolsonaro, foram os servidores públicos que garantiram à população brasileira condições de sobrevivência.
Na área da Saúde, servidores e servidoras do SUS encabeçaram diagnósticos, tratamentos e a realização de vacinação em larga escala contra o vírus SARS-CoV-2. As principais pesquisas que colocaram freio à proliferação da Covid-19 foram realizadas em universidades públicas, coordenadas por servidores públicos. O auxílio emergencial concedido a quem se viu sem comida no prato foi administrado pela Caixa Econômica Federal e concretizado pelos serviços de bancários e bancárias; e a sistematização de milhões de dados só foi possível graças ao status de empresa pública do Serpro e da Dataprev. Foi a Justiça pública, através de seus servidores e servidoras, que determinou a obrigatoriedade da oferta de equipamentos de proteção individual a trabalhadores e trabalhadoras que não puderam se afastar dos postos de trabalho.
Entretanto, a manutenção da vida e da dignidade do povo brasileiro a partir dos serviços públicos pode ser observada para além da pandemia. Basta olharmos os números referentes à utilização desses equipamentos. Mais de 70% da população utiliza o SUS. Das 47,4 milhões matrículas estudantis realizadas neste ano, 38,3 milhões foram na rede pública de ensino. Em muitos estados, os Correios continuam sendo a única instituição pública, necessária para viabilizar direitos civis básicos, como a emissão de documentos pessoais. Programas Sociais, como Bolsa Família, são administrados pela Caixa Econômica Federal. A aposentadoria e o BPC (Benefício de Prestação Continuada) são operacionalizados pelo INSS. E segue uma lista extensa de exemplos.
Para um governo eleito por assumir o compromisso de resgatar um Brasil saqueado e desesperançoso, torna-se, portanto, estratégico o fortalecimento dos serviços públicos e a valorização de seus servidores. É a partir daí, inclusive, que o governo pode se preparar para enfrentar futuras crises e desafios; criar ambiente propício para a inovação, pesquisa e desenvolvimento; e, claro, ganhar a confiança e a aprovação da população.
Não é de hoje que a iniciativa privada entendeu a potência dos serviços públicos. Tanto é que está permanentemente à espreita para comprar esses serviços e, também, recrutar quem se formou ali. Paralelamente, esses mesmos grandes empresários, muitas vezes de maneira institucionalizada, tentam emplacar o falacioso discurso de que a iniciativa privada oferece condições mágicas para quem “veste a camisa da empresa”, que serviço público não oferece qualidade à população e que os servidores públicos são “privilegiados, parasitas, marajás” – em 2020, a Revista Piauí publicou estudo mostrando que metade dos servidores públicos ganha menos de R$ 2,7 mil por mês. Em 2018, apenas 3% ganhava mais de R$ 19,1 mil.
O ataque aos serviços e aos servidores públicos é, inegavelmente, o legado do neoliberalismo, que invadiu o Brasil na era dos Fernandos (o Collor de Melo e o Henrique Cardoso) e persiste ainda hoje. O mesmo neoliberalismo que sucateou os serviços públicos em nome de um Estado mínimo. O mesmo neoliberalismo que deu errado por onde passou (ou está) por ser contrário a qualquer tipo de crescimento coletivo.
É, portanto, certeira a decisão do governo Lula de investir na realização de concursos públicos, e muitos concursos. Mas isso, por si só, não basta. Além de ampliar o quadro de efetivos nos órgãos e entidades públicas, é urgente que se valorize os servidores, com a garantia de locais de trabalho adequados, remuneração digna com reajuste anual, formação.
Nessa perspectiva, o dia 28 de outubro – Dia do Servidor Público deve ser considerado um dia de luta em defesa dos serviços públicos e da valorização dos servidores e das servidoras. Nesse mesmo dia, há 84 anos, foram instituídas as leis com os direitos e deveres desses trabalhadores e dessas trabalhadoras. Passado todo esse tempo, e confirmada a importância dessa categoria para a promoção da cidadania e fortalecimento da democracia, os serviços e os servidores públicos, insubstituíveis na promoção da igualdade social, continuam sendo alvo de quem atua pela manutenção do privilégio do 1% mais rico da população.
Aproveitemos o momento que oferece oportunidade de progresso e nos engajemos na luta em defesa dos serviços, das servidoras e dos servidores públicos.
*Rodrigo Rodrigues é professor da rede pública de ensino do Distrito Federal e presidente da CUT-DF.